Artigo de Vânia Mesquita Machado
Pediatra e escritora. Autora do livro Microcosmos Humano. Mãe de 3. De Braga.
Insólita provocação descontextualizada.
Discussão sobre política, desporto e religião são consensualmente provocatórios num almoço que requer diplomacia. Diz o bom senso.
Quando não há senso algum, a política enxovalha a religião. O caldo foi literalmente entornado. Uma sopa a ferver, com palavras de escárnio e maldizer que remontam a Gil Vicente, e por falar em idade medieval, se é verdade que a Inquisição foi um período de absolutismo religioso abominável, também o é a colisão em choque frontal com as convicções religiosas sejam elas quais forem.
Não existem palavras suficientemente fortes para exprimir a indignação perante o humor negro (negro não, porque não sou racista), perdão, o humor inexistente num cartaz que utiliza a imagem de Jesus Cristo e lhe acrescenta a frase de um ceticismo nauseabundo, “Jesus Cristo também tinha dois pais“.
Mas que brincadeira ignóbil e absurda é esta?
Sou crente, mas a favor do ecumenismo, e da liberdade individual. Sou acérrima defensora dos direitos humanos e da igualdade. O que penso sobre a adoção por casais homossexuais não partilho nesta crónica, mas nem está em questão. Sou contra a homofobia. Tenho amigos homossexuais, uma das minhas melhores amigas é lésbica.
A liberdade de expressão tem como cut-off o overlaping com a liberdade do outro.
Intriga-me que um partido a favor da liberdade, ataque deliberadamente e sem subtileza uma religião, seja ela qual for.
Já escrevi sobre os direitos dos palestinianos. Sobre o horror do holocausto. Não me parece minimamente comparável este cartaz nojento que circula “nas redes sociais” como afirmou para se desculpabilizar uma bloquista num noticiário, em jeito de que nem seria muito visível (atualmente as pessoas olham mais para os smartphones que para os outdoors), e ainda acrescentou que o cartaz já circulava noutros países e era da autoria do Movimento Pró-Igualdade,com o humor datírico do Charlie Hebdo. Treta. Entornaram o caldo com azeite a ferver, em plena quaresma.
Os bloquistas com sensatez já vieram a público demarcar-se desta corrosiva agressão à liberdade religiosa.
A queimadura de terceiro grau, em quem é cristão, é difícil de curar com os desmentidos e as demarcações dos notáveis do Bloco de Esquerda.
Se eu senti de tal forma, que ultrapassou o limiar da dor (típico de queimaduras graves, que deixam a pele encortiçada e não saram com gaze gorda, só com desbridamento), como sentirão os crentes mais dogmáticos…
Estou-me nas tintas para o número de pais. Conheço crianças que têm mais de dois pais e mães de coração, o que importa é a afetividade. Misturar a homossexualidade com a religião parece-me, e agora propositadamente a analogia, a última ceia de um partido que singrava em ascensão. Mas ao contrário da Ressurreição, seguir-se-à o velório…
Fique a par dos Artigos de Vânia Mesquita Machado. Siga O MINHO no Facebook. Clique aqui