Perturbação obsessivo-compulsiva no pós-parto afeta 15% das mulheres portuguesas

Psicologia
Foto: Hospital de Braga / Arquivo

Quinze por cento das mulheres portuguesas apresenta “sintomas clinicamente relevantes” de perturbação obsessivo-compulsiva (POC) no período pós-parto, conclui um estudo do Instituto de Psicologia Médica da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, divulgado hoje.

O estudo decorreu no âmbito do projeto “Screening, prevention and early intervention in perinatal psychological distress – effectiveness of a new program in primary healthcare”, financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia.

“Nos resultados da investigação destaca-se o facto de cerca de 15% das inquiridas terem pensamentos e comportamentos obsessivo-compulsivos de forma recorrente”, refere uma nota da Universidade de Coimbra (UC).

Ana Telma Pereira, investigadora do Instituto de Psicologia Médica e primeira autora do trabalho “Postpartum obsessive-compulsive phenomena: a psychometric and epidemiologic study in a Portuguese sample”, destaca a “elevada percentagem” de mulheres com “sintomas clinicamente relevantes” de POC.

O estudo, premiado com o Best Poster Award no World Congress on Women’s Mental Health, promovido pela Associação Internacional para a Saúde Mental das Mulheres, envolveu 212 participantes, recrutadas maioritariamente na Maternidade Bissaya Barreto (Coimbra) e entrevistadas no 6.º mês pós-parto.

No total, 74,1% das inquiridas registaram pelo menos uma obsessão (pensamento ou imagem repetitivo, como o receio de deixar cair o seu bebé) e 41,5% apontaram pelo menos uma compulsão (comportamento repetitivo, como verificar repetidamente o bebé enquanto ele está a dormir). Só 24,1% não reportaram quaisquer obsessões ou compulsões.

“Estas obsessões ou compulsões não significam, por si só, que as inquiridas sofram de perturbação obsessiva-compulsiva – só 2,4% foram diagnosticadas como tal, o que distingue quem sofre de quem não sofre da doença não é o conteúdo dos pensamentos e comportamentos, mas sim o seu caráter repetitivo, intrusivo e perturbador da vida quotidiana”, referem os investigadores.

No entanto, todos os sinais podem servir de alerta, explicam.

“É importante avaliar e detetar o mais atempadamente possível a presença de sintomas e os fatores de risco em várias esferas da perturbação psicológica perinatal (como Perturbação Obsessivo-Compulsiva, depressão e ansiedade), até porque as consequências negativas não são apenas para a mulher, mas também para a descendência, podendo afetar o desenvolvimento dos filhos”, sublinha Ana Telma Pereira.

Segundo a nota da UC, o trabalho conduzido pela equipa do Instituto de Psicologia Médica foi o primeiro a propor e aplicar uma versão portuguesa da Perinatal Obsessive-Compulsive Scale, o único instrumento utilizado a nível internacional para avaliar os sintomas da POC tendo em conta o contexto específico do período perinatal.

“Ainda não tinham sido estudadas outras versões para além da original (australiana). É um instrumento que nos vai permitir fazer uma avaliação rápida e válida dos sintomas, e sua gravidade e interferência, e do risco [de desenvolver Perturbação Obsessiva-Compulsiva] e está já a ser muito útil e bem aceite para fins clínicos e de investigação”, refere Ana Telma Pereira.

António Ferreira de Macedo, diretor do Instituto de Psicologia Médica da Faculdade de Medicina da UC e coautor do trabalho, diz que o novo instrumento de avaliação “assume particular importância tendo em conta que, entre as doenças mentais comuns (como ansiedade, depressão e fobias), “a POC é a menos bem diagnosticada e a que leva mais tempo entre o primeiro sintoma e o pedido de ajuda”.

Os investigadores têm em curso um novo ensaio clínico que testa a eficácia de um programa de intervenção em grupo, baseado em terapias cognitivo-comportamentais, com exercícios de ‘mindfullness’ e autocompaixão – que é coordenado pela supervisora clínica do projeto, Mariana Marques.

Para o futuro fica também a intenção de incluir os progenitores do sexo masculino nestas linhas de investigação. “É errado ficar com a ideia de que isto são coisas só das mulheres”, conclui Ana Telma Pereira.

 
Total
0
Partilhas
Artigos Relacionados
x