As Nações Unidas (ONU) registaram cerca de 24.000 violações graves contra crianças em conflitos armados em 2021, sobrettudo homicídios, mutilações e recrutamentos, e frisaram que os dados recolhidos em 2022 mostram a continuidade dessa tendência.
Numa reunião do Conselho de Segurança da ONU para debater formas de prevenção face às graves violações contra crianças em zonas de conflito, a representante especial da ONU Virginia Gamba afirmou que “25 situações estão atualmente a ser monitorizadas” pelo seu gabinete, salientando que “nunca foi tão pertinente e urgente” abordar o assunto.
“Em 2021, último ano do meu relatório, a ONU verificou quase 24.000 violações graves cometidas contra crianças. As violações em maior número foram homicídios, mutilações e recrutamentos, seguidas da impedimento de acesso humanitário e sequestros. Enquanto preparamos o relatório para 2022, os dados recolhidos mostram que essas tendências (…) permanecem num nível chocante”, disse Virginia Gamba, representante especial do secretário-geral para Crianças e Conflitos Armados.
Violações sexuais e outras formas de violência e ataques a escolas e hospitais integram ainda a lista de atrocidades cometidas em maior número contra menores de idade.
Documentar e verificar violações e abusos têm sido os primeiros passos da ONU para compreender a situação das crianças no terreno.
No entanto, diante dos ciclos contínuos de violência e conflito cada vez mais intensos, frequentes e complexos, a representante especial da ONU apontou a necessidade de identificar riscos pré-existentes.
Crianças sem acesso a educação, em situações de pobreza e deslocamento, ou crianças com deficiência estão entre as mais vulneráveis a violações graves quando os conflitos emergem, de acordo com as Nações Unidas.
Essas crianças estão, portanto, mais expostas ao recrutamento por grupos armados e a outros riscos, como a violência sexual.
“Todas as pessoas com menos de 18 anos devem ser reconhecidas como crianças, pois as crianças têm direito a proteção especial sob a lei internacional de direitos humanos, particularmente sob a Convenção sobre os Direitos da Criança”, destacou Virginia Gamba.
Também a representante especial da ONU para a Violência contra Crianças, Najat Maalla M’jid, abordou a ampla gama de vulnerabilidades a que as crianças estão expostas, como residência em áreas pobres e remotas, privação de cuidados familiares, detenção ou retenção em instituições, pertença a minorias, deficiências, serem migrantes, refugiados, requerentes de asilo e apátridas, entre muitas outras.
“As crianças que não têm papel no conflito são as que mais sofrem com as suas consequências. Mas isso não é inevitável. (…) Apenas através do investimento em sistemas nacionais integrados de proteção à criança, podemos garantir medidas preventivas proativas eficazes”, disse.
Com foco em medidas preventivas concretas, Najat Maalla M’jid considerou fundamental compreender e identificar quem são essas crianças e onde vivem, acompanhar o número exato de crianças em situação de vulnerabilidade e desenhar sistemas de alerta rápido de emergência para crianças.
Considerou também crucial garantir o acesso fácil à ajuda humanitária e fortalecer a cooperação transfronteiriça para evitar o risco de sequestro, tráfico e desaparecimento de crianças em zonas de conflito.
“Isto significa: garantir uma gestão de fronteiras amiga da criança, intercâmbio rápido de informação e registo adequado, encaminhamento e acompanhamento de crianças desacompanhadas ou separadas e implementação de sistemas de dados transfronteiriços pré-desenvolvidos que possam ser reativados em situações de crise”, especificou.
“Essa cooperação permitirá uma melhor responsabilização dos perpetradores e traficantes através de recursos aprimorados para investigações criminais e assistência jurídica mútua”, acrescentou M’jid.
Vários diplomatas presentes na reunião apontaram a Ucrânia, o Afeganistão e a República Democrática do Congo como alguns dos países onde as crianças estão a vivenciar os horrores da guerra e do conflito, defendendo uma ação firme para proteger os menores de idade.