O engenheiro arguido no processo da derrocada de terras, em 2013, em Mesão Frio, Guimarães, disse hoje em tribunal que o incidente se deveu a um fenómeno da natureza e à intervenção do empreiteiro e das Estradas de Portugal.
A posição foi assumida na primeira sessão de julgamento, que decorre no Tribunal Local Criminal de Guimarães, quase 11 anos após a derrocada, que ocorreu em 02 de abril de 2013, na freguesia de Mesão Frio, Guimarães, que cortou mais de duas semanas a variante que liga este concelho a Fafe.
O engenheiro civil, hoje com 51 anos, juntamente com outra engenheira civil – que será ouvida da parte da tarde – são os únicos arguidos no processo, acusados de infração de regras de construção, dano em instalações e perturbação de serviços.
O Ministério Público (MP) sustenta que, no contexto da construção de um empreendimento constituído por 10 casas de habitação, o empreiteiro construiu, de 15 de março de 2007 a 22 de fevereiro de 2008, um aterro, “em conjunto com os arguidos, que não observara as boas regras de construção constantes de normas regulamentares aplicáveis a tal tipo de realização, nomeadamente as relativas à drenagem e à composição do solo”.
“Como consequência direta e necessária de tais vícios de construção”, em 02 de abril de 2013 “os solos da obra, bem como o talude, deslizaram numa extensão de 60 metros e altura de 50 metros”, frisa o MP.
Perante o juiz, o arguido contou ter sido contratado pelo construtor para “fiscalizar a obra”, sublinhando que essa era a sua função e não a do “executor”, que era tarefa do empreiteiro, acrescentando que, quando assumiu o cargo, “grande parte do aterro já estava construído”, no qual, disse, não ter tido grande intervenção.
O engenheiro civil, que era o diretor da obra, defendeu que a derrocada se deveu a “um fenómeno da natureza”, referindo-se à acumulação de águas subterrâneas no inverno, devido à chuva, que nunca foi visível, e dificilmente seria, mesmo recorrendo a sondagens, e à “intervenção do construtor” no aterro, e das Estradas de Portugal, designação à data, que efetuou um corte “na base do talude” contíguo de “cinco a seis metros”.
O arguido descartou, contudo, qualquer tipo de atuação dolosa ou intencional de alguém, ressalvando que ninguém podia prever o deslizamento de terras, e que nem o construtor nem nenhum responsável iria avançar com uma obra “que pudesse vir a dar problemas mais à frente”.
Durante o ano de 2008, o então diretor de obra efetuou 18 visitas ao local para acompanhar e fiscalizar a obra, acrescentando que a empreitada sempre decorreu dentro da normalidade.
O engenheiro civil afirmou ainda que não conhece a outra arguida no processo, também engenheira civil, que vai prestar declarações à tarde.
Na sequência da derrocada, na variante à Estrada Nacional 201 (EN201) ficaram depositados 12.000 metros cúbicos de terra e lama e a estrada que liga Guimarães ao concelho vizinho de Fafe, esteve cortada durante mais de duas semanas.
As 10 habitações ficaram “descalças” e os respetivos moradores impedidos de lá entrar durante oito meses.
Em junho de 2019, o Ministério Público (MP) acusou a empresa responsável pela construção das 10 vivendas, os dois sócios-gerentes e os dois engenheiros.
Os arguidos requereram a abertura de instrução e, em fevereiro de 2022, o Tribunal de Instrução Criminal de Guimarães (TIC) decidiu não levar a julgamento nenhum dos quatro arguidos.
O MP interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Guimarães que, em 21 de novembro de 2022, reverteu a decisão, porém só quanto aos dois engenheiros.