Artigo de opinião
Rui Maia

Licenciado em História, mestre em Património e Turismo Cultural pela Universidade do Minho – Investigador em Património Industrial.
O antigo Pavilhão Cirúrgico localiza-se no Lugar de Valverde, na Estrada de Santa Luzia, na freguesia de Santa Maria Maior (desde 2013 agregada com Monserrate e Meadela), em Viana do Castelo. O edifício é construído num local que, de per si, é pitoresco e ao mesmo tempo sacralizado, até porque de lá do cimo do Monte Santa Luzia apura-nos a visão para um dos mais belos panoramas do país e do mundo, onde o rio, o mar, a montanha e os campos se confundem com o Éden – esse que o Homem deseja fervorosamente alcançar – espelhado no mais belo jardim de Portugal, o Minho.
Não obstante, o Pavilhão Cirúrgico de Viana do Castelo é onde se realizam as primeiras cirurgias modernas na região, tendo o mesmo funcionado até meados dos anos 80 do século passado, altura em que é substituído pelo Hospital de Santa Luzia (1984, e que lhe é contiguo), perdendo as suas funções associadas à saúde.

Desde então, inicia-se um processo de decadência e, em 1991, por acordo com o então provedor da Santa Casa da Misericórdia de Viana do Castelo, Dr. Alberto de Oliveira e Silva, o espaço é cedido à Escola Profissional de Música de Viana do Castelo para ali se instalar.

Essa acabou por ser uma solução que lhe outorgou alguma dignidade e, ao mesmo tempo, estando ocupado com tão nobre missão, os olhares sobre o imóvel seriam certamente mais afiados e cautelosos, não fosse o Diabo tecê-las. Porém, a referida Escola não tardaria a mudar-se para um local mais acomodado, deixando para trás, mais uma vez, o famigerado Pavilhão Cirúrgico.
Todavia, em agosto de 2013, o então provedor da Santa Casa da Misericórdia de Viana do Castelo, Sr. José Vitorino Reis, em entrevista à RTP – Rádio Televisão Portuguesa, dava nota do seguinte:
“Temos um grande projeto programado para o local, que é belíssimo. Será um lar, um centro de dia e um centro para cuidados continuados para Alzheimer e outras doenças degenerativas. Ou seja, uma área essencial na nossa atuação e um projeto único a nível nacional”. Na época da referida entrevista o edifício já se encontrava abandonado há mais de trinta anos, não considerando a ocupação que a Escola Profissional de Música de Viana do Castelo lhe deu, caso contrário a ruína ter-se-ia precipitado mais precocemente.
O abandono, grosso modo, cria bicharada e atrai toda a imundice, razão pela qual em 2016 o Pavilhão Cirúrgico é alvo de um incêndio, pouco mais restando do que as suas fachadas bem aparelhadas e toda a alvenaria circundante que ainda lhe presta guarda, juntamente com a portada em ferro.

O estado decrépito transformou o edificado em coisa horrenda, cartão-de-visita inscrito na encosta do Monte de Santa Luzia, um dos locais mais procurados da cidade por forasteiros e turistas, de um esplendor arrebatador que, ao mesmo tempo, impregna as retinas com o mais vil que os espíritos possam imaginar, ali se mantendo semelhante aberração, qual Prédio Coutinho qual carapuça, é a sorte grande e a terminação.
Em 30 de novembro de 2018, numa Assembleia Geral Ordinária da Santa Casa da Misericórdia de Viana do Castelo, após abertura da discussão, interveio o Sr. José Vitorino Reis (antigo provedor da instituição, como mencionado), referindo ter apresentado, no seu mandato, um projeto, já com fundos, para o antigo Pavilhão Cirúrgico, mas que infelizmente foi deitado fora. Na verdade, o projeto que tinha desenhado para aquele espaço representa uma das premências da nossa sociedade, particularmente, o cuidar dos idosos, aqueles que deram corpo ao presente e esboçaram o porvir. Porém, em Portugal estamos habituados a esse binómio – carência/excesso. Não obstante, como se vai rezando no meio da plebe, não há fome que sempre dure, nem fartura que nunca acabe. Há uma coisa que temos como certa, a estranheza pela vontade dos homens que, em muitos casos, têm vontade de deixar andar. A falta de verbas pode ser até um dilema, mas mais dilema é saber que a sociedade quando quer agremiar verbas para ações menos nobres, as alcança com determinada veleidade.
Assim, aquilo que desejamos é que a Santa Casa da Misericórdia de Viana do Castelo trate de dar vida àquele espaço, e faça cumprir o desejo do seu antigo provedor, o excelentíssimo Sr. José Vitorino Reis, cujo plano para aquela extinta unidade de saúde é mais que louvável, é premente, mesmo premente, há doze anos já era tarde.
Se porventura estivéssemos na Idade Média, seria razão para exigir ao Rei mais almotacés, sobretudo atendendo ao prol comunal – ao bom regimento, o importante é o bem comum.
Os homens bons, empenhem-se no assunto, caso contrário o horror permanecerá ad aeternum.