ARTIGO DE IVONE CRUZ
CEO LINK Cowork & Business (Viana do Castelo). Presidente M4P – Associação Nacional para Inovação e Desenvolvimento
Eu, tal como todos vocês, tenho vivido uma vida muito diferente daquela a que estou habituada.
O meu dia-a-dia sempre foi rodeado de muitas pessoas, de muita flexibilidade, de muita entrega pessoal e profissional, de família e amigos. Não posso propriamente dizer que até hoje não tenha vivido intensamente e que, por esse motivo, tenho arrependimentos de não ter feito algo que agora faria. Tenho é saudades, isso sim. Saudades de ir, de fazer, de estar. Saudades de decidir.
Eu, tal como vocês, tenho feito os impossíveis para “portar-me bem”, sentindo-me por vezes culpada quando estou a fazer uma caminhada para aliviar a tensão do confinamento a casa e do isolamento social, embora saiba que está recomendada e indicada para a nossa saúde física e mental. Tenho tentado pôr-me no lugar dos profissionais de primeira linha, não tivesse eu um em casa, ou amigos a desempenhar essa complexa tarefa. Essa consciência acrescida é também um dos motivos que nos leva a não estar com os nossos familiares inseridos no grupo de risco, o mesmo será dizer, os pais. Nem com os amigos. Nem com os conhecidos. Nem com os clientes.
Com ninguém.
Estamos isolados dentro das quatro paredes da nossa casa que, por privilégio, é confortável e ajuda a suportar este isolamento. Se houvesse um jardim e uma horta, melhorava consideravelmente. Tenho noção no entanto que há famílias numerosas confinadas a minúsculos apartamentos. Consciência de que há pessoas que estão a atravessar uma situação económica delicada (e “isto” ainda agora começou), com filhos menores a seu encargo. Irão valer-lhe as famílias e os amigos, assim o espero. E a tal solidariedade (frágil).
Vivemos um dia de cada vez, com os olhos postos num futuro incerto. Mais do que o era até agora. Leio artigos de variados pontos de vista, uns mais fatalistas, outros mais positivos, outros mais dramáticos. Todos inconclusivos. Compreendo que ninguém saiba bem o que nos espera, embora não precisemos de ser especialistas em estatística para analisar as probabilidades. Com tudo parado, a economia vai levar porrada (outra vez), e somos nós que vamos ficar com um olho negro.
Irão sobreviver os de sempre, mais os que vão ver oportunidades na desgraça. Vão igualmente manter a cabeça à tona aqueles que tiverem capacidade para se reinventar, adaptando o seu negócio às necessidades do mercado. Quero achar que é aqui onde me situo. Espero ainda conseguir arrastar alguns para este campo, motivando-os a pensar diferente e a procurar oportunidades no mercado. Não há tempo para lamentações, todos vamos sofrer o impacto.
A tecnologia irá ser rainha (se já não o era). Por força das circunstâncias, muitos percebem agora, finalmente, que não há necessidade de se deslocarem a Lisboa ou a Roma para participarem em reuniões. Que os alunos podem ter aulas à distância e que as compras chegam a casa, só com um clique. Todos estamos a vivenciar os impactos positivos que menos deslocações provocam no meio ambiente e na gestão do nosso tempo. Dizem que as pessoas serão ainda mais sensíveis a estas questões e que irão viajar menos, mesmo em lazer. Neste último segmento, tenho dúvidas. O trabalho independente, por força do contacto com o teletrabalho, irá precipitar-se.
Não sei se isto será verdade, ou se eu quero acreditar que seja. Há anos que promovo o trabalho por projetos como solução para alguns males. Convivo com pessoas bem-sucedidas que provam o conceito, ao trabalhar de forma independente ou remotamente para empresas – nacionais e estrangeiras- que as contratam por projetos “ com início e fim”. No entanto, tenho algum receio que ao serem implementados planos de teletrabalho à pressão, tipo fornada, possa levar a alguma falta de planeamento. Juntando à falta de conhecimento relativo a ferramentas tecnológicas colaborativas e de gestão, poderá conduzir a conclusões precipitadas e negativas sobre este modelo de operar.
Há poucas certezas e muitos desejos. Estamos banhados por um medo que nos paralisa.
Precisamos de repetir este movimento vezes sem conta até que saia de forma natural: levantar, sacudir e andar. Será a nossa capacidade de resiliência e de reinventar que irá conduzir-nos novamente para o carril. E ninguém nos vai colocar lá, somos nós. Depende de cada um, assim como da sua capacidade analítica e critica sobre o que o rodeia, de alguma visão e de muita humildade para aprender, reaprender.
Estamos juntos, vai ficar tudo bem, estamos todos no mesmo barco, mas uns estarão mais juntos, ou ficarão “bem melhor”, e é preciso pensar também que o barco tem vários compartimentos.
Desejo um futuro mais colaborativo, mais big data, com mais apoio à investigação, mais genuíno e menos superficial. Um futuro com maior interesse e participação da sociedade em tudo que lhe diz respeito. Mais concreto e menos abstrato.
Entretanto, enquanto estamos longe uns dos outros, a assistir a tudo o que nos rodeia, façamos o que nos compete. Cuidemos de nós e dos nossos, porque se cada um o fizer na sua esfera de influência, os resultados saltarão à vista. Saúde.
Ivone Cruz
CEO LINK Cowork & Business www.linkcb.pt
Ivone Cruz Apoio a projetos facebook.com/ivonecruzAP