Engenheiro Civil, professor universitário e doutorado pela UMinho aos 28 anos, Artur Feio é, aos 45, o rosto da oposição socialista ao Executivo PSD/CDS na Câmara de Braga. Em entrevista a O MINHO diz que Ricardo Rio se preocupou em promover a imagem de Braga no estrangeiro, mas não preparou a cidade para acolher quem a procura nos domínios da habitação, da mobilidade e dos transportes.
Afirma que, no próximo mandato, o PS fará melhor, e está disponível para avaliar uma candidatura à próxima corrida eleitoral de 2025, se o Partido Socialista assim o entender, reconhecendo que tem competências adquiridas, uma larga experiência curricular e reconhecimento pessoal e profissional.
Numa entrevista que deu a O MINHO, Ricardo Rio disse que Braga é um exemplo em todas as áreas da governação. Concorda?
Olhando-se hoje para o concelho, facilmente se constata que, por exemplo, no domínio da habitação, Braga está bastante pior. Ao tempo da gestão socialista, e graças a uma política de municipalização de solos e de incentivos à construção, a cidade tinha grande oferta de casas a preços acessíveis, o que constituía fator de atratividade de pessoas e empresas, com os seus quadros qualificados.
Eramos, também, a cidade mais jovem da Europa. Havia algum défice na área da Cultura mas que estava, aos poucos, a ser colmatado. Assim, o slogan “é bom viver em Braga” tinha plena correspondência com a realidade, o que infelizmente hoje não acontece.
Agora, o atual Executivo optou por gerir o concelho de forma a torná-lo conhecido lá fora, num modelo de exportação da marca Braga, mas sem criar uma base real sustentável. Isto atraiu ainda mais pessoas para a cidade, mas sem que se tivesse pensado nas infraestruturas, na habitação, na rede viária, na mobilidade e nos transportes, mas também em creches onde os cidadãos possam deixar os filhos quando vão para o emprego.
“Sem habitação e mobilidade perde-se qualidade de vida”
Ou seja, o princípio da necessidade de haver sustentabilidade do crescimento não acompanhou a projeção da marca, criando uma situação de desequilíbrio. Os bracarenses foram, assim, as primeiras vítimas desse desequilíbrio, na medida em que viram a sua qualidade de vida agravar-se, mas os novos residentes também sofreram com as condições reais que encontraram na cidade. Pode-se publicitar que existem estudos teóricos que indicam que Braga é uma das dez melhores cidades para se viver na Europa, mas tal não faz muito sentido, pois não se pode comparar uma urbe de média dimensão como a nossa, com as grandes cidades europeias. Sou o primeiro a reconhecer, com indisfarçável orgulho, que é fácil gostar de Braga. Mas também temos de dizer, com muita pena, que viver aqui já não é tão bom como foi, pois sem habitação e sem corretas políticas de mobilidade perde-se qualidade de vida.
Casas com “preços exorbitantes”
O PS tem criticado a Câmara nomeadamente nas áreas da Mobilidade e da Habitação. Porquê?
No que toca à habitação é visível que as casas, quer para aluguer ou para compra, estão com preços exorbitantes, absolutamente inacessíveis ao comum dos bracarenses. Nesta área, é preciso avançar com a construção a preços controlados, mas sem criar mais bairros sociais. Fizemos uma proposta na Câmara, no sentido de se avançar com áreas para construção mais acessível, disponibilizando terrenos às grandes empresas do setor que hoje dispõem de técnicas de construção inovadoras, que permitem fazer obras com qualidade, mas de forma rápida. Essa proposta foi chumbada pela coligação de direita, que parece preferir o antigo modelo dos bairros sociais.
No que toca à mobilidade, há que concluir o processo de requalificação do Nó de Infias e impõe-se avançar, de imediato, para o prolongamento da Variante do Cávado, até à zona do hipermercado E.Leclerc. Essa obra retirará do centro urbano o trânsito de e para Vila Verde, Barcelos ou Guimarães, aliviando o caos atual na circulação urbana.
Sobre o Nó de Infias, importa dizer que é um paliativo, ainda que importante, mas que, por si só, não resolve os estrangulamentos que se registam na fluidez rodoviária. De resto, convém lembrar que esta Câmara já fez dois anúncios sobre o Nó, que estaria a arrancar em 2023, mas a verdade é que nunca mais avança.
Nó de Infias e Variante estão parados
Mas quer a obra de Infias quer a da Variante não são da responsabilidade do Governo? E são caras.
No que toca a Infias, há que sublinhar que o Município pagou metade do projeto, o que lhe reforça o direito de reclamar ao Governo que a obra avance. Mas não o faz. Para mais, e ao que julgo saber, o projeto final ainda não está terminado.
Quanto ao prolongamento da Variante, defendo que o Município devia avançar sozinho com a obra, investindo no projeto e nas expropriações de terrenos, sem estar à espera do Governo ou de fundos europeus. Era o que eu faria, de imediato, porque o projeto é fundamental e estrutural para o futuro do concelho.
Mas a construção da Variante não é demasiado cara? A Câmara tem meios suficientes?
Custará cerca de 30 milhões de euros, excluindo as expropriações. Esta câmara tem um orçamento anual de 120 milhões, não considerando as transferências do Estado para a Saúde e para a Educação. Como o projeto demora alguns anos a concluir, haveria dinheiro para o fazer, pagando nesse período. E sem cortar em áreas essenciais.
Entendo que é preciso avançar com os estudos, até porque a ideia inicial era a de atravessar uma zona das Sete Fontes, o que foi inviabilizado pela atual maioria, que retirou esse espaço canal de atravessamento do Plano Diretor Municipal (PDM).
Por falar nisso, o projeto do parque das Sete Fontes também não avança e o mesmo sucede com outras estruturas, como a da requalificação do Pavilhão Flávio Sá Leite ou do Estádio 1.º de Maio. E são promessas que nunca estarão concluídas neste mandato.
Outra medida que tarda a ser tomada – já ontem era tarde – prende-se com a premência no estudo para a reserva de um canal que possibilite, logo que possível, obviamente com apoios governamentais, a construção de uma via de circulação externa. Essa é uma obra fundamental para responder cabalmente ao forte crescimento da cidade, na medida em que possibilitará escoar todo o tráfego da capilaridade rodoviária urbana.
Avenida da Liberdade e BRT
Mas algo se tem feito, caso da requalificação da Avenida da Liberdade e do túnel, e do lançamento do projeto do BRT (Autocarro de Transporte Rápido).
Na Avenida da Liberdade, há que vincar que a obra não é uma mudança estrutural, é apenas como que uma limpeza de superfície, uma reabilitação urbana. Sendo certo que aparentemente fica melhor para transeuntes e bicicletas, pouco ou nada influi na melhoria da circulação automóvel, bem pelo contrário.
Já no que toca ao BRT, um projeto fundamental para o futuro, lamentamos que a conceção/construção tenha sido entregue aos Transportes Urbanos de Braga (TUB), empresa que não está vocacionada para tal, não tem experiência nem quadros técnicos para tal. E a verdade é que a Câmara acaba de contratar uma terceira pessoa para dirigir o projeto, porque, entretanto, duas já se demitiram.
Anda assim desde 2022…O BRT devia ser trabalhado por uma equipa multidisciplinar, um gabinete misto, criado na Câmara, em vez de estarem os TUB a liderar, porque não têm as competências para isso. E os técnicos da Câmara foram afastados.
“Circulação está caótica”
Mas o BRT vem resolver ou criar mais problemas ao trânsito? Há quem diga que, se se implementarem duas vias dedicadas para esse autocarro, ou seja, exclusivas para o seu uso, isso vai criar ainda mais estrangulamentos.
Se o projeto, de mais de 100 milhões, for bem feito trará grandes melhorias, sobretudo no aumento do número de cidadãos que usam o transporte público. Porque, nesta gestão autárquica, algo foi feito nos TUB, mas não é a comprar autocarros velhos dos STCP (transportes coletivos do Porto) que se consegue atrair pessoas para o transporte público. E a circulação está caótica, o que faz com que os autocarros andem atrasados, muitas vezes, mais de uma hora, criando graves problemas, por exemplo, a quem vai trabalhar ou a quem tem uma consulta no Hospital. Ou seja, o transporte público em Braga está a perder credibilidade.
Ora, o BRT, com duas linhas dedicadas, pode ajudar a resolver o problema, chamando passageiros e tirando carros da cidade. Isto, com a conclusão da Variante do Cávado e a tal requalificação do Nó de Infias.
Perda de fundos europeus para nova ETAR
O PS tem sido muito crítico da AGERE por causa do adiamento da construção da nova Estação de Tratamento de Águas Residuais (ETAR). Por outro lado, fala-se na possibilidade de remunicipalização da empresa.
No que toca ao adiamento da ETAR, entendo que é incompreensível a opção da Agere, de deixar cair o financiamento de nove milhões que estava garantido, num projeto orçamentado em 30 milhões, para ficar à espera de novos programas comunitários que possibilitem aumentar esse apoio.
Ora, a ETAR é fundamental para o concelho e a construção da estação de tratamento nem precisava de apoios, podia avançar logo, porque a empresa tem meios suficientes.
Sobre a hipótese de remunicipalização, haveria que falar com os parceiros privados, que têm 49 por cento do capital, e ver como se poderia pagar-lhes, até porque a Agere gera lucros para isso. É uma questão a estudar, para avançar, no próximo mandato.
Falta de terrenos e PDM
Outro dos problemas concelhios é o da falta de terrenos para construção. O PDM já foi revisto e enviado para aprovação, faltando apenas o parecer de algumas entidades estatais. E o vereador João Rodrigues conseguiu aumentar o número de terrenos urbanizáveis.
O vereador teve o cuidado de nos apresentar o projeto do novo PDM. É claro que é esse o caminho. Mas eu defendo que haja novos espaços para polos industriais de última geração, que permitam a instalação de indústrias de maior dimensão. Ora, presentemente Braga não tem essa capacidade.
O Artur vai no segundo mandato, está há quase sete anos no Executivo. Com a saída do Hugo Pires, no atual mandato, ficou a liderar a oposição. Daqui a menos de dois anos há eleições autárquicas. O PS tem hipótese de regressar ao poder?
Tenho procurado, enquanto vereador da oposição, portanto sem qualquer pelouro, defender os interesses dos bracarenses, criticando o que está mal e indicando alternativas para resolver os problemas da cidade. E conhecemo-los muito bem. Estudo os dossiers da governação municipal, percorro o concelho, ouço as pessoas, os autarcas e as instituições. Acho que o PS tem a responsabilidade, a que não se escusa, de propor à cidade um projeto consistente e realista, que oriente Braga rumo a um novo período de desenvolvimento sustentado e que contribua para recuperar a qualidade de vida perdida. Um projeto que corrija o que se fez mal ou não se fez, e resolva as carências mais prementes, sobretudo ao nível da habitação e da mobilidade…
Preparado para ser candidato
Pensa candidatar-se à presidência da Câmara em 2025?
Estou sempre disponível para fazer muito mais e melhor por Braga. Ainda é cedo para tomar decisões sobre essa matéria e a escolha compete aos órgãos concelhios e nacionais do PS. Conheço os problemas, tenho uma larga experiência na vereação e amplo reconhecimento pessoal e profissional. Sei o valor do planeamento e vivo em Braga, a minha cidade e de onde nunca quis sair. E não tenho dúvidas que vamos a tempo de tornar possível voltar a viver muito bem em Braga.