Entre estreantes, recém-regressadas após a pandemia e participantes regulares, as empresas portuguesas presentes na feira internacional de calçado MICAM, em Milão, assumem um otimismo moderado para este ano, prevendo uma estabilização ou um crescimento ligeiro das vendas.
A empresa Cruz de Pedra, de Guimarães, fala numa manutenção do nível de vendas em 2023 e propõe-se “manter ou crescer” ligeiramente este ano, com o CEO, José Afonso Pontes, a falar de “uma crise profunda de falta de encomendas” no setor, devido à quebra no consumo resultante da subida dos juros.
Com 65 anos de atividade e apresentando-se, provavelmente, como “a empresa mais antiga de Guimarães” nas mãos da mesma família – atualmente é gerida pela terceira geração -, a Cruz de Pedra obtém 70% da faturação através da produção para ‘private label’, respondendo a marca própria Campobello pelos restantes 30%.
Segundo José Afonso Pontes, a nova aposta feita no ano passado no calçado de senhora, já que até então a empresa produzia apenas calçado masculino, deu uma contribuição decisiva para que a faturação não caísse. A expectativa é que “as coisas melhorem” em 2024 e o consumo vá recuperando, à boleia de uma progressiva redução das taxas de juro.
Com vendas para toda a Europa e os EUA agora no radar, a Cruz de Pedra prevê ainda concluir este ano o investimento de 400 mil euros iniciado em 2023 na automação e modernização das linhas de montagem da empresa.
Comforsyst aumenta vendas
“Se possível, queríamos crescer cinco a 10%, mas se mantivermos [as vendas do ano passado] já não é mau”, afirma Orlando Santos, diretor executivo da Comforsyst, de S. João da Madeira, que, em contraciclo com a quebra de 8,2% para 1.839 milhões de euros das exportações portuguesas de calçado em 2023, aumentou as vendas em 22% para 9,5 milhões de euros no ano passado.
Com 88 trabalhadores e desde 2000 apenas dedicada à marca própria Softwaves, a empresa está pela segunda vez presente na MICAM desde a pandemia, período em que optou por interromper a participação de há “muitos anos” naquela que é considerada a maior feira de calçado do mundo.
Orlando Santos – que, com os irmãos mais velho, Marcelo, e mais novo, Hélder, assegura a segunda geração da empresa, comprada pelo pai em 1990 – diz ser notória uma retração no consumo, nomeadamente nos três grandes mercados da empresa (França, Bélgica e EUA), mas ainda assim propõe-se, “no mínimo, manter” as vendas face ao ano passado.
A venda direta nas cerca de 1.500 lojas em que a marca está presente, sem intervenção de distribuidores, e o foco apontado aos três maiores mercados são, segundo o presidente executivo (CEO) da Comforsyst, o segredo do sucesso da empresa, especializada em calçado de senhora.
“Preferimos ter poucos, mas bons, mercados e conseguir dar visibilidade à marca. Não temos milhões para gastar em publicidade e seria muito difícil ser sustentável no futuro se o fizéssemos”, afirmou.
Orlando Santos justifica o recente regresso à MICAM “porque a feira voltou a dar alguns sinais” de dinamismo e assume como grande aposta da empresa “criar um conceito de marca de qualidade” em mercados “que valorizam” o calçado Softwaves, cujo preço médio de venda ronda os 100 euros à saída da fábrica e sobe até aos 250 a 300 euros em loja.
Após ter optado por abandonar totalmente o fabrico para terceiros a partir do momento em que criou a sua própria insígnia, por considerar que fazê-lo seria “prostituir a marca”, a empresa de S. João da Madeira tem agora como objetivo começar “a desenvolver o difícil mercado asiático”.
A estrear-se nesta edição da MICAM está a A. Hernâni, de Oliveira de Azeméis, que – também em contraciclo – no ano passado aumentou as vendas em 25%, para dois milhões de euros, e “até teve de subcontratar” para responder às encomendas, impulsionada por “projetos estáveis” de calçado de uniforme.
Este ano, contudo, a responsável comercial da empresa diz que “as expectativas são mais moderadas”: “Se conseguirmos manter [a faturação] já é muito bom”, afirma Lígia Silva, apontando uma grande retração do consumo na Europa, nomeadamente em França, que tem motivado uma quebra nas encomendas.
A produção em regime de ‘private label’ assegura atualmente 80% da produção da empresa, mas o objetivo é que a crescente aposta na marca própria Nano Shoes faça o peso da produção para outras marcas recuar para os 50% dentro de cinco anos.
A estreia na MICAM visa, precisamente, dinamizar o crescimento da marca própria em novos mercados de maior valor acrescentado, que “valorizem e possam pagar” o calçado da Nano Shoes, cujo preço final supera os 100 euros o par.