De Guimarães ao topo do MMA. “Ser o melhor do mundo é o plano A, B e C” de Pedro Carvalho

Luta pelo cinturão de campeão mundial
Foto: DR

Há um momento na conversa com Pedro Carvalho que define cristalinamente a determinação e mentalidade de campeão de uma das maiores promessas mundiais do MMA (artes marciais mistas). Perguntávamos-lhe se caso vencesse o título de campeão do mundo no combate com Patrício Pitbull – adiado, ainda sem data, por causa da pandemia – isso seria um catalisador da modalidade em Portugal, quando o lutador natural de Guimarães corta a frase: “Desculpe interromper, é para corrigir o ‘se’. É ‘quando’ eu vencer”.

O vimaranense de 25 anos luta na Bellator, a segundo mais importante organização do mundo desta modalidade, na categoria de -67 quilos, e na qual ainda não perdeu um único combate.

O grande combate iria realizar-se em março passado, mas foi adiado devido à pandemia de covid-19. Apesar de contar para os quartos de final do torneio mundial, o circuito atribui o título a quem derrota o atual campeão – Patrício Freire, de 32 anos, mantém esse estatuto desde  abril de 2017.

“Vou enfrentar um dos melhores de sempre da Bellator. Lutar contra o Patrício é a melhor forma de mostrar que eu sou o melhor do mundo. Na Bellator não há ninguém maior do que ele para bater. Estou super feliz, porque depois de o vencer ninguém vai poder duvidar de mim”, atira a O MINHO o lutador que, desde que se tornou profissional, em 2012, soma 11 vitórias e três derrotas.

Guimarães: Pedro Carvalho prepara combate com campeão mundial

Para já, ainda não há data definida e está dependente da evolução da pandemia nos Estado Unidos da América, onde acontece a Bellator.

O lutador minhoto, natural da freguesia vimaranense de Polvoreira, espera que entre setembro e novembro já possa voltar a competir.

Nestes últimos meses, tem feito o possível para se manter em forma, apesar das limitações impostas pela covid-19. “Como não podia treinar com ninguém, não podia fazer contacto físico, treinava duas vezes por dia na mesma, fazia o meu melhor, mas investia nas coisas que pudesse fazer sozinho. Consegui manter-me em forma, não como se estivesse para um combate, mas se viesse hoje alguém perguntar-me se queria lutar, eu não hesitava em aceitar”, diz.

MMA foi “amor à primeira vista”

A paixão pelo MMA surgiu por acaso aos 13 anos: “Vi na televisão pela primeira vez e apaixonei-me imediatamente, mas na altura não tinha qualquer tipo de informação sobre o desporto, muito menos que havia na minha cidade”.

Só “uns tempos mais tarde”, através de um amigo, descobriu que a modalidade já era praticada em Guimarães. Essa conversa com o amigo foi “numa quarta-feira e no sábado estava a fazer a inscrição” para treinar com Rafael Silva na RS Team.

O que o apaixonou na modalidade? “Tudo”, responde, desenvolvendo: “Aquela forma diferente de lutar, tanto se luta em pé como no chão, contra a grade. Nunca tinha visto isso, nunca tinha visto uma modalidade de luta tão completa, com tantas opções e tantas formas de ganhar e de coisas que podem acontecer. Tudo aquilo fascinou-me. Foi amor à primeira vista”.

Ter como praticar a modalidade na terra natal foi importante no seu crescimento. “Sobretudo ter uma pessoa como o Rafael, que foi o meu primeiro treinador, para dar os meus primeiros passos, foi muito importante para mim. Ensinou-me muita coisa. Mais que tecnicamente, a nível psicológico, como abordar as coisas como lutador, ensinou-me muita coisa que ainda hoje carrego comigo. São as minhas bases, foi super importante na minha evolução como atleta e não estaria onde estou hoje se não fosse por aí”, salienta.

Também o apoio da família foi determinante. “A minha mãe e a minha tia, que me criaram, sempre me apoiaram em tudo. A minha mãe também sempre foi uma fã de desportos de combate e uma mente aberta em relação a tudo. Nunca foi um problema, bem pelo contrário, sempre me apoiaram e, quanto mais sério se tornava, mais elas me apoiavam”, refere o lutador que, desde janeiro de 2017, está radicado na Irlanda.

Parceiro de Conor McGregor

Mudar-se para a Irlanda foi o passo lógico de quem ambiciona ser o melhor do mundo. Pedro Carvalho treina no mesmo ginásio de Conor McGregor (“já treinámos juntos, conversámos, coisas normais de parceiros de equipa”) com o treinador John Kavanagh (“o melhor treinador do mundo”).

“Estar num sítio a treinar com outras pessoas que querem o mesmo que eu, só isso automaticamente já muda muita coisa, obriga a uma maior evolução e competitividade. Quero provar ao mundo que sou o melhor, mas tenho que ser o melhor, tenho que evoluir a esse ponto, foi essa a razão de querer cá estar, porque quero evoluir todos os dias. Podia vir para a Irlanda ocasionalmente, quando tivesse lutas, mas nunca seria a mesma coisa. Meti-me de pés e cabeça atrás no meu sonho”, sublinha.

A experiência na Irlanda está a ser bastante boa. Pedro Carvalho refere que, além de sempre se ter identificado muito com a cultura irlandesa, foi “bem recebido, bem tratado e apoiado, desde o primeiro dia”. Acolhimento, esse, que lhe deu “motivação extra”. “Não estou só a representar o meu país, também os estou a representar a eles [irlandeses], que fizeram tanto por mim, que me ajudaram a estar onde estou”, destaca, acrescentando que “o povo irlandês, de forma geral, é parecido com o português” e que a “grande diferença” é mesmo o tempo. “É mais cinzento, basicamente está a sempre a chover”.

“O meu ídolo sempre foi a minha mãe”

Quando lhe perguntámos sobre ídolos, Pedro Carvalho é explícito: “O meu ídolo de todos os tempos é a minha mãe. E a nível desportivo sempre fui eu”. “Há quem idolatre pessoas que não conhece, mas o meu ídolo sempre foi a minha mãe. Eu via o esforço que ela fazia, as horas que ela trabalhava para que não me faltasse nada. Ela, sim, é um ídolo, tornou-me no homem que sou”, realça.

Questionado por O MINHO se chegar à Ultimate Fighting Championship (UFC), a maior organização de MMA do mundo, é um objetivo, Pedro Carvalho salienta que, para já, está comprometido com a Bellator. O resto só o futuro dirá.

“Ainda tenho três lutas no meu contrato. Por acaso, é o número perfeito de lutas: entre a luta com o Patrício e a final, são mais três combates. Quando o torneio acabar e eu o vencer, o contrato acaba e aí veremos o que acontece: se renovarei com a Bellator, ou que outras propostas receberei. Mas para já estou na Bellator e o objetivo é tornar-me campeão do mundo e ganhar o torneio”, aponta o lutador vimaranense, que carrega o legado de conquistador de D. Afonso Henriques.

Na sua opinião, Portugal “está com um bom cenário no MMA”. “Ainda está a dar passos de bebé, mas está a dá-los”, ilustra, considerando que “é preciso haver duas ou três figuras em grandes organizações que brilhem” e depois será “uma questão de tempo até termos um ‘boom’ do MMA em Portugal”.

Daí ser muito importante para a evolução da modalidade em Portugal o sucesso de Pedro Carvalho na disputa pelo cinturão de campeão mundial. “Sem dúvida alguma, tenho noção de que este combate é muito importante para o MMA português, porque estamos a falar do primeiro campeão do mundo português de sempre, numa organização grande, e ser falado pelo mundo todo. É como se fosse uma bola de neve. Vai obrigar a haver mais informação sobre a modalidade, vai chegar a um ponto em que o MMA vai ser visto com normalidade e haverá maior facilidade para fazer mais eventos, organizar coisas com mais prestígio e até mesmo para os atletas terem mais patrocínios”, prevê o atleta, para quem o fator psicológico é “80% da luta”.

Foto: DR

“Cada um pode ter a sua ideia, mas o psicológico é 80%. Qualquer atleta treina duas vezes por dia, dá o seu melhor e fica em forma para o combate. Qualquer um consegue fazer isso, mas ter a visão, acreditar nessa visão e colocá-la em prática, isso são coisas completamente diferentes e faz uma diferença enorme”, constata.

“Vai haver alturas na luta em que estamos taco a taco, estamos os dois cansados, e quem tiver o psicológico mais forte, quem não se deixar vergar é que vai sair por cima”, completa, lembrando que o combate mais difícil que já teve foi em Portugal com Bruno Borges, no Invictus Pro MMA.

“Ganhei por decisão dividida. Foi a única vez na minha em que cheguei ao balneário, após algum tipo de atividade física e estava com dores de cabeça de tanto cansaço, tonturas, vomitei, de tão extremo que foi. Foi mesmo muito difícil a nível físico. Foi das coisas que mais gosto me deu, esse combate. O Bruno é um atleta espetacular, conseguimos dar um bom espetáculo e eu consegui a vitória”, lembra.

Pedro Carvalho foi talhado para o MMA e não faz sequer “a menor ideia” do que seria hoje se não tivesse enveredado por este caminho: “Nunca tive um plano B, ser o melhor do mundo é o meu plano A, plano B, plano C. Para mim, o se não der nunca existiu. Só existiu sempre o tem que dar. E foi a isso que me agarrei todos os dias, durante estes anos, a dar o melhor de mim nos treinos, para ser o melhor”.

Está a um combate de o provar ao mundo.

 
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