Armando Gonçalves e Andreia Lopes, de Real, concelho de Braga, sãos pais de Fabiana, uma jovem de 12 anos que padece de Tay Sachs (variante GM2-gangliosidosis), uma doença neuro-degenerativa que provoca a perda de competências motoras, como o andar, falar ou deglutir. É classificada como uma doença rara, existindo mais 15 casos conhecidos de crianças nesta situação em Portugal.
Fabiana nasceu perfeitamente normal. Aos quatro anos e meio, começou a sentir dificuldade no andar e a notar-se alguma gaguez na fala. Ao longo de seis anos depois dos primeiros sintomas, os pais consultaram especialistas, fizeram exames e despistagem, até que houve um diagnóstico final.
“O cérebro dela deixou de produzir uma enzima que limpa as células. Essas células vão acumulando, não regeneram e acabam por morrer”, simplifica a O MINHO a mãe de Fabiana. E assim foi diagnosticada com GM2, uma doença rara, sem terapias de tratamento autorizadas, limitada a cuidado paliativo e a uma hidratação e nutrição adequada.
No dia mundial da doença rara (29 de fevereiro), Andreia, Armando, Fabiana e a irmã Ariana deslocaram-se de Braga até Coimbra para assinalar o primeiro aniversário da constituição da DOCE, a primeira “associação nacional para divulgar, orientar, combater e enfrentar a Tay Sachs e outras gangliosidoses”.
Andreia explica que existem 15 famílias associadas em Portugal e, para além de buscar conforto e informação, todas têm, atualmente, um objetivo em comum para a associação: Ativar os cuidados paliativos para crianças com doenças raras.
“Vamos tentar negociar com o Estado a integração de uma rede de cuidados paliativos, porque não existe em Portugal. Se para adultos já é difícil, para as crianças ainda pior”, desabafa Andreia.
Enquanto esse objetivo não é levado avante, a associação dedica-se a realizar alguns encontros de pais “para falar com alguém que passa (ou passou)” pela mesma situação em relação aos filhos. “É um conforto onde podemos falar e retirar ideias”, acrescenta.
Na associação está ainda uma outra família do Minho, mais precisamente do concelho de Monção. A pequena Irís também padece da mesma categoria de doença. Samanta e Carlos, os pais, encontraram nesta associação ombros amigos para ajudar a perceber melhor o rumo da doença, diz Andreia.
“Aqui podemos conversar com alguém que nos percebe, porque por mais que se fale com amigos, familiares ou médicos, é difícil perceber o que estamos a passar”, diz. “É um apoio psicológico”, vinca.
Vogal na associação (Armando faz parte da Assembleia Geral), Andreia aponta que ainda estão a ser dados “os primeiros passos” nesta rede, mas alguns têm sido importantes para a qualidade de vida das famílias.
“Já organizamos cursos de cuidados paliativos e ajudamos famílias a deslocar-se à Alemanha em busca de formação”, explica, mas querem mais. “Estamos a tratar para que, no futuro, nos possam ajudar a 100% nos apoios a crianças com doenças raras, mas para já não temos um grande orçamento e ainda não é possível esse apoio financeiro”, expõe.
Um ano depois do lançamento da primeira pedra da associação, Andreia confidencia que “ainda não mudou grande coisa” da parte do Estado, sobretudo no que toca a escolas com capacidade para receber crianças nas unidades de multideficiência.
Falta de espaço nas escolas
A frequentar uma unidade do género na EB 2/3 de Real, Fabiana nem sempre tem as condições adequadas, sobretudo pela lotação do espaço. “A sala está com dez crianças e não deveria comportar tantas, o ideal seriam cinco por cada sala”, contrapõe.
Criada em 2016, através do orçamento participativo escolar, a Sala Snoezelen é, segundo a Câmara de Braga “um recurso pedagógico fundamental no desenvolvimento integral de todas as crianças e jovens, nomeadamente com multideficiência, deficiência mental, autismo, défice de atenção e hiperatividade, deficiência motora, deficiência visual e auditiva, problemas de comportamento, síndromes diversas e outras problemáticas”.
Andreia esteve “dois anos em casa” para cuidar de Fabiana a tempo inteiro. Depois começou a trabalhar em part-time, cinco horas por dia, para poder ajudar nos custos da família, e Fabiana ingressou nessa unidade de apoio escolar.
“As escolas estão sobrelotadas e quando têm unidade multideficiência, são muito procuradas, é muito difícil encontrar vagas, e quando encontramos, as salas estão lotadas”, argumenta.
Para além da EB 2/3 de Real, existem unidades em Gualtar (especializada em Autismo) e na Escola Secundária Alberto Sampaio.
Portadores de doença rara
Segundo dados da Direção-Geral da (DGS), desde 2014, 7.177 pessoas registaram-se como portadores de doença rara. Porém, em Portugal, existem cerca de 650 mil pessoas a padecer dessa condição.