Um homem de Guimarães pediu em tribunal uma indemnização de 180 mil euros a uma advogada da cidade e à seguradora que trabalha com a Ordem dos Advogados por a jurista ter, alegadamente, entregue um recurso fora do prazo, o que lhe teria causado um prejuízo. Mas o Tribunal da Relação de Guimarães não lhe deu razão.
Na ação, António A., alegava que, em julho de 2012 celebrou um contrato de mandato forense com a jurista de modo a assegurar a sua defesa num processo que correu no Tribunal de Braga, onde de peticionava a sua condenação no pagamento de 150 mil euros, no quadro de uma transação que envolvia automóveis.
Em março de 2015, foi proferida sentença que julgou a ação parcialmente procedente e, em consequência, declarou válida a resolução operada pelo autor do contrato-promessa celebrado. e condenou-o a pagar 130 mil euros, a título de devolução, em dobro, dos veículos entregues como sinal, acrescido de juros de mora.
Face à decisão, decidiu, após conversação com a advogada, interpor recurso para a Relação de Guimarães, “atendendo à manifesta probabilidade de êxito do mesmo”.
Mais alegou que a jurista fez o recurso em 25 de junho de 2015, tendo o Tribunal da Relação, decidido não conhecer do objeto do recurso por ter sido interposto após o prazo legal.
“Tal situação não me foi transmitida, e só vim a ter dela conhecimento com a citação em janeiro de 2021 para a ação executiva, (para pagar os 130 mil euros) que correu termos no Juízo de Execução de Famalicão”, disse.
António A. salientou que a situação lhe causou “grande angústia e transtorno”, e sustentou que a advogada, “de forma dolosa o enganou quanto à verdadeira situação existente e lhe fez crer que o recurso tinha sido atempadamente interposto e estaria a aguardar a competente decisão”.
“A advogada não atuou com o zelo, diligência, cuidado e cautela exigíveis no caso concreto, tendo violado de forma grave e grosseira os mais elementares deveres contratuais e deontológicos, incumprindo, deste modo, o contrato de mandato forense”, afirmava.
Referia, ainda, que, do incumprimento do contrato resultaram danos patrimoniais de 130 mil euros correspondentes ao montante a que foi condenado a pagar na sentença proferida no processo, e danos não patrimoniais traduzidos na angústia, preocupação, desgosto, problemas conjugais e de saúde, e até da sua honra e bom nome, que cifra em quantia não inferior a 50 mil.
Advogada explica-se
Na contestação, a causídica negou ter violado qualquer obrigação decorrente do contrato. Alegou ter interposto recurso, no segundo dia útil após o termo do prazo que dispunha para o efeito, considerando que foi notificada daquela decisão no dia 22 de abril de 2015, ainda que “as hipóteses de sucesso estivessem seriamente comprometidas por falta de fundamentos, como fez questão de deixar claro ao autor e à esposa”.
Após descrever a forma como procedeu à contagem do prazo para a interposição de recurso, invocou que o Tribunal da Relação, entendendo que a sentença objeto do recurso tinha sido notificada em 21 de abril de 2015, o que levou a uma contagem do prazo diferente da que propugnava, decidiu não conhecer daquele recurso por extemporâneo.
Referiu, ainda, que sempre deu conhecimento de todas as vicissitudes processuais, mormente do desfecho da inadmissibilidade do recurso, tendo-o informado da possibilidade de reagir processualmente contra a decisão que rejeitou o recurso, por extemporâneo, sendo que este nunca lhe transmitiu essa vontade, criando-lhe a convicção de que se tinha conformado com tal decisão.
A Decisão
Agora, os juízes da Relação vieram dizer que ”o incumprimento dos deveres adstritos ao advogado pela celebração do contrato de mandato pode determinar a sua responsabilidade civil contratual pelos danos daí decorrentes para o mandante e, consequentemente, a obrigação de indemnizar”.
Só que – sustentam – “o perfilhar de entendimento diverso daquele que é defendido pelo Tribunal, quanto à contagem do prazo de recurso, não pode consubstanciar a violação de qualquer dever por parte de um mandatário constituído”.
E concluem: “Para haver dano da ‘perda de chance’ suscetível de indemnização, não basta a prova da conduta ilícita do advogado, não basta a prova do ato/facto lesivo, uma vez que segundo o instituto jurídico invocado não há reparação sem estar também provada a existência dum dano e causado por tal ato/facto ilícito, sendo também necessário que esse incumprimento pudesse conduzir, com um elevado grau de probabilidade, à procedência da pretensão do lesado”.
E, assim, rejeitou o pedido de indemnização.