Pedro Bourbon afirma em entrevista à SIC que não encomendou morte do empresário João Paulo Fernandes, raptado, assassinado e dissolvido em ácido sulfúrico
O ex-advogado Pedro Bourbon, de Braga, tido como mandante do assassínio, em 2016, em Braga, do empresário João Paulo Fernandes, cujo corpo foi dissolvido em ácido sulfúrico, manifestou, esta noite, em entrevista à televisão SIC a sua inocência no caso: “concordo com a sentença exceto no que toca à minha condenação”, declarou.
Bourbon foi condenado, com mais quatro homens, entre eles dois irmãos seus, a 25 anos de prisão, pela conceção e participação no homicídio.
Em março de 2016, o empresário de Braga, João Paulo de Araújo Fernandes, de 41 anos, foi raptado e agredido à frente da filha, de oito anos, na garagem do prédio do apartamento onde residia em Lamaçães, em frente ao hiper da Makro.
No dia seguinte foi torturado e estrangulado pelos arguidos e o seu corpo dissolvido em ácido sulfúrico num armazém em Valongo.
Na entrevista, autorizada pelo juiz de execução de penas – conforme O MINHO havia anunciado – negou ter sido ele quem concebeu e incitou os outros arguidos a matarem o malogrado empresário.
Confrontado pelo jornalista da SIC sobre o teor das escutas telefónicas que o incriminam, Pedro Bourbon deu a entender que terão sido retiradas do contexto, e lamentou que não o deixem ter acesso às mais de 30 mil escutas gravadas pela PJ do Porto, logo a seguir ao crime. Estas – sustenta – iriam provar que nada teve a ver com o caso.
Disse que não ficou com dinheiro nem com bens da empresa do pai do malogrado empresário, que os juízes consideraram como uma das motivações para a encomenda da morte de João Paulo Fernandes, de quem fora amigo.
Das suas declarações ressalta, ainda, o facto de ter dito que soube dos pormenores do crime, mas nada contou à Polícia para não comprometer os irmãos e voltou a afirmar que, no dia do crime estava em Lisboa e no dia seguinte, foi para Évora para uma reunião da Distrital do PDR, de que era secretário-geral.
Foi essa a versão que contou a 12 de março, um sábado, no dia a seguir ao rapto, ao autor destas linhas, após contacto telefónico. Nesse dia, foi ouvido informalmente pela PJ do Porto, a quem contou o mesmo álibi.
Só que, dias depois, foi ouvido, pelo menos duas vezes, a falar com o Emanuel Paulino, um bracarense conhecido como o Bruxo da Areosa, por ali ter uma ervanária e dar consultas – sobre o crime.
Na conversa televisiva de hoje, como que se manifestou arrependido de ter ficado em silêncio em julgamento, facto que, de resto, não soube explicar. E adiantou que está a escrever um livro sobre o processo.
Recorde-se que, a meio do processo, Pedro Bourbon pediu ao juiz que não o colocasse na mesma prisão com o Bruxo da Areosa, por temer que este o matasse. As comadres haviam-se zangado…
Penas sem recurso
As penas aplicadas aos seis autores do horrendo crime transitaram já em julgado com a recente recusa do Tribunal Constitucional, por falta de fundamento legal, em aceitar os recursos interpostos pelos arguidos Adolfo e Manuel Bourbon, Rafael Silva e Helder Moreira.
A decisão tornou efetivas as penas de 25 anos de prisão, por sequestro, homicídio qualificado e profanação de cadáver, aplicadas a seis arguidos, no Tribunal de São João Novo do Porto e depois confirmadas pelo Tribunal da Relação e pelo Supremo Tribunal de Justiça.
No entanto, o Tribunal da Relação do Porto reduziu para 23 anos de cadeia a condenação de Hélder Moreira, considerando que foi apenas cúmplice não tendo intervido diretamente no homicídio, tendo apenas cedido o armazém. Pena que desceu para 19 anos, no Supremo.
Assim, os irmãos Pedro, Manuel e Adolfo Bourbon (os dois primeiros advogados de profissão), Rafael Silva, e Emanuel Paulino (conhecido como Bruxo da Areosa), vão cumprir 25 anos de prisão.
Indemnizações à filha menor
Neste momento, estão em curso as tentativas da família da vítima de conseguir bens que garantam a indemnização, cerca de 600 mil euros ao todo. A ex-mulher, a filha, e os pais de João Paulo Fernandes têm direito aos seguintes valores: 10 mil euros para a ex-mulher, 495 mil para a filha (danos patrimoniais e morais), hoje com 12 anos, e 80 mil para os progenitores (40 mil para cada). Montantes a que acrescem juros desde o início do julgamento, em 2017.
A ex-mulher e a filha são defendidos pelo escritório do advogado André Lajes, enquanto que os pais são representados pelo escritório de José Dantas. O pagamento, cerca de 100 mil euros a cada um, é feito solidariamente, mas as vítimas podem executar os bens de um dado arguido, o qual, de seguida, terá de mover uma ação contra os outros para reaver o dinheiro.
Danos futuros
O acórdão condenatório prevê, ainda, a possibilidade de a principal vítima, a filha do malogrado empresário, vir a sofrer “danos futuros”, do foro material ou moral, derivados do facto de ter presenciado o rapto do pai e de ainda não ter consciência plena do que lhe sucedeu, ou seja, de ainda não saber que foi morto, depois de torturado. “Danos que serão avaliados em sede de “execução de sentença”.
Na noite do crime, a menina, ao ver o pai a ser agredido pelos raptores, ainda teve o discernimento de subir as escadas da garagem e dirigir-se à farmácia do prédio a pedir socorro.
Rapto em frente à criança
Em Tribunal ficou provado que os cinco principais arguidos se organizaram entre si, criando uma estrutura humana e logística com o propósito de sequestrar o empresário, de o matar e de fazer desaparecer o seu cadáver.
Com isso, pretendiam impedir a reversão de um estratagema mediante o qual o património dos pais da vítima fora passado para uma sociedade controlada por dois dos arguidos.
Na execução do crime, e depois de terem monitorizado as rotinas da vítima, quatro dos arguidos dirigiram-se, em 11 de março de 2016, a Braga, em dois carros roubados no Porto, numa empresa de comércio de automóveis.
Abordaram o empresário por volta das 20:30” daquele dia, “meteram-no no interior de um dos veículos automóveis e levaram-no para um armazém em Valongo, onde o mataram por estrangulamento, acabando por dissolver o cadáver em 500 litros de ácido sulfúrico, já noutro armazém, sito em Baguim do Monte”, no concelho de Gondomar.
Amigo que mata amigo
O João Paulo e o Pedro Bourbon eram amigos de juventude. O primeiro trabalhava com o pai numa bem sucedida empresa de construção. O outro tornou-se advogado, herdando o escritório do progenitor. A crise de 2009/10, que afundou o imobiliário, ligou-os profissionalmente. O João aconselhou o Pedro ao pai, para tentar salvar o negócio. Especialista em esquemas, o jurista propõs esconder os bens. Veio a tomar conta dos haveres da firma, a meias com o Bruxo. E não os restituía. As relações degradaram-se com ações judiciais. O João ameaçou contar tudo à PJ. Assinou aí a sua sentença de morte. Para não lhe entregarem o que reclamava, dinheiro e prédios, dele e da família, foi condenado à morte.
Danos futuros
O acórdão condenatório prevê, ainda, a possibilidade de a principal vítima, a filha do malogrado empresário, vir a sofrer “danos futuros”, do foro material ou moral, derivados do facto de ter presenciado o rapto do pai e de ainda não ter consciência plena do que lhe sucedeu, ou seja, de ainda não saber que foi morto, depois de torturado. “Danos que serão avaliados em sede de “execução de sentença”.
Na noite do crime, a menina, ao ver o pai a ser agredido pelos raptores, ainda teve o discernimento de subir as escadas da garagem e dirigir-se à farmácia do prédio a pedir socorro.
Família pede 400 mil à ABB, mas esta exige-os ao Bruxo
400 mil euros. É esta a quantia pedida à empresa ABB-Alexandre Barbosa Borges II – Imobiliária, S.A, de Braga, pela família do empresário assassinado em março. Mas a firma bracarense alega que já pagou essa quantia ao Emanuel Paulino, o ‘Bruxo da Areosa», que representava João Paulo Fernandes na Climalit, onde a imobiliária comprou 50 por cento das ações.
Como tal, a ABB pôs, em setembro, uma ação pauliana – de restituição de bens, os mesmos 400 mil -, a João Paulo de Araújo Fernandes e a Emanuel Marques Paulino.
A ação está na Unidade Cível de Braga, a aguardar que a morte seja declarada oficialmente, já que, juridicamente, é, ainda, uma “morte presumida”. Terá ainda de se fazer uma habilitação de herdeiros.