O Ministério Público (MP) pede prisão efetiva, de pelo menos dez anos, para o alemão que algemou e abandonou uma jovem compatriota, à mercê dos lobos e intempéries invernais, na Serra do Gerês, em Terras de Bouro, por considerar terem sido cometidos crimes de homicídio tentado, sequestro e de abuso sexual de pessoa incapaz de resistência.
Segundo solicitou a procuradora da República, Joana Maria Piloto, “tal condenação única, deve situar-se no limite média da moldura penal dos três crimes, mas numa medida nunca inferior a dez anos de prisão efetiva, não só pelo meio insidioso da conduta do arguido e da frieza de ânimo demonstradas, como ainda a ausência de arrependimento, ainda hoje”.
Gerhard Eugen Branz, de 56 anos, casado, eletricista, abandonou-a à sua sorte uma jovem, então de 29 anos, que trouxera de automóvel da Alemanha, alegadamente com o pretexto de arranjar-lhe um emprego, em Espanha, mas acabou levar a compatriota, que tem problemas cognitivos, até Portugal, passando ambos uma semana na vila termal do Gerês.
O arguido, que residira já nas Ilhas Canárias, em Espanha, já tinha cadastro por crimes de fraudes, estando em prisão preventiva na Cadeia de Braga, depois de ter sido detido na Alemanha pela Secção Regional de Combate ao Terrorismo e Banditismo, da Diretoria do Norte da PJ, sempre em colaboração com a BKA, congénere alemã da Polícia Judiciária.
Gerhard diz que “não [teve] a intenção de matar” a jovem, mas nunca deu aos juízes qualquer explicação plausível que afastasse a acusação de tentativa de homicídio qualificado, sequestro agravado e de abuso sexual de pessoa incapaz de resistência, acrescentou a magistrada do Ministério Público.
Julgado em Braga, por um Tribunal Coletivo, presidido pelo juiz Marco Martins Moreira, o cadastrado alemão procurou afastar a intenção de matar a jovem compatriota, então com 29 anos, operária fabril, que sofre de perturbações psiquiátricas, não tendo assim domínio completo sobre os seus atos, pelo que “aceitou” então acompanhar Gerhard Eugen Branz, supostamente até Sevilha, com promessa de arranjar-lhe trabalho. Mas, pelo caminho, num carro francês, furtado pelo arguido, viu desviar a rota até Portugal, mais concretamente para a Vila do Gerês, onde se hospedaram, tendo a vítima sido logo sujeita a “submissão”.
“Para libertação dos maus espíritos”
Instalados em 10 de fevereiro de 2019, numa pensão geresiana, “Gerd”, como é conhecido o cadastrado, foi aproveitando para manter relações sexuais com a jovem, dizendo-lhe na ocasião que tal fazia parte da “terapia” com a qual a iria “curar”, tendo, no dia 15 desse mesmo mês, levado a compatriota para uma zona florestal, entrando pela Estrada da Fraga Negra, onde parou o automóvel, subindo por um dos trilhos, dizendo à jovem, que a iria “libertar dos maus espíritos”.
Para isso seria algemada a uma árvore, em zona de densa vegetação, tendo-a amordaçando e vendando, fugindo para Espanha, só não falecendo pelo frio ou a ataque de lobos, porque em desespero, lacerando os pulsos, conseguiu rebentar o elo das algemas, desatando aos gritos pela serra abaixo, até ser ouvida por futebolistas em treino.
A PJ reconstituiu todos os passos de ambos, criminoso e vítima, através das células dos seus telemóveis, num trabalho de sapa, que ao fim de diversos meses, deu os seus frutos, com consolidação da prova mais que suficiente para a acusação sustentada do cadastrado alemão, que durante todo o julgamento tem assumido uma postura fria e de “afastamento” dos crimes, não denotando, também, qualquer tipo de arrependimento, segundo a mesma magistrada, que durante o julgamento, em Braga, sustentou a acusação da procuradora Elsa Simão Baptista, que trata dos crimes mais violentos, no distrito de Braga.
A advogada oficiosa do arguido, Ana Rita Fernandes, considerou não ter sido provado o abuso sexual, referindo que todas as relações íntimas terão sido consentidas pela vítima.
O Tribunal Coletivo, presidido pelo juiz Marco Martins Moreira, tendo por adjuntas as juízas Branca Macedo Varela e Ana Raquel Silva, marcou a leitura do acórdão para novembro, após a última oportunidade ao arguido, para falar em sua defesa.