Associação indignada com obra em cascata no Gerês: “Espécie de circo” e “cenário artificial e urbano”

Ambientalistas dizem que Parque Nacional “está a ser continuamente degradado”
Foto. CM Terras de Bouro

A Fapas – Associação Portuguesa para a Conservação da Biodiversidade manifestou hoje indignação com as obras previstas para a Cascata da Fecha Barjas, popularmente conhecida como “Cascatas do Tahiti”, em Terras de Bouro, em pleno Parque Nacional da Peneda-Gerês (PNPG).

Reagindo à notícia avançada ontem em primeira mão por O MINHO, a Fapas considera que a obra anunciada vai “fazer da Cascata da Fecha de Barjas (a que alguns erradamente chamam ‘Cascatas do Tahiti’) uma espécie de circo, transformando um troço de paisagem natural, das mais valiosas do PNPG, num cenário completamente artificial e urbano, a avaliar pelas fotos 3D divulgadas, e mesmo este de duvidosa qualidade”.

A associação ambientalista reconhece “a sucessão de acidentes que tem ocorrido naquele local, fruto da impreparação para andar na serra e da temeridade de alguns”. Mas, contrapõe, “a Cascata da Barja não oferece maiores perigos que fazer percursos pedestres na restante área do PNPG (ou noutra área montanhosa), por quem não esteja preparado para a montanha”.

E defende que, “com medidas mais simples e baratas do que as anunciadas, o problema resolvia-se”.

“A tutela do rio Arado, que forma a cascata da Barja, é do ICNF/Parque Nacional e da Agência Portuguesa do Ambiente, a quem iremos apelar para colocarem ordem e cumprirem a legislação quanto a esta obra! Se, porventura, já houver licenciamento, apelaremos à Senhora Ministra do Ambiente para o revogar e responsabilizar disciplinarmente o(s) autores”, pode ler-se no comunicado hoje enviado a O MINHO.

A Fapas espera “que não se repita, aqui, o que está a acontecer em Castro Laboreiro, também Parque Nacional da Peneda-Gerês, desde março de 2023, a construção de uma estrutura em pleno leito do Rio Laboreiro, com conhecimento da APA e do ICNF”.

“Em nota de imprensa de 24/03/2023 a APA escreveu: ‘Perante as evidências, a APA/ ARH do Norte notificou hoje (24 de março de 2023) o município de Melgaço da sua Intenção de ordenar a reposição da situação anterior à realização desta obra, no sentido de se salvaguardarem os objetivos ambientais de ocupação e proteção estabelecidos na Lei da Água, no Regime de Utilização e da Titularidade dos Recursos Hídricos, em ação concertada de medidas de conservação e de reabilitação desta área territorial afetada pela execução da empreitada….’. Mas até agora, que saibamos, nada foi feito”, acusa a associação.

E conclui: “O nosso único Parque Nacional está a ser continuamente degradado, e a totalmente errada lei da cogestão das áreas protegidas, ‘inventada’ pelo anterior titular da pasta do ambiente só veio agudizar os problemas. Aguardamos a revogação ou alteração dessa lei (Decreto-Lei nº 116/2019), o reposicionamento dos autarcas no seu lugar apropriado, e a nomeação de diretores das áreas protegidas, tal como prometido no programa do atual governo”.

Como O MINHO noticiou em primeira mão, foi adjudicado o contrato de concurso público para o ordenamento da visitação à Cascata da Barja, em Terras de Bouro, pelo valor de 205 mil euros (+IVA), levando ao início das obras que visam criar uma visita mais segura para os turistas que procuram as famosas “cascatas do Tahiti”.

A obra foi adjudicada à construtora Qualidade Group, com sede em Felgueiras.

Durante o período de obras, o local estará vedado por chapa metálica lacada com dois metros de altura e portões, criando ainda um estaleiro e o seu acesso para circulações independentes para a empreitada.

As obras incidem na criação de uma estrutura metálica apoiada em formato tipo estacas que servirá como miradouro para as cascatas, incluíndo a colocação de gradeamento e outras intervenções ao redor da cascata para melhorar o acesso.

O prazo das obras é de 120 dias, esperando-se por isso que no próximo ano o local esteja pronto para receber os turistas de verão.

A desmontagem do estaleiro inclui a limpeza, as demolições e reposição do terreno e demais instalações provisórias nas condições iniciais, garante o Caderno de Encargos consultado por O MINHO.

Imagem: CM Terras de Bouro

Estas obras surgem da vontade do presidente da Câmara de Terras de Bouro em tornar aquela zona, bastante concorrida no verão, num local mais seguro para visitação, dado o elevado número de acidentes que ali ocorrem anualmente, alguns resultando na morte de turistas.

A posição de Manuel Tibo tinha sido assumida pelo autarca em declarações a O MINHO em março de 2022 e reafirmada, em maio do mesmo ano, durante uma visita do então secretário de Estado da Conservação da Natureza, das Florestas e Ordenamento do Território, João Catarino, ao Parque Nacional da Peneda-Gerês (PNPG).

“Quero que a cascata do Tahiti tenha, de facto, um local de visitação, que seja um miradouro de excelência arquitetónica, incluído na paisagem, mas, não consigo, enquanto responsável máximo da proteção civil em Terras de Bouro, conceber que as pessoas vão utilizando a cascata do Tahiti, acabam por ter acidentes, alguns deles, infelizmente, mortais”, considerou Manuel Tibo.

Com Fernando André Silva

 
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