Três fundadoras da Fraternidade Missionária Cristo Jovem, em Famalicão, e um padre, atual dirigente, ficaram, esta segunda-feira, sujeitos a Termo de Identidade e Residência por suspeitas de escravidão a três raparigas, dadas como noviças.
A fixação da medida de coação mínima foi anunciada aos jornalistas pelo advogado da instituição, Ernesto Salgado, após primeiro interrogatório judicial dos suspeitos.
Os arguidos chegaram ao Tribunal de Vila Nova de Famalicão, às 09h30 e saíram às 11h51, sob insultos de alguns populares que se concentraram à porta.
Na passada quarta-feira, a Polícia Judiciária (PJ) fez buscas à Fraternidade Missionária Cristo Jovem depois de três raparigas, em princípio dadas como noviças – pessoas que se preparam para a sua consagração religiosa – terem apresentado queixa por maus-tratos, escravidão e cárcere.
Depois do interrogatório, subsiste apenas a indiciação por o crime de escravidão, realçou o advogado.
“Nenhum arguido prestou hoje declarações para a serenidade do processo judicial e para que o inquérito siga os trâmites normais”, disse o advogado.
Ernesto Salgado realçou que, neste momento, já não há “noviças” na instituição, mas o seu intuito é regressarem, tendo já manifestado essa vontade.
Acrescentando que duas delas não formalizaram a queixa junto das autoridades.
Uma das suspeitas frisou, à saída do tribunal, que tem sofrido, tal como a sua família, porque “nunca pensou” que lhe fizessem “uma coisa destas”, mas perdoa porque tem “milhares de amigos” consigo.
“Jesus foi mais achincalhado do que nós”, afirmou.
Confrontada com o facto de não ser freira, tal como se autoproclama, a arguida ressalvou que “no nosso coração somos freiras, consagramo-nos a Jesus para sempre”.
A Confederação Nacional dos Institutos Religiosos de Portugal (CNIRP) assinalou que este caso não ocorreu num convento, mas numa associação de fiéis, pelo que nem as detidas são freiras nem as vítimas são noviças.
A Fraternidade Missionária Cristo Jovem não está, por isso, sob alçada da Confederação dos Institutos Religiosos, mas da Arquidiocese de Braga, assinalou a fonte.
Esta tese é corroborada pelo padre jesuíta João Caniço que disse que a Fraternidade Missionária Cristo Jovem é uma “sociedade apostólica”, ou seja, um grupo de pessoas que se associaram para fazer uma “obra comum”.
“Não pode ser considerada uma congregação, nem uma instituição religiosa porque não é reconhecida como tal pela Igreja Católica”, frisou.
Em comunicado, a Arquidiocese de Braga assume ter iniciado uma investigação interna à Fraternidade Missionária Cristo Jovem, depois de em 2014 ter recebido queixas de “presumíveis anomalias” na vida diária da comunidade.
“Foi indicado, ao mesmo tempo, um sacerdote para acompanhar mais de perto a vida da Fraternidade Cristo Jovem. Deslocou-se semanalmente à comunidade, dedicou tempo a conversas pessoais com as irmãs residentes e iniciou a elaboração de um relatório contendo as informações necessárias em ordem a uma oportuna decisão”, referiu a Arquidiocese, em comunicado, sem detalhar essa mesma decisão.
A Fraternidade Missionária Cristo Jovem nasceu de um movimento para jovens que, posteriormente, construiu um edifício em Requião, Vila Nova de Famalicão, sendo agora uma associação de fiéis com estatutos aprovados a 24 de janeiro de 1978 pela Arquidiocese de Braga.
Foi esta associação que trouxe para Portugal as “cruzes do amor” que ainda podem ser vistas em muitas paróquias e casas particulares e que é considerado um símbolo apocalíptico não reconhecido pela Igreja Católica.