O historiador bracarense José Sepúlveda Duarte Macedo prepara a edição do livro Braga sem filtros em que aborda o que foi Braga nos 60 anos que separam a implantação do liberalismo monárquico em Portugal e a sua decadência acentuada depois dos episódios do Ultimato e do 31 de Janeiro de 1891.
“É um trabalho dividido duas partes. A primeira aborda os aspetos políticos e económicos e a segunda os culturais”, explica. Para melhor situar a época, o autor enquadrou o caso bracarense na História de Portugal.
O título como que indica o sentido da obra. Normalmente um autor que escreve sobre a sua cidade natal, procura apresentá-la num tom mais ou menos laudatório. Neste caso, e é daí que vem o nome de Braga Sem Filtros, pretende-se algo diferente.
José Macedo não poupa esforços no sentido de apresentar uma cidade “sem as proteções capazes de esconder a realidade nua e crua”.
Para o conseguir recorre a citações de várias fontes: Livros de Atas da Câmara, livros de correspondência recebida e expedida pela autoridade camarária, orçamentos e sobretudo todos os números disponíveis da imprensa bracarense da época, espalhados por diferentes arquivos.
A visão apresentada da cidade é profundamente crítica, por vezes polémica: “Era assim a nossa Braga, a cidade perdoada, a autoapelidada Sintra do Norte, a terceira capital do reino, aquela que gostava de ser chamada Roma portuguesa… “, diz, a concluir.
Cidade das aparências
Na introdução, escreve o autor: “Naquele tempo Braga poderia ser apontada como a capital das aparências. As ideias e os comportamentos mais afastados da tradição assustavam-na. A manutenção da imagem preocupava-a. Num mundo em rápida transformação que avançava no caminho do progresso, Braga também não se sentia bem com o seu próprio conservadorismo. A cidade gostava de parecer moderna e esse seu sentimento era muito bem interpretado pelos políticos locais. Abominando enfrentar a tradição, os bracarenses tentavam conciliar o passado e o presente, mostrando-se disponíveis para a promoção de obras que criassem uma imagem de progressismo à sua cidade. Estas obras eram por vezes realizadas à custa da demolição de construções antigas de reconhecido valor arquitetónico. Em contrapartida, adiavam o inadiável. Pretextando falta de receitas, os trabalhos verdadeiramente importantes, como o abastecimento da água e o saneamento, eram protelados. Não é obra do acaso que hoje, tanto na escadaria principal do edifício camarário como nas paredes do seu salão nobre, encontremos as imagens de uma Braga que já não volta. É como se a cidade se tivesse rendido à necessidade de aparentar sinais de progresso e simultaneamente tivesse ficado prisioneira de um passado espiritual, que verdadeiramente nunca renegou. Não encontramos outra explicação para a apetência que, ao longo dos tempos, a Câmara tem manifestado por obras. Felizmente, nem tudo o que a loucura desejava acabaria concretizado”.
E salienta: “Teria sido desastroso, se fosse levada à prática a sugestão do Jornal do Minho de 08 de Janeiro de 1875”, o qual propunha a reedificação do edifício do Paço Arquiepiscopal, “substituindo-o por uma casa moderna digna do Primaz das Espanhas”.
260 páginas e 27 gravuras
O livro, que tem 260 páginas e é ilustrado por 27 gravuras, tem 15 capítulos: Após a vitória do Liberalismo, Entre 1836 e o cabralismo, Desde o cabralismo à Maria da Fonte, Antecedentes da Maria da Fonte, A Maria da Fonte, A Patuleia, Entre a Patuleia e a Regeneração, O Governo de Saldanha, Até ao Inicio do 2.º Governo de Loulé, O 2.º governo do Marquês de Loulé, Da Fusão à Janeirinha, Os governos da Janeirinha, O longo governo dos regeneradores, A República no Horizonte e as Grandes Obras que ficaram por fazer. A segunda parte aborda os aspetos culturais: A mendicidade, A cidade, a cultura e o ensino, O Fervor Religioso, O Relacionamento Amoroso, O Divertimento, Meretrizes, O recrutamento, Expostos e outras Aparências, Rivalidades com outras terras, As eleições e Intolerâncias e Prepotências.
Rivalidades
Num dos capítulos, o autor aborda as rivalidades entre Braga e cidades como Guimarães e o Porto: “Braga pressentia o perigo quando se confrontava com as terras cujo desenvolvimento considerava próximo do seu. Temia que o seu espaço natural de superioridade fosse ocupado ou que a sua imagem saísse denegrida, quando comparada com as outras terras. Guimarães e o Porto eram as cidades mais temidas. Eram por vezes encaradas como inimigas e tornava-se imperioso travá-las, controlá-las. Os desentendimentos que separavam Braga e Guimarães eram os mais vincados e faziam-se sentir em todas as áreas, sobretudo nas ligações ferroviárias ou terrestres com outras regiões”.
E assinala: “Mas a Roma portuguesa e a cidade berço, como gostavam de ser chamadas, não eram caso único. Também havia outras rivalidades entre terras mais pequenas, freguesias ou lugares dentro de uma freguesia, terras habitualmente vizinhas”.
Apoios à edição
José Sepúlveda nasceu em 1952 e vive desde sempre em Braga. É licenciado em História pela Universidade do Porto. De momento, está em negociações com uma editora para publicar o livro, no que deve ter apoio da Câmara Municipal e da Direção Regional de Cultura do Norte.