Um morador de Melgaço não ganhou para o susto quando tomou conhecimento que a serpente que tinha invadido o seu quintal, uns dias antes, é uma das duas espécies em Portugal que podem ser potencialmente perigosas.
João Oliveira, que habitualmente regista a biodiversidade minhota em fotografia e vídeo, não precisou de se deslocar por entre muitos trilhos e serras para conseguir fotografar um dos animais mais valiosos para a biodiversidade do nosso território – a Víbora-de-Seoane (Vipera seoanei) -, uma das oito serpentes que habitam o Parque Nacional da Peneda-Gerês (PNPG) e uma das duas víboras que ocorrem em Portugal.
João Oliveira adianta que o animal foi acossado pelo cão da família e enroscou-se de forma ameaçadora numa aveleira, no seu quintal, localizado em Lamas de Mouro, a uma altitude de 1.010 metros. Depois de devidamente fotografada com recurso ao equipamento que estava mais à mão, a ‘víbora-preta’ seguiu em liberdade.
O fotógrafo conta que chegou a ter a tentação de lhe tocar, mas não o fez – e ainda bem -, porque trata-se de uma das quatro serpentes no nosso país que têm veneno e uma das duas que podem representar perigo para o ser humano, conforme deu conta o biólogo Pedro Alves, em entrevista publicada em O MINHO no dia 25 de maio de 2022.
Pedro Alves explicou que as víboras apresentam algum perigo em situações muito pontuais, principalmente no caso de serem crianças, idosos ou adultos não saudáveis. E também fez bem em deixar a serpente ir à sua vida, contribuindo assim para a diminuição da presença de ratos e insetos na sua propriedade.
“De qualquer forma, qualquer pessoa que seja mordida acidentalmente deve ir a um hospital, não sendo aconselhado o uso de garrote, chupar o veneno ou qualquer outra coisa que se vê tipicamente nos filmes de Hollywood”, adiantou, revelando que “essas soluções apenas irão piorar a situação”.
E diz como se faz: “A única coisa a fazer é essencialmente manter a calma e encaminhar-se para o hospital mais próximo, onde irão garantir que não existem complicações. Caso haja complicações, poderá ser aplicado um soro anti-ofídico polivalente, que é geral para todas as serpentes da Europa”.
Na mesma entrevista, o biólogo revelou que em todo o mundo estão identificadas cerca de 4.000 espécies diferentes de serpentes, marinhas e terrestres, na Europa existem 45 espécies, sendo a Península Ibérica uma das zonas mais ricas no contexto europeu.
Conhecida como “víbora-preta” ou “víbora-do-gerês”, a espécie em Portugal apresenta duas colorações diferentes: a melânica e a cantábrica, conforme deu conta Pedro Alves, com a primeira a apresentar elevada concentração de melanina, dando um aspeto total ou parcialmente negro, enquanto a outra apresenta uma cor cinza ou castanha com riscas dorsal e transversais.
Pedro Alves citou um estudo realizado nas Serras do Soajo e da Peneda que demonstrou que 85% dos indivíduos dessas populações apresentavam cor negra.
Ainda de acordo com o biólogo, não há nenhum plano específico para proteger a víbora-de-Seoane, “no entanto é alvo de investigação, principalmente pelos investigadores Fernando Martínez-Freiría e José Carlos Brito do Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos da Universidade do Porto (CiBio-U.P.)”.
No PNPG ocorrem 8 espécies de serpentes, das quais 6 são cobras e 2 são víboras: cobra-rateira (Malpolon monspessulanus), cobra-de-escada (Zamenis scalaris), cobra-de-água-viperina (Natrix maura), cobra-de-água-de-colar-mediterrânica (Natrix astreptophora), cobra-lisa-europeia (Coronella austriaca), cobra-lisa-bordalesa (Coronella girondica), víbora-cornuda (Vipera latastei) e víbora-de-Seoane (Vipera seoanei). Além destas, em Portugal, ocorrem mais 2 espécies de cobras: cobra-de-capuz (Macroprotodon brevis) e cobra-de-ferradura (Hemorrhois hippocrepis).