Melhor português de sempre no ténis perdeu, mas foi ovacionado de pé

O ‘conquistador’ João Sousa colocou hoje um ponto final na era mais dourada do ténis nacional, na qual, à base de uma garra e profissionalismo impares, foi pioneiro em quase tudo e, durante anos, se bateu com lendas mundiais.

O melhor tenista português de sempre, encerrou hoje a carreira em singulares, ao perder na primeira ronda do Estoril Open com o francês Arthur Fils, em dois sets. Ainda irá jogar em pares nesta quarta-feira.

Há 32 anos, quando brincava com uma raqueta quase do tamanho dos seus três anos, enquanto o pai e tenista amador Armando Marinho de Sousa jogava no Clube de Ténis de Guimarães, era impossível prever a missão e os feitos históricos que estavam reservados ao então petiz João Sousa, o mais velho de dois irmãos.

O ténis passou a fazer parte regular da vida do vimaranense aos sete anos e o primeiro título surgiu com a vitória no Campeonato Nacional de sub-12, ao bater na final Gastão Elias. Desde então, os triunfos sucederam-se amiúde e a paixão pela modalidade levou-o a convencer o pai, juiz de profissão, e a mãe Adelaide a permitir a mudança, aos 15 anos, para a BTT Tennis Academy, em Barcelona.

Cumprindo a sua parte no compromisso com os pais, de não descurar os estudos na Catalunha, Sousa evoluiu igualmente enquanto tenista na escola espanhola, onde conheceu o também português Frederico Marques, que viria a tornar-se num dos grandes amigos e, mais tarde, seu treinador de sempre.

Depois de ter optado pelo ténis em detrimento do futebol, modalidade que chegou a praticar no Vitória SC até aos 14 anos, e de um curso de medicina, área em que ambicionava formar-se, ‘Joey’ tornou-se profissional das raquetas em 2007, seguindo o exemplo do seu ídolo de infância, o espanhol Juan Carlos Ferrero.

Em 17 anos, o poliglota português (além da língua materna, fala inglês, francês, castelhano, catalão e italiano) somou conquistas atrás de conquistas e escreveu história sem par no ténis nacional – um historial, que juntamente com as suas origens, lhe valeu o cognome de ‘conquistador’. 

A 15 de outubro de 2012, entrou pela primeira vez no ‘top 100’ do ranking ATP e por lá se manteve durante 403 semanas. Ininterruptamente, foram quase oito anos (339 semanas) entre os 100 melhores do mundo, algo jamais alcançado por um tenista português.

Conquistou quatro títulos ATP em 12 finais disputadas (Kuala Lumpur em 2013, Valência em 2015, Estoril Open em 2018 e Pune em 2022) -, o mais importante no Clube de Ténis do Estoril, onde se tornou no primeiro campeão português do torneio -, representou Portugal duas vezes nos Jogos Olímpicos (Rio2016 e Toquio2020), também algo inédito, teve 33 internacionalizações por Portugal na Taça Davis e atingiu o 28.º lugar no ‘ranking’ ATP, em maio de 2016.

Alicerçado no seu espírito de sacrifício, guerreiro e eloquente, marcou presença, durante anos a fio, em todos os Masters 1.000 e torneios do Grand Slam, tendo como melhor resultado os oitavos de final no Open dos Estados Unidos em 2018 e em Wimbledon em 2019, ano em que sofreu as primeiras contrariedades físicas graves.

Uma fissura no pé esquerdo obrigou-o a terminar precocemente essa temporada, antes da pandemia da covid-19 ter marcado mais um ano difícil para o vimaranense, que contraiu uma tendinite no braço direito no torneio de Antuérpia e que o levou a colocar, pelo segundo ano consecutivo, um ponto final na época antes do previsto.

O quarto título ATP na Índia em 2022, numa final disputada em três ‘sets’ com o finlandês Emil Ruusuvuori, ainda revigorou João Sousa, mas a esperança de voltar a exibir-se ao mais alto nível foi novamente contrariada por problemas físicos, nomeadamente nas costas.

Apesar do ‘calvário’ de lesões nos últimos anos, o sempre combativo – às vezes, até explosivo –, e educado Sousa jamais deixou de acreditar, nunca baixou os braços, nem a intensidade no trabalho dedicado para tentar ser o melhor dentro de um ‘court’ de ténis, onde chegou a defrontar os lendários Roger Federer, Rafael Nadal e Novak Djokovic, número um mundial, entre muitas outras estrelas do ténis mundial.

Aos 35 anos, encerrou hoje a carreira profissional em singulares ao mais alto nível, depois de se ter tornado num exemplo para várias gerações e ter aberto as portas aos jovens tenistas portugueses, que ao longo dos anos foi acolhendo enquanto timoneiro da seleção nacional da Taça Davis. O legado ímpar, esse, foi criado por quem sempre acreditou e lutou, o ‘conquistador’ João Sousa.

 
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