O Ministério Público (MP) pede a condenação de dois guardas transferidos do Posto Territorial da GNR do Sameiro, em Braga, devido à alegada fiscalização violenta num café, por considerar provado que cometeram crime de abuso de poder, vitimando o casal idoso proprietário do estabelecimento e tendo avisado antecipadamente o dono do café rival, que o iriam fiscalizar, perpetrando assim um outro crime, a violação de segredo por funcionário.
A procuradora da República, nas alegações finais, entende que se provou, no essencial, o libelo acusatório, segundo o qual os guardas Duarte Valadar e Bruno Rodrigues, em 09 de maio de 2018, para além de terem avisado o dono de um café, em Sobreposta, concelho de Braga, que iriam fiscalizar o seu estabelecimento comercial, que funcionava de forma completamente ilegal, ainda retaliaram contra o casal idoso dono do café vizinho que tinha denunciado a situação, humilhando o comerciante e a esposa, que tinha acabado de chegar de tratamento no Hospital de Braga.
Para a magistrada do MP, os guardas, Duarte Valadar e Bruno Rodrigues, que na ocasião foram imediatamente transferidos, segundo decisão superior do Comando Territorial de Braga da GNR, cometeram os crimes de abuso de poder e de violação de segredo por funcionário, pelo que deverão ser ambos punidos penalmente, tendo em conta a gravidade da conduta desses militares, mas que, por sua vez, negaram todas as acusações.
Defesa pede absolvição para ambos
A advogada Mariana Agostinho, defensora dos dois militares da GNR agora colocados, respetivamente, em Alfândega da Fé e Braga, pediu a absolvição para ambos, afirmando que se contiveram dentro das suas funções policiais.
Segundo a mesma advogada, do Escritório de Advocacia de João Magalhães, sediado em Braga, “ambos cumpriram bem a sua missão pró-ativa de patrulhamento determinada pelo Regulamento Geral de Serviço da Guarda Nacional Republicana, nunca se tendo excedido durante a fiscalização do estabelecimento, que continuava com várias irregularidades, até alguns meses depois de ter sido vistoriado, pelo que estiveram à altura das suas funções”.
Por isso mesmo, segundo a advogada, os militares devem ser absolvidos, pois na sua perspetiva “fizeram aquilo que lhes competia”, acrescentando que “a fiscalização, naquele mesmo café, foi fruto das circunstâncias, porque tinham sido alertados para outra situação e depois a tentarem perceber toda a situação depararam-se com irregularidades”.
Ao contrário daquilo que afirmou durante esta quinta-feira, o suboficial, sargento-ajudante Hélder Branco, a advogada entende que “os militares da GNR podem e devem fiscalizar, quando e onde quiserem, qualquer tipo de estabelecimento”, enquanto o graduado garante que “as fiscalizações obedecem a um plano prévio, até por uma questão de transparência”. Nesse sentido, o sargento testemunou ainda que nenhum dos dois arguidos integrava um grupo de militares do Posto da GNR do Sameiro encarregados da fiscalização programada e que é da iniciativa do Comando Territorial de Braga, que não pela vontade de cada um, e que esta intervenção no café não foi sequer averbada na respetiva guia de patrulha.
Problemas na GNR do Sameiro começaram aí
A última sessão do julgamento foi marcada pela revelação do então comandante do Posto da GNR do Sameiro, sargento-ajudante Hélder Branco, de que o clima de contestação no quartel, amplamente difundido nos órgãos de comunicação social, começou precisamente quando participou ao escalão superior dos guardas, Duarte Valadar e Bruno Rodrigues, a situação ocorrida em 09 de maio de 2018, dentro do café, realizada à revelia do Comando.
“Até essa ocasião estava tudo bem comigo e éramos todos amigos, mas desde aí passaram a queixar-se sempre de mim, por tudo e por nada, desde o meu primeiro dia de comando, no Sameiro e inclusivamente até no Posto da GNR do Gerês”, salientou aquele graduado.
“Pouco tempo antes tinha participado num convívio de camaradas com o Valadar, pois entrámos para a GNR na mesma data, só que quando eu participei dele e do guarda Bruno Rodrigues, como era a minha obrigação de comandante direto, eles e outros guardas do Posto da GNR do Sameiro, agarraram-se a tudo, foram buscar coisas antigas, que até essa altura estavam bem e depois passaram a estar mal, começaram a sair notícias nos jornais, todas contra mim, por eu exigir rigor e disciplina nos serviços das patrulhas”, acrescentou.
E pouco tempo antes da entrada do sargento-ajudante Hélder Branco, para o Comando do Posto da GNR do Sameiro, já havia problemas, inclusivamente com oficiais da GNR de Braga, num dos quais, o capitão Adelino Silva, numa ronda de rotina, apanhou um guarda de pijama, acabado de acordar, dentro das instalações, quando deveria estar de serviço de patrulha na rua, tendo sido também aquele alto responsável distrital alvo de contestação.
Segundo apurou O MINHO, o Posto Territorial da GNR do Sameiro é aquele que mais e piores problemas disciplinares internos tem, a nível de todo o distrito de Braga, pelo que em desespero de causa foram nomeados dois sargentos – e já não um sargento – para ali comandar, deixando de ser uma praça a ter as funções de adjunto de comandante do Posto, que era o cabo-chefe João Carvalho.