Marginalizado em Angola por ter falado em corrupção, associando-a a Isabel dos Santos

“Aconteceu-me em 2003 durante uma visita do primeiro-ministro Durão Barroso”

CRÓNICA DE LUÍS MOREIRA

Jornalista de O MINHO. De Braga.

Em outubro de 2003 fui, enquanto jornalista, a Angola, na comitiva do então primeiro-ministro, Durão Barroso. Ia com apoio do Diário do Minho – onde nunca trabalhei, apenas tendo colaborado muito esporadicamente, mas que teve a amabilidade de me apoiar – e do extinto jornal O Primeiro de Janeiro, que Deus tenha, porque já fechou.

Na primeira crónica que enviei referi-me a Isabel dos Santos, a empresária filha do ex-presidente angolano, José Eduardo dos Santos.

Disse que ela era vista como corrupta em muitos setores da sociedade angolana, e que – dizia-se – beneficiava do apoio político do pai, e consequente acesso ao dinheiro do Estado. Numa caixa ao lado, tive o cuidado de emitir opinião contrária, a de que, segundo outros setores, se tratava de uma mulher de grande iniciativa e qualidade, capaz de investir e criar riqueza. E que a acusação de corrupção era “uma calúnia”.

Sucede que, os editores de O Primeiro de Janeiro, por falta de espaço, cortaram esta caixa, a que defendia a reputação da empresária.

No dia seguinte, ambos os jornais receberam telefonemas, julgo que da Embaixada de Angola em Portugal, a perguntar quem eu era, e porque os representava. Telefonemas que me foram transmitidos e que indiciavam o que se seguiu: passei, logo, ao estatuto de renegado; o staff que acompanhava a comunicação social começou a virar-me a cara, com ar agressivo, e nem respondiam a qualquer coisa que perguntasse. Nessa noite, houve um jantar para os jornalistas oferecido pela Embaixada de Angola, com a presença do responsável em Portugal, e a hostilidade repetiu-se: ninguém falava para mim!

Regressei ao nosso país, ciente de que, se um dia quisesse voltar a Angola, onde já estive três vezes – uma delas na tropa em 1975 – o visto ser-me-ia recusado por caluniar a filha do Presidente.

E certo de que fiquei nos ficheiros da secreta angolana…

Embaixador não responde

Meses depois, o Embaixador veio a Braga, à Câmara, no tempo de Mesquita Machado. Fui lá enviado pela Agência Lusa para quem trabalhava. O procedimento antipático manteve-se: nem o assessor me falou, e o Embaixador – um tipo alto e anafado, cujo nome não recordo – recusou-se a responder-me.

O tema da corrupção incomodava os dirigentes angolanos, está bom de ver. Felizmente, o atual Presidente, João Lourenço, quer acabar com a máfia e governar para todos os angolanos!!!

Nessa viagem, tive direito a participar num jantar oferecido pelo primeiro-ministro angolano ao homólogo português, e onde estavam ministros, dirigentes vários e empresários dos dois lados… Na mesa que me calhou estava Rui Mingas, que fora ministro e também embaixador em Portugal. Antes fora atleta do Benfica… Mingas era crítico do regime do MPLA, partido a que pertencia, mas de que se afastara – dizia – devido ao fenómeno da corrupção. Na mesa estava ainda o embaixador de Moçambique em Angola, António Mathonse, irmão do pintor Elias Mathonse, ambos meus amigos, do peito.

A conversa fluiu e foi ter ao dito fenómeno… Disse o Mingas: “estão a ver aquela mesa ali. O general que lá está tem uma mansão na ilha de Luanda, uma na África do Sul, outra no Brasil, outra ainda na Flórida, casa em Lisboa e no Algarve e na Côte D’Azur, em França”. Que valem dezenas de milhões de dólares! E concluiu: “nesta sala, há vários outros com a mesma situação, à custa dos angolanos”.

Calei-me e nada escrevi, porque era confidencial!!!

 
Total
0
Partilhas
Artigos Relacionados
x