Ex-notária de Vieira do Minho acusada de ficar com 92 mil euros de clientes: “Esqueci-me de entregar o dinheiro às Finanças”

Está a ser julgada por 53 crimes
PSP no Tribunal de Braga. Foto: Joaquim Gomes / O MINHO (Arquivo)

Foi por desorganização do cartório e não para defraudar os clientes. Foi esta a explicação dada, anteontem, no Tribunal de Braga, por uma notária que exerceu funções em Vieira do Minho, Amares e Montalegre e que está a ser julgada no Tribunal de Braga por 34 crimes de peculato, 18 de falsificação de documento agravado e um de furto. A acusação diz que se apropriou, ao todo, de 92.475 euros que lhes foram entregues pelos clientes para pagamento ao fisco.

Suzana S., que exerceu funções entre 2008 e 2018, terá enganado 52 clientes, sendo que 34 dentre eles pedem 81.733 euros de indemnização.

Ao coletivo de juízes, e num depoimento que durou duas sessões, a arguida atribuiu a não entrega do dinheiro que os clientes lhe entregavam para pagar ao fisco, no caso de uma escritura, de uma partilha ou doação de bens, com o excesso de trabalho que a assoberbava, nomeadamente, no verão, onde se faziam mais de dez escrituras por dia.

“Esqueci-me de entregar o dinheiro às Finanças mas não o fiz propositadamente para ficar com ele”, assegurou.

O Tribunal ouviu, também, uma antiga técnica do Cartório de Vieira do Minho, que negou que nele houvesse uma “desorganização caótica”, embora dizendo que, por vezes, a notária lhe ligava – a ela e a uma colega – a dizer que se tinha esquecido de levar uma dada guia de pagamento de imposto, e que, amiúde, pagava a contribuição de valor mais alto, correspondente a um ato notarial, esquecendo-se da que era mais baixa.

A acusação refere que, nos termos legais, a notária assegurava perante os seus clientes, a “possibilidade de entregar os impostos necessários à realização das escrituras à Autoridade Tributária, quando o valor dos mesmos lhe fosse entregue”.

Sucede que – acrescenta – e “aproveitando-se do cargo em que estava investida, a notária, seguramente antes de 2012, formulou o designío, de se apropriar, no seu interesse e em seu próprio benefício, de património pertença de vários que se dirigiram aos cartórios notariais onde exercia funções”.

Ficou com dinheiro de impostos

Apropriou-se em particular de “dinheiros que lhe eram entregues para pagamentos dos registos e dos impostos dos atos pedidos pelos clientes, apondo informação falsa nas escrituras que celebrava e forjando faturas, se necessário fosse, para o conseguir”.

O inquérito criminal, que esteve a cargo da PJ de Braga, teve início quando os clientes da notária começaram a receber notificações das Finanças para pagarem os impostos em falta. Houve então como que uma ‘chuva’ de queixas-crime, cerca de 100, a entrar no DIAP de Braga, mas algumas delas caíram, ou porque a notária resolveu o problema ou por falta de provas.

A arguida – salienta o MP – violou, assim, “os deveres de atuar com lealdade e integridade para com os seus clientes. de cumprir as leis e de desempenhar as suas funções na perspetiva de prossecução do interesse público”.

Para além dos crimes de peculato e de falsificação Suzana S. terá cometido um de furto, já que, sem autorização da vítima, uma solicitadora de Amares foi ao seu escritório – de que tinha a chave- e retirou três dossiers de processos de clientes, dois deles contendo 550 euros em numerário

20 mil euros na conta pessoal

Em outubro de 2016, um casal de Vieira do Minho foi ao Cartório Notarial local para celebrar escritura de compra de um terreno agrícola em Gondiães, Cabeceiras de Basto.

O negócio não se pôde concretizar naquele dia, mas, mesmo assim, e por confiar na notária, o casal entregou-lhe um cheque de 20 mil euros, como fiel depositária.

Sucede que o cheque foi parar à conta bancária da arguida.

Dias depois, o casal mudou de ideias, desistiu da compra, e pediu, sem êxito, a devolução do dinheiro. O que só veio a suceder depois de ter conhecimento de que tinham apresentado queixa-crime em Braga.

Montante de 500 mil euros não se confirmou

Inicialmente, as queixas apontavam para crimes de peculato que atingiriam o montante de 500 mil euros. O que a investigação policial não confirmou.

O Ministério Público arrolou 69 testemunhas de acusação, a maioria vítimas, mas também o Inspetor do Instituto dos Registos e Notariado Fernando Oliveira.

 
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