Braga: Ex-provedores condenados por burla à Segurança Social

Luís Rufo e Carlos Vilaça

Os dois anteriores provedores da Irmandade de Santa Cruz, de Braga, Luís Rufo e Carlos Vilaça, foram esta quinta-feira condenados por crime de burla à Segurança Social, tal como a diretora técnica, Liliana Cerqueira, e a própria instituição secular bracarense, embora com penas e montantes diferentes, segundo as responsabilidades de cada um dos arguidos no processo do casal que nunca viveu no Lar de Idosos de Santa Cruz, nem sequer tinha quaisquer dificuldades financeiras, até ostentando fortuna, só que a Irmandade recebeu indevidamente mais de 50 mil euros, como comparticipações sociais.

Luís Rufo, que entretanto é suspeito de ter exercido advocacia com base na falsificação das notas do curso de Direito, terá a pagar cinco mil euros, a dividir pelos Bombeiros Voluntários de Braga e pela Santa Casa da Misericórdia de Braga, para não cumprir pena de prisão, tal como os seus coarguidos, porque se trata em todos os casos de multas de substituição, não situações de prisão subsidiária, conforme destacou o juiz Paulo Rodrigues, durante a leitura da sentença condenatória.

O engenheiro Carlos Vilaça, antecessor de Luís Rufo, teve uma pena de meio ano de prisão, substituída por 200 dias de multa à taxa diária de sete euros, totalizando 1.400 euros, enquanto a diretora técnica da valência de idosos da Irmandade de Santa Cruz, Liliana Cerqueira, foi condenada a dez meses de prisão, revertidos em 300 dias de multa também com a taxa diária de sete euros, no montante total de 2.100 euros, podendo pedir em alternativa a prestação de trabalho a favor da comunidade, quer Carlos Vilaça, quer Liliana Cerqueira, uma hipótese que já não será possível no caso de Luís Rufo.

O ex-provedor Luís Rufo foi o arguido mais penalizado. Foto: O MINHO

Luís Rufo foi condenado a um ano e quatro meses de prisão, por burla tributária, só que suspensa na sua execução, por um ano e meio, tendo sido a pena mais pesada e a única não suscetível de conversão em multa.

Para o Tribunal Criminal de Braga, Luís Rufo, enquanto provedor da Irmandade de Santa Cruz, nunca poderia desconhecer “a situação anómala” do casal que afinal não residia no lar de idosos, apesar de ter sido o seu antecessor, Carlos Vilaça, a fazer tal contrato com os septuagenários de Arco de Baúlhe.

“Era, além do mais, advogado, pelo que nunca poderia desconhecer a ilicitude, ambas funções que têm exigências éticas acrescidas”, acrescentou o magistrado, referindo que “mesmo depois de alertado pela Segurança Social para essa situação irregular deu ordens para continuar a ser esse casal incluído na listagem mensal”.

À Irmandade de Santa Cruz, também arguida no processo criminal julgado em Braga, foi aplicada uma pena de multa de 450 dias à taxa diária de 12 euros, totalizando 5.400 euros àquela instituição bracarense, pelo recebimento indevido das comparticipações sociais relativas ao casal idoso que vive de forma desafogada, em Arco de Baúlhe, Cabeceiras de Basto, que não usava permanentemente o quarto do tipo suite que comprou por 200 mil euros, a título vitalício, mas apenas para de vez em quando passar uns dias em Braga com passeios ocasionais e para tratamentos em clínicas e hospitais da cidade.

O juiz, Paulo Rodrigues, censurou fortemente o comportamento reiterado de todos os arguidos, porque “num país pobre e de recursos escassos, um casal que pagou 200 mil euros por um quarto vitalício e do qual fazia um uso como se tratando de um hotel, levou ao uso indevido de dinheiros públicos, em detrimento de outros idosos, que realmente necessitavam, mas não foram acolhidos” pela Estrutura Residencial para Pessoas Idosos (ERPI) da Irmandade de Santa Cruz, em Braga.

O ex-provedor Carlos Vilaça com o seu advogado, Tarroso Gomes. Foto: O MINHO

Segundo considerou o mesmo magistrado judicial, o comportamento evidenciado ao longo dos anos, por todos os quatro arguidos, “é mais grave daquilo que à partida possa parecer”, explicando a propósito que por causa da “situação anómala e única” do casal afortunado fazer da estrutura para idosos como um hotel, tenha sido aproveitado por terceiro, Irmandade de Santa Cruz, através dos dois referidos provedores e da diretora técnica, para obter comparticipações sociais indevidas.

“As penas foram relativamente leves para todos os arguidos, tendo em conta a Irmandade de Santa Cruz ter ressarcido a Segurança Social e a ausência de quaisquer antecedentes criminais”, acrescentou o titular do Juízo Criminal 1 da Comarca de Braga, durante a audiência, reiterando que devido aos artifícios dos dois ex-provedores e da diretora técnica, ao longo de seis anos, “dois outros idosos, que deveriam ter sido os utentes, ficaram sem receber cuidados de saúde e assistenciais”.

Liliana Cerqueira, diretora técnica, igualmente penalizada. Foto: O MINHO

Para o juiz, Paulo Rodrigues, atentamente escutado, pelos arguidos e advogados, “estas situações têm de ser tratadas sem qualquer tipo de tibiezas”, porque no caso concreto o casal de septuagenários em nome do qual e sem o seu conhecimento, a Irmandade de Santa Cruz foi recebendo comparticipações sociais, indevidamente, no valor total superior a 50 mil euros, uma vez que o casal em questão “não preenchia um único dos vários requisitos para ser acolhido e apoiado pela Segurança Social, não existindo naquele seu caso necessidades nem carências aos níveis social, familiar, económico ou de saúde”.

Segundo o juiz, “trata-se de um casal abastado e que teve 200 mil euros para de uma só vez pagar o quarto na Irmandade de Santa Cruz, tendo ambos autonomia e o marido continuando a gerir as suas propriedades e uma empresa de produção de azeite, continuando sempre a residir na sua terra, na vila de Arco de Baúlhe, do concelho de Cabeceiras de Basto”, de modo que “não lembraria a ninguém incluir o nome desse casal nas listagens mensais enviadas para a Segurança Social”.

O atual provedor, Fernando Rodrigues, com o advogado da instituição. Foto: O MINHO

“Só lembraria a quem quisesse enveredar pelo caminho da ilicitude, enganando e ludibriando a Segurança Social, como sucedeu neste caso, através de falsas declarações”, salientou o juiz, assim enquadrando o comportamento dos arguidos a nível de um crime de burla tributária, atentando contra o Instituto de Segurança Social, que ficou integralmente provado, já que colocar o erário público “a pagar 700 euros mensais de comparticipações” tratou-se, ainda segundo o mesmo juiz, de “uma situação ostensiva, chocante e absurda o de subsidiar o apoio que não existiu e a um casal com fortuna pessoal”.

 
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