A situação do têxtil nos Vales do Ave e do Cávado está a fazer soar o alarme junto de sindicatos, associações industriais e partidos políticos. A ‘culpa’ é do grupo Inditex, o gigante têxtil espanhol, dono de marcas como Zara, Massimo Dutti, Pull and Bear e Bershka, entre outras, que tem diminuído as encomendas e deslocalizado a produção para o Norte de África.
“Estamos a acompanhar com especial atenção a situação”, começa por dizer a O MINHO, Francisco Vieira, do Sindicato Têxtil do Minho. “Desde 2018 estamos em contacto permanente com a empresa e em breve iremos tomar uma posição pública sobre o assunto”.
Até porque para Francisco Vieira “há muitas contradições” que carecem ser esclarecidas. “É verdade que há o encerramento de micro empresas” mas “há outras coisas bem piores: há produção colocada em Portugal feita em Marrocos ou na Turquia”.
Isto é: quer-se “concentrar a produção em países de salários mais baixos e procurar impor custos de produção equivalentes em Portugal quando, por falta de capacidade naqueles países, têm de recorrer às empresas portuguesas”.
As denúncias vão mais longe: “temos empresas que nasceram e morreram sem pagarem um cêntimo de impostos ou contribuições. Abrem com um capital social de 50 ou 500 euros e depois fecham sem cumprirem com as suas obrigações”.
O sindicalista reconhece que “há outras empresas, sobretudo, na área do têxtil-lar que estão em grande dificuldade”. No entanto, o Sindicato irá, em breve, tomar uma posição pública sobre isso.
Também a Associação Comercial e Industrial de Barcelos, através do seu diretor-geral, João Albuquerque, disse ao Jornal de Barcelos que “se nada for feito, o sector estoira em cinco anos” que “a crise pode afectar 75% das exportações do concelho” estando em risco “dezanove mil postos de trabalho” em Barcelos.
Segundo informação prestada pela Confederação Portuguesa das Micro, Pequenas e Médias Empresas, as dificuldades são, sobretudo, sentidas no sector do vestuário e em particular pelas “microempresas que trabalham em regime de subcontratação”.
Partidos políticos
Tanto o Bloco de Esquerda como o Partido Comunista Português já vieram a terreiro chamar a atenção para a situação atual.
Os dados oficiais dão conta do encerramento de pequenas e microempresas em concelhos como Fafe, Guimarães, Vizela e Póvoa de Lanhoso, alastrando-se para concelhos como Vila Verde ou Barcelos.
No primeiro trimestre de 2019, segundo informação da Confederação Portuguesa das Micro, Pequenas e Médias Empresas, grande parte das empresas subcontratadas no Vale do Ave estiveram sem trabalho.
Pedro Soares, do Bloco de Esquerda, diz que “se corre o risco de apenas haver encomendas nos períodos em que a capacidade de produção em Marrocos for excedida. Uma espécie de regime sazonal de trabalho”.
Por isso, para o bloquista, “com toda a urgência, é essencial defender postos de trabalho e condições laborais. É necessário canalizar apoios para formação profissional, efetivamente necessária, a ser levada a cabo nos períodos de menor volume de trabalho, e o estabelecimento de planos alargados de regularização de dívidas que garantam a continuidade da produção e do emprego com direitos”.
Pedro Soares já exigiu ao governo “uma ação urgente no Vale do Ave para proteger os trabalhadores e a economia da região”.
O PCP apresentou uma iniciativa legislativa para que sejam tomadas “medidas urgentes” e recomendou ao Governo que “proceda ao recenseamento urgente das micro, pequenas e médias empresas do sector têxtil e vestuário sitas na região do Ave e Cávado que atravessem dificuldades económicas fruto da diminuição de encomendas; que crie um plano de emergência destinado às micro, pequenas e médias empresas, particularmente do setor do têxtil e do vestuário, das regiões do Ave e Cávado, que contemple um Fundo de Segurança de Subcontratação ou que desenvolva, em articulação com as associações empresariais representativas dos setores têxtil, vestuário e confeções e dos trabalhadores, um modelo de contratualização” baseado nas realidades dos mercados.
INDITEX
O grupo Inditex, recentemente, numa conferência de imprensa na Galiza garantiu que “vai continuar a manter uma relação estreita com as empresas portuguesas, até porque a produção de proximidade é importantíssima para a essência do negócio e para a qualidade da confecção”,
E para sustentar a sua opinião, Pablo Isla atirou com números: “em termos de produção não há uma variação significativa no peso dos fornecedores de Portugal [em 2018 face a 2017]. Portugal é um dos nossos mercado-chave em termos de produção e fornecimento e vai continuar a ser no futuro”.
Empresários
Para João Rui Pereira, um dos sócios da Pafil Confecções, ouvido por O MINHO, o têxtil português, “em alguns sectores já tem uma dinâmica interessante”. A aposta devem ser “peças com valor acrescentado” deixando de lado “o ser mais rápido e mais barato 10 cêntimos porque não conseguimos competir com os asiáticos”.
O empresário barcelense é da opinião que “temos capacidade e conhecimento do mais evoluído do Mundo. Temos que acreditar que fazemos bem e deixar de lado o preconceito de país pequeno”. E volta a insistir: “temos que ser diferentes, mais rápidos na produção de peças de valor acrescentado porque isto é que nos diferencia dos outros países”.
Já Samuel Costa, membro do Conselho de Administração do Grupo Sonix, na iniciativa AEP Link, realizada em Braga, reconheceu que “há muita dificuldade em encontrar pessoas qualificadas para trabalhar nesta indústria porque há ainda um grande preconceito relativamente a este setor, porque há uma visão do setor ainda muito ligada ao que era antigamente”.