A queda de um helicóptero ao serviço do INEM, que levou à morte de quatro pessoas, mostrou haver falhas nos procedimentos de socorro, nomeadamente da NAV Portugal, do 112 e do Comando de Operações de Socorro do Porto.
Divulgado hoje, o relatório preliminar que o ministro da Administração Interna ordenou à Proteção Civil para verificar o funcionamento dos mecanismos de reporte da ocorrência e de lançamento de alertas refere falhas e vai ser enviado hoje aos ministros da Defesa e do Planeamento e ao Ministério Público.
As falhas apontadas são, segundo o Presidente da República, demonstrações de que “o Estado falhou”, tendo a coordenadora do BE, Catarina Martins, defendido que “deve ter consequências” e o presidente da Comissão Distrital do Porto da Proteção Civil avançado com a necessidade de criar uma central única regional.
A queda do helicóptero aconteceu no final da tarde de sábado, após o aparelho ter desaparecido do radar, na zona de Valongo, perto do Porto.
De acordo com o INEM, o último contacto com o helicóptero – onde seguiam uma enfermeira, um médico, o comandante e o piloto – foi registado por volta das 18:30, não se sabendo a que horas desapareceu.
Segundo a NAV, empresa que gere a navegação aérea, a Força Aérea – “que é quem ativa a busca e salvamento” nestes casos – foi alertada às 19:40, mas, de acordo com o porta-voz deste ramo das forças armadas, o helicóptero de busca só saiu da base do Montijo pelas 21:45.
Duas horas que são explicadas pela Força Aérea, referindo ter primeiro contactado a Autoridade Nacional da Proteção Civil, a GNR de Baltar e a GNR do Porto, tendo estas entidades informado não ter conhecimento de nenhuma ocorrência, além da GNR de Massarelos, cujo telefone estava indisponível.
O relatório preliminar da Proteção Civil indica, no entanto, que “o contacto com o Rescue Cordination Center (RCC), da Força Aérea Portuguesa, para a identificação de um possível acidente com uma aeronave, tanto por parte da NAV Portugal como do CONOR [Centro Operacional do Norte do 112], não foi efetuado com a necessária tempestividade, podendo ter comprometido o tempo de resposta dos meios de busca e salvamento”.
Segundo o documento, colocado esta manhã na página da internet da ANPC, a NAV Portugal, responsável pela gestão do tráfego aéreo, desenvolveu, durante 20 minutos (das 19:20 às 19:40) “as suas próprias diligências, em detrimento do cumprimento do estipulado na Diretiva Operacional Nacional n.º 4 – Dispositivo Integrado de Resposta a Acidentes com Aeronaves”.
Segundo a NAV, foi através da GNR que o Centro de Busca e Salvamento ficou a saber que um popular tinha telefonado e relatado “ter ouvido um barulho estranho”.
Às 20:14, adiantou a NAV, a Força Aérea alterou o estado de prontidão do helicóptero de busca de 45 minutos para 15 minutos em preparação para ativação. A sua ativação aconteceu às 20:37, mas ficou a aguardar coordenadas, que forzm enviadas pela operadora da Rede Nacional de Emergência e Segurança (SIRESP) às 21:33. Dois minutos depois, o helicóptero de salvamento descolou do Montijo em direção à zona de operações.
A fita do tempo divulgada pela NAV dá ainda conta de que a empresa contactou, às 19:20, os Comandos Distritais de Operações de Socorro (CDOS) do Porto, Braga e Vila Real “que não atenderam”.
“Só após contactar o CDOS de Coimbra, que reencaminhou a chamada para o Porto, é que se conseguiu contactar o CDOS do Porto”, vincou a NAV.
Tanto o CDOS de Braga como o de Vila Real recusaram não ter atendido a chamada, garantindo ter operadores “em permanência 24 horas por dia”.
Também o CDOS do Porto rejeitou não ter atendido o telefonema da NAV, referindo ter sido a Comando Nacional de Operações de Socorro que avisou do acidente, às 20:15, tendo de imediato acionado os bombeiros de Valongo.
A Proteção Civil também refere que o CDOS do Porto “foi alvo de seis tentativas de contacto telefónico, sendo que apenas uma delas foi abandonada antes do atendimento”.
O relatório preliminar acrescenta que, após o contacto de cidadãos, o Centro Operacional do Norte do 112 “não alertou o CDOS do Porto, dando preferência ao despacho de meios das forças de segurança, e não encetou diligências junto da ANPC para restringir a área de busca”.
A NAV disse que às 19:20 contactou telefonicamente várias entidades, entre as quais os bombeiros e a PSP de Valongo. Segundo o comandante distrital do Porto, os bombeiros locais foram avisados pelo CDOS do Porto e foram os primeiros a chegar ao local
A Proteção Civil distrital do Porto assegurou também não ter existido qualquer conflito entre bombeiros, tendo “funcionado perfeitamente a articulação” entre os vários níveis da Proteção Civil.
No entanto, o presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses pediu um “inquérito rigoroso”, referindo que os bombeiros de Valongo foram acionados pelas 20:35, mas só às 22:30 é que o CDOS do Porto pediu a sua viatura de comunicações e comando e que “o senhor CODIS [Comandante Operacional Distrital de Socorro] do Porto só chegou às 23:00 ao local das operações”, altura em que “a operação já ia a mais de 90%”.
Uma avaliação preliminar dos destroços do helicóptero do INEM indicou que a queda aconteceu na sequência da colisão com uma antena emissora existente na zona. Destroços que têm estado a ser retirados por populares o que, segundo o gabinete que investiga acidentes aéreos, “pode ter prejudicado a investigação”,
De acordo com o Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes com Aeronaves e Acidentes Ferroviários, as informações recolhidas indicam que a aeronave “não estava equipada com dispositivo de registo de dados de voo”, o que não era obrigatório, mas vai provocar “um maior grau de incerteza e de morosidade” na investigação do acidente.
A situação não foi ainda confirmada pela operadora do helicóptero do INEM, a Babcock Portugal, que sublinhou estar a trabalhar com as autoridades portuguesas “para determinar a causa do acidente”.
O Gabinete de Investigação prevê emitir até quinta-feira uma Nota Informativa de Acidente com Aeronave e informação sobre o processo da investigação de segurança a realizar.
O acidente aéreo, o mais grave ocorrido este ano em Portugal, já foi alvo de várias manifestações de pesar, como do primeiro-ministro e do Presidente da República.
A ministra da Saúde também lamentou a morte dos quatro profissionais e a Ordem dos Médicos e a Administração Regional do Norte expressaram reconhecimento e homenagem às vítimas, enquanto o hospital de Santa Maria e a Cruz Vermelha colocaram as suas bandeiras a meia haste por respeito.
Câmara de Valongo, Bloco de Esquerda, CDS e Federação de Bombeiros do Porto foram algumas das outras entidades que lamentaram publicamente o acidente.
Hoje de manhã, um novo helicóptero de emergência médica de Macedo de Cavaleiros retomou a atividade normal, substituindo a aeronave que caiu no sábado.