Uma gestão em “roda livre”, megalómana e com os dinheiros a circular pelos bolsos de dois ex-administradores. Depois de ter criado, em 2002, com a benção do falecido Cónego Melo, ex-vigário-geral da Arquidiocese de Braga, o ISAVE – Instituto Superior de Saúde do Ave, da Póvoa de Lanhoso, o seu ex-administrador, José Henriques, enveredou por uma política megalómana de expansão, com a construção de um colégio em Braga, o das Sete Fontes, e o lançamento de universidades no Brasil e em Cabo Verde.
E ia tentar criar um “politécnico” em Chaves. Do ISAVE – gerido pela Ensinave cujos donos eram José Henriques, Albino Costa e o Cónego Eduardo Melo, – saíram vários milhões de euros para a constituição de mais 14 empresas, de vários ramos. Em 2010, o grupo ISAVE faliu com estrondo, com dívidas de 6,7 milhões, mas antes disso dezenas de alunos brasileiros ficaram sem aulas depois de terem pago as propinas. Na insolvência, José Henriques ainda se apresentou como credor pessoal do ISAVE, o que lhe não foi reconhecido.
Os dois ex-gestores foram, agora, acusados pelo Ministério Público de Braga dos crimes de insolvência dolosa, e peculato, por terem causado, propositadamente, 10,8 milhões de euros de prejuízo à Ensinave, verba que vão ter de devolver ao Estado.
Contas pessoais
Estão ainda acusados de terem beneficiado de transferências bancárias da Ensinave para as suas contas pessoais, respetivamente de 1,089 milhões e de 656 mil euros.
A acusação envolve um terceiro arguido, por participação económica em negócio, o empresário Alberto Moreira Lapa, de Vila Nova de Gaia, que terá passado faturas falsas à Ensinave de mobiliário de escritório e dado “comissões” aos dois ex-gestores. Facilitando vários contratos de leasing.
O ISAVE, que hoje funciona em Amares com nova gestão, foi fundado por José Henriques e por Monsenhor Melo Peixoto – conhecido como Cónego Melo – que foi administrador durante dois anos, até falecer em 2008. O sacerdote – sublinha a acusação –, “pessoa conhecida a nível regional e nacional” foi a garantia de “credibilidade” do ISAVE e terá sido ele a conseguir o alvará do ensino superior. E o acesso a financiamento bancário. Com o seu falecimento – dizem alguns ex-membros do ISAVE -, José Henriques “entrou em roda livre”. O MP salienta que o Cónego não se locupletou com verbas do organismo.
A magistrada do MP Armandina Conde Alves diz que a administração era “megalómana” e descreve uma teia de pagamentos e transferências de dinheiro a partir da Ensinave, a quem as propinas de 600 alunos eram pagas, para as empresas do grupo, que iam de imobiliárias a firmas de publicidade ou consultadoria, passando por instituições universitárias no estrangeiro.
Investimentos no Brasil
Para a ENSINE Brasil, que fundou o IUNE- Instituto Universitário do Brasil foram transferidos 1,5 milhões, quer de contas da ENSINAVE quer dos dois administradores. Vários alunos brasileiros ficaram sem o dinheiro das propinas pagas, e sem aulas. Um escândalo! Já a ENSINE Cabo Verde foi constituída com 7,6 milhões de euros, um investimento em que também se confundiam os dinheiros do ISAVE e o dos então gestores, o qual saia, também, da mesma fonte, as propinas. O objetivo era fundar a ÚNICA, Universidade Internacional de Cabo Verde.
José Henriques construiu ainda, de raiz, em Braga, o Colégio das Sete Fontes, gerido pela ex-mulher, o qual viria a ser declarado insolvente já que as obras nunca foram pagas. Como sucedeu com a maioria das outras firmas.
A multiplicação de firmas e entidades passou, ainda, pela ENSANIS, que funcionaria como clínica dentária anexa ao ISAVE, e por duas associações desportivas a Academia ISAVE e a Associação Maria Balano. A primeira chegou a ter uma equipa de andebol profissional e pretendia realizar cursos superiores na área do desporto.
Em 2009, quando as contas do ISAVE começaram a mostrar os efeitos de uma gestão que visava “descapitalizá-la”, José Henriques optou por criar uma fundação, a Padre António Vieira, para onde transferiu os ativos do ISAVE, nomeadamente o edifício que construiu em Geraz do Lima para as aulas, o alvará e os restantes ativos, 21 milhões de euros, no total. O único fundador e seu presidente vitalício era ele mesmo. O objetivo seria o de inviabilizar um eventual pedido de falência. Só que o Estado chumbou a fundação, e Henriques acabou a pregar sozinho, após o Tribunal ter declarado a insolvência da ENSINAVE.