Nuno Melo chega à liderança do CDS-PP depois de vários anos a adiar o “passo em frente” que muitos previam desde que se fez notar como parlamentar e rosto destacado nas direções de Paulo Portas.
Depois de o partido ter ficado sem deputados nas legislativas de 30 de janeiro pela primeira vez, Melo assumiu como “obrigação dar um passo em frente” e candidatar-se à liderança para “salvar o CDS” no momento mais difícil dos 47 anos da sua história.
Nuno Melo, 56 anos, nasceu em Joane, Vila Nova de Famalicão, e chegou à Assembleia da República na VIII legislatura, em 1999, eleito por Braga, círculo pelo qual concorreu nas duas legislaturas seguintes, sendo eleito líder parlamentar em julho de 2004 e vice-presidente do parlamento em 2007.
Na Assembleia da República, fez-se notar em várias das comissões de inquérito que investigaram a queda do avião que vitimou Sá Carneiro e Amaro da Costa em Camarate, presidindo a uma delas, e teve também um papel central num outro inquérito parlamentar sobre o Banco Português de Negócios.
Foi um dos rostos em ascensão na primeira liderança de Paulo Portas e, quando este deixou a presidência do partido, em 2005, também um dos primeiros a verbalizar as saudades, já sob a direção de José Ribeiro e Castro.
Num jantar de Natal do CDS-PP, em 2006, Nuno Melo disse que o CDS “sentia falta” do ex-líder Paulo Portas e afirmou que iria trabalhar para que o partido pudesse ser “bem liderado”, o que lhe valeria a retirada da confiança política por parte de Ribeiro e Castro e culminaria na sua demissão de presidente da bancada em janeiro de 2007.
Com o regresso de Portas à presidência do CDS-PP, Nuno Melo sobe a vice-presidente da Assembleia da República e, em 2009, é escolhido como cabeça de lista do partido ao Parlamento Europeu, lugar que repete em 2014 e em 2019, mantendo-se em Bruxelas até hoje.
Pai de gémeos, um menino e uma menina, João Nuno Lacerda Teixeira de Melo, nascido a 18 de março de 1966, é licenciado em Direito e foi advogado de profissão, antes de se dedicar à carreira política.
Atualmente, é presidente da distrital de Braga, cargo que desempenha há vários anos.
No partido, foi vice-presidente de Paulo Portas e, mais tarde, de Assunção Cristas e o seu nome começou a ser falado como possível candidato a líder há muitos anos, desafio que sempre rejeitou até agora.
Em 2005, quando Telmo Correia avançou contra Ribeiro e Castro, Nuno Melo chegou a ser pressionado por várias distritais para ser ele o candidato e, em 2016, era mesmo o nome mais provável para suceder a Portas.
No entanto, acabou por manifestar apoio a Assunção Cristas, elogiando o seu desempenho como ministra, dizendo que poderia gozar de um “estado de graça” que ele dificilmente teria, e invocando até a sua condição de mulher como uma vantagem para marcar a diferença relativamente a Paulo Portas.
“O CDS precisa, quando o doutor Paulo Portas sai, que essa diferença seja assinalada”, considerou, argumentando que “não haverá um partido feito de portismo sem Paulo Portas”.
Na primeira vez que encabeçou a lista que o CDS apresentou em nome próprio ao Parlamento Europeu, em 2009, Nuno Melo tomou a dianteira nas ações de rua na campanha eleitoral, mostrou-se expansivo e comunicativo, conseguindo a eleição de dois deputados.
Em 2014, na campanha para as europeias, a que o CDS-PP concorreu em coligação com o PSD, ficou célebre um brinde que fez com o cabeça de lista social-democrata, Paulo Rangel, por altura da ‘saída limpa’ do processo de ajuda externa da ‘troika’.
Nuno Melo foi o primeiro a beber, diretamente pela garrafa, passando a Paulo Rangel: “Se não tiveres nojo”. Rangel não teve e bebeu.
Mais recentemente, em julho do ano passado, nas últimas jornadas parlamentares do CDS-PP, Nuno Melo voltou a ‘agitar as águas’ com um longo discurso num jantar em que atacou a direção do líder Francisco Rodrigues dos Santos, no que foi encarado como o tiro de partida da sua candidatura.
Quando lhe deu a palavra, o então líder parlamentar, Telmo Correia, afirmou que “o mundo vai ficar verdadeiramente estranho no dia em que não esteja ao lado do Nuno Melo”.
Meses mais tarde, em outubro, apresentou a candidatura, no Porto, por “um imperativo de consciência”.
Amante de carros clássicos, chegou ao Congresso no sábado ao volante de uma Renault 4L branca, um dos vários veículos clássicos que tem na garagem, e que usa nos seus passeios pelo Minho.
“Eu quero construir pontes. Acho que temos que dar um sinal ao país e não venho aqui escavar ainda mais trincheiras, conto realmente com todas as pessoas que tenham disponibilidade, talento e que estejam de boa-fé”, afirmou o único eurodeputado eleito pelo CDS-PP.
“Oposição eficaz que ocupe espaço entre PSD e Chega”
Nuno Melo afirmou hoje como desígnio voltar à Assembleia da República, sustentando que o partido faz falta para ocupar o espaço entre o PSD e o Chega e quer fazer uma “oposição eficaz” ao Governo.
“O que nos resta é ser oposição muito mais eficaz para que amanhã os portugueses tenham uma alternativa e não vejam num mal pior aquilo que realmente, no que nos respeita, não é melhor. E isso passará por nós, passará pelo CDS”, afirmou o líder no discurso de consagração perante o 29.º congresso e após a eleição da sua Comissão Política Nacional.
E lamentou que o governo do PS tenha conseguido o apoio de uma maioria absoluta, “apesar das falhas no combate aos incêndios em 2017, de Tancos, das golas antifogo que afinal ardiam, da ocupação forçada de casas privadas em Odemira, da incapacidade em fiscalizar as condições de trabalho de migrantes em Portugal, do ataque ao SEF e informações falseadas no processo de nomeação do procurador europeu”.
Nuno Melo insistiu que o CDS-PP “faz falta a Portugal” e “não morreu para a democracia” nas eleições legislativas de janeiro, que ditaram o afastamento do partido da Assembleia da República, e traçou como um desígnio voltar a eleger deputados.
E destacou que o partido “está cá” e “não acabou” enquanto tiver autarcas, deputados europeus e integrar os governos das regiões autónomas.
Afirmando que o primeiro-ministro “tem os olhos no Terreiro do Paço mas, ninguém duvide, está já com o coração em Bruxelas” e que “isso parece mais ou menos nítido”, acredita que a saída de António Costa pode significar eleições antecipadas.
O presidente democrata-cristão declarou que “não é a mesma coisa ter o doutor António Costa ou ter o doutor Fernando Medina, com a mesma facilidade com que o doutor António Costa na Câmara de Lisboa quis passar a pasta ao doutor Fernando Medina”.
Apontando que não sabe “se a contratação [do agora ministro das Finanças] teve a ver com isso ou não”, falou diretamente para a dirigente socialista Ana Catarina Mendes, presente no encerramento do congresso, afirmando, entre risos, que a ministra “também não deixava”.
“Nós somos pela estabilidade dos mandatos, mas se tivermos eleições legislativas antecipadas, o CDS estará preparado e será nesse dia que voltará à Assembleia da República”, salientou.
E defendeu que “quando a IL se quer sentar à esquerda do PSD”, o PSD se posiciona “rigorosamente ao centro” e “basicamente o Chega se quer sentar à direta do regime”, existe “todo um espaço deste humanismo personalista entre o PSD e o Chega que faz nisso um buraco doutrinário que não está na Assembleia da República”.
“Somos nós e queremos lá voltar”, sublinhou, dizendo sentir “angústia” pela perda de representação parlamentar porque “não é justo”, e que o CDS não se pode conformar “com o facto de a “parcela da sociedade” que representa “não tenha hoje uma voz” no parlamento.
E salientou que é necessário “reagir” e “construir” ao invés de “deprimir”, pedindo aos militantes que acreditem.
Considerando que o futuro do CDS nos próximos anos será “carregado de obstáculos”, Nuno Melo ressalvou que, perante as adversidades, o partido “reergueu-se sempre mais forte” e não desistiu de lutar.