Aos 35 anos, Marco Araújo é já um nome incontornável no panorama turístico e hoteleiro da Ásia. Natural de Ponte de Lima, encontra-se desde 2021 a gerir aquele que é considerado o melhor hotel da nação tropical das Maldivas, que conta com mais de 1.000 ilhas agregadas. Segundo a Forbes, é já um dos mais conceituados resorts em todo o Oceano Índico. Recentemente, recebeu a visita da conhecida apresentadora Cristina Ferreira, que não se intimidou com os preços praticados no Waldorf Astoria Maldives Ithaafushi, onde uma noite não é garantida por menos de 4.000 euros.
Ao anunciar o novo posto de Marco Araújo, o diretor-geral do hotel, Etienne Dalançon, disse à imprensa internacional que esta contratação deixou o ‘staff” e a administração “deliciada”: “Estamos deliciados por dar as boas-vindas ao Marco, nesta nossa maravilhosa ilha. A sua experiência e paixão irá posicionar-nos na senda do sucesso contínuo e assegurar que os nossos clientes têm as experiências mais extraordinárias”.
A história – também ela extraordinária – de Marco começa no Minho, mais concretamente entre Ponte de Lima e Arcos de Valdevez, onde estudou no curso profissional de restaurantes e bares da Escola Profissional do Alto Lima (EPRALIMA). De lá, partiu na ânsia de aumentar as qualificações, e mudou-se para o Estoril, onde estudou na Escola Superior de Hotelaria e Turismo. Em Portugal, “trabalhou pouco”, como contou a O MINHO, via conversa telefónica, este domingo de manhã (fim de tarde nas Maldivas).

“Trabalhei em alguns restaurantes em Arcos de Valdevez e em Ponte de Lima e ainda no Hotel Termas de Monção, mas quando fui estudar para o Estoril, depois fiz logo um estágio em Macau, e fiquei lá sete anos”, revela. E Macau foi um porto seguro para Marco, dada a confluência de estilos ocidentais e orientais, sobretudo nos ingredientes para a restauração.
“Macau é um bom país para começar na Ásia”
“Macau foi um bom país para começar na Ásia, pois tem o Ocidente e o Oriente juntos, dando para adaptar de forma mais fácil. Havia muita comida portuguesa, produtos portugueses nos supermercados, mas também deu para ir conhecendo a cultura oriental”, lembra. Contudo, e passados sete anos em Macau [antiga colónia portuguesa e região autónoma chinesa desde 1999], onde começou a construir boa parte da carreira, decidiu embarcar para outra região mais paradisíaca, e foi para a Tailândia, onde trabalhou cinco anos.
“Ao contrário de Macau, na Tailândia não encontras nada [português], mas a partir do momento que estás cá [na Ásia], começas a adaptar-te à cultura e às pessoas. E, acredita, tens de ter uma grande capacidade de adaptação, caso contrário é muito complicado de cá ficar”, adverte.

1.000 empregados, 119 vilas, 11 restaurantes e uma ilha privada
No final de 2021, recebeu um convite para gerir o maior hotel das Maldivas, da cadeia Hilton, e nem pensou duas vezes. Durante o percurso asiático, o agora gestor começou a servir alimentos e bebidas à mesa de restaurantes de hotéis, até chegar a diretor de operações e diretor comercial, em dois diferentes hotéis na Tailândia. “Agora sou Hotel Manager, ou seja, faço a gestão de todo o hotel, o melhor hotel das Maldivas [tem classificação de 5 estrelas, com 500 avaliações no Trip Advisor], e da cadeia Hilton a nível mundial. Temos 119 vilas, uma ilha privada, onze restaurantes e cerca de 1.000 empregados”, detalha.

Marco relativiza as complicações deste tipo de trabalho num local tão distante de Ponte de Lima. “Gerir pessoas é o mesmo em todo o lado. Basicamente é gerir personalidades, e aqui, embora os locais predominem (cerca de metade dos funcionários são naturais das Maldivas), tenho 31 nacionalidades, pessoas de todas as partes do mundo”, explica.
A receita do sucesso de crescimento não passa só pelo trabalho, embora seja “muito importante”, como classifica: “É muito importante fazer bem aquilo que fazemos, mas ao mesmo tempo também é necessário ter uma atitude correcta com os colaboradores porque no final do dia posso estar à frente do hotel mas os empregados são os que levam o hotel no dia-a-dia. Costumo dizer nas entrevistas [de emprego]: “Nunca estou à procura de experiência, mas sim de personalidade e atitude, porque se tiverem a atitude certa e a personalidade correta mesmo que não saibam nada do trabalho, vão aprender”.

4.000 euros por noite e 80 mil pela ilha
Marco revela que, para dormir uma noite naquele hotel de luxo, são precisos “pelo menos 4.000 euros. “E esse é o preço mínimo”, enfatiza. A ilha privada, para quem a quiser alugar, são entre 80 a 100 mil euros por dia. “Quem a aluga são membros de famílias reais e celebridades, que procuram privacidade”, revela. E a ilha não é brincadeira. Para além de ser a maior do género, tem ainda um spa de luxo sobre as águas.

Portugueses, não há muitos. “Esteve cá recentemente a Cristina Ferreira, há cerca de um mês, e outra atriz portuguesa também conhecida, que agora não me lembro o nome. Houve também um casal ligado à venda de vinhos, mas é raro”, confidencia.

Adaptação: comida, logística e isolamento são a pior parte
Para Marco, a parte mais difícil desta epopeia asiática “foi a adaptação” à comida, tanto na China como na Tailândia: “É sempre muito picante. Comparado com Portugal, todas as comidas são muito picantes. Ao principio não estás habituado, e confesso que tive problemas de estômago”, recorda. Mas, com o tempo, a familiarização foi feita com sucesso.
A nível profissional, o maior ‘pesadelo’ para o gestor de um grande hotel como é o Waldorf Astoria Maldives Ithaafushi, é mesmo a logística, que requer uma “grande capacidade de flexibilidade” em tudo o que é feito: “Em Portugal vai-se ao supermercado comprar algo para um restaurante ou hotel, mas aqui demora quase seis meses a chegar, e é muito difícil de chegar a tempo dos eventos que planeámos fazer”.

Para férias, “um paraíso”. Para trabalhar, “não é fácil”
Outra situação que causa algum constrangimento é o isolamento. Ou, como diz Marco, “estar fechado nas ilhas”. “Quem vem para as Maldivas fá-lo em duas situações: para trabalhar ou para gozar férias. Para quem vem de férias, as Maldivas são um paraíso. Para quem trabalha e está fechado dentro das ilhas, não é fácil, tem de ter uma grande capacidade mental”, considera.
“Independentemente de ser ou não bom no trabalho que faz, não é qualquer pessoa que consegue estar fechado numa ilha, sem ir a um shopping, por exemplo, ou sem ver a família e os amigos. Ou seja, sem sair da zona onde trabalha”, acrescenta.
Covid fechou as ilhas por dois meses, mas logo acabaram todas as restrições
O covid-19 também foi “um susto” para a hotelaria nas Maldivas, mas só durante os primeiros meses. Marco dá conta que o Governo local, após passar “o susto inicial”, percebeu logo que, com os hotéis encerrados, a Economia ia ao charco, porque o Turismo é o principal dinamizador das Maldivas.

“As Maldivas estão abertas e o Turismo está mais forte que nunca. O Governo prevê aumento de turistas neste ano, e nós fechamos o ano anterior acima das expectativas, algo que aconteceu também com o primeiro mês deste ano”, revela.
Marco explica que não existem restrições naquela nação, apenas a realização de teste para sair dos hotéis, e nada mais.
Sobre essa mesma questão, da “abertura pós-covid”, Marco compreende que há realidades distintas: “Depende das circunstâncias de cada país. A Tailândia, por exemplo, está a chegar a um limite que terá mesmo de abrir, porque também depende muito do Turismo. Por outro lado, locais como Singapura ou Hong Kong, que não vivem do turismo, e a Economia continua a prosperar, podem muito bem manter-se fechados”.
Definitivamente, irei voltar para Ponte de Lima
A carreira de Marco mantém-se profícua na Ásia, o continente onde o Turismo e a Hotelaria mais crescem. “Repare, a Hilton vai construir mais de 1.000 hotéis na China em 2022. Só num país. Na Europa toda, isso não é possível. Está em franco crescimento”, aponta o gestor, que, para já, não faz planos para regressar, nem à Europa, nem a Portugal.
“Definitavmenete irei voltar para Ponte de Lima, nem que seja para a reforma, pois será sempre a minha casa e onde estão os meus pais e amigos. Mas, neste momento, não há planos para voltar porque o crescimento está todo na Ásia, e a minha carreira foi toda feita na Ásia, Por isso, não deve passar pela Europa, mas tudo depende das oportunidades, claro”, avalia.

Conselhos para os alunos de hotelaria e restauração
Desafiado por O MINHO a aconselhar futuros “gestores” de hotelaria, que comecem como ele, ou seja, “de baixo”, aponta a Ásia e a autoestima como fatores que funcionam: “O conselho que lhes dou é que acreditem neles próprios. Muitas vezes é importante sair de sair zona do conforto e experimentar novas culturas e novos países para aprender e também trazer essas experiências para Portugal. Não tenham medo de sair, acreditem em vocês próprios. Neste momento, a Ásia é o top em termos de crescimento na hotelaria. Tudo o que cresce, é na Ásia, e quando olhamos para países como a China, percebemos logo isso. É preciso notar também que grande parte dos europeus e americanos acabam todos por vir passar férias á Ásia”, conclui.