Em entrevista a o O MINHO, o autarca de Braga, Ricardo Rio diz que a candidatura a Capital Europeia da Cultura 2027 tem caráter euro-regional e estranha a ausência do Arcebispo no seu Conselho Estratégico. O Município de Braga apresenta publicamente, sexta-feira, o dossier da candidatura a Capital Europeia da Cultura 2027. Uma oportunidade que levou O MINHO a questionar o presidente da Câmara, Ricardo Rio sobre o setor da Cultura. Onde serão investidos oito milhões de euros em 2022, 1,5 dos quais na CEC. Rio diz que espera que o novo Arcebispo responda positivamente ao convite endereçado ao atual, D. Jorge Ortiga – e que ainda não teve resposta – para integrar o Conselho Estratégico da CEC 2027.
No novo mandato autárquico, o presidente decidiu assumir o pelouro da Cultura. Trata-se de uma crítica implícita ao desempenho da anterior vereadora?
Não, de todo. A área da Cultura deu um enorme salto qualitativo no concelho ao longo dos últimos anos e a Vereadora teve naturalmente um contributo importante para essa evolução.
Houve fundamentalmente duas motivações para esta opção: a relevância da aposta estratégica neste setor em função da nossa candidatura a Capital Europeia da Cultura em 2027 e a necessidade de conferir maior coerência a diferentes Pelouros, o que justificou a agregação da Cultura, do Património e do Turismo.
Mas também havia quem reclamasse outro arrojo e criticasse a falta de resposta da vereadora Lídia Dias…
Muitas vezes a “falta de resposta” está associada ao facto de a resposta não ser aquela que se pretende. A Câmara Municipal recebe diariamente inúmeros desafios e projetos (também de natureza cultural), sendo impossível aceder a todos eles.
Basta olhar para o que é a realidade do setor da Cultura hoje e o que era há oito anos para perceber as enormes diferenças existentes, na diversidade e qualificação da oferta cultural, na colaboração e apoio com os diferentes agentes culturais, na política de descentralização cultural, na formação de públicos e no trabalho junto da comunidade educativa…É uma diferença abissal com reflexos claros do ponto de vista orçamental, da visibilidade externa e do reconhecimento dos bracarenses.
Oito milhões em Cultura
Quanto pesa o setor da Cultura no Orçamento da Câmara?
Se olharmos para o Orçamento de 2022, são mais de oito milhões de euros investidos nesta área, ao nível do apoio a atividades culturais (como o São João, a Semana Santa, o Semi-Breve, os Encontros de Imagem, o Braga Blues, etc.); do Contrato-Programa com o Theatro Circo; da promoção de diversos eventos (Noite Branca, Braga Romana, Braga é Natal, Braga em Risco, entre tantos outros); dos contratos de dinamização cultural e diversas outras iniciativas.
Acresce a este montante quase 1 milhão de euros de obras delegadas pelo Ministério da Cultura em equipamentos culturais nacionais no âmbito do PRR e um investimento de mais de 2,5 milhões de euros em equipamentos e património cultural municipal cujas obras vão avançar em 2022 (Convento de S. Francisco, Francisco Sanches, Media Arts Center no S. Geraldo, Casa dos Crivos, Museu da Imagem, …).
Um Orçamento reforçado em função da candidatura à CEC?
A nossa candidatura tem impactos mais imediatos e efeitos mais duradouros. Desde já, há todo um trabalho de preparação e acompanhamento da candidatura que tem vindo a aumentar o valor transferido para o Theatro Circo – enquanto entidade coordenadora do projeto – e a justificar diversas contratações externas que com ela estão relacionadas.
Há, por outro lado, a inserção no orçamento da Câmara de verbas que dão corpo a cada um dos vetores da nossa Estratégia Cultural 2030, cuja concretização terá lugar independentemente do resultado da candidatura.
Entre uma e outra vertente, o valor “alusivo” à CEC ultrapassará os 1,5 milhões de euros em 2022.
Candidatura euro-regional
Braga pode estar otimista em relação a esta candidatura? Ou poderá ser penalizada por Guimarães ter sido a última Capital da Cultura em território nacional?
A circunstância de Guimarães é incontornável, mas não é algo que nos deva preocupar excessivamente. Os critérios de avaliação do júri são claros e a questão territorial nessa perspetiva não está presente em nenhum deles. Pelo contrário, um dos elementos de força da nossa candidatura é a sua representatividade Euro-regional, bem patente nos apoios do Presidente da Câmara do Porto e do Presidente da Xunta da Galiza, bem como em diversos de projetos de colaboração neste território e a nível internacional.
Braga tem feito um trabalho notável, de elevado profissionalismo e de grande envolvimento de toda a Comunidade. Assim aconteceu na elaboração da nossa Estratégia e o mesmo sucedeu na preparação da candidatura e do programa artístico inerente.
Estou em crer que os contributos dos cidadãos, dos agentes culturais, de diversas instituições e dos membros dos nossos Conselhos Estratégicos foram fundamentais para o enriquecimento do dossiê e que Braga submeteu uma candidatura muito forte que teremos o gosto de apresentar publicamente na próxima sexta-feira.
Julgo que respondemos de forma muito criteriosa, mas também bastante arrojada, a cada um dos requisitos e espero que possamos passar à fase final da seleção.
Igreja ausente da CEC.
Um envolvimento que o Arcebispo de Braga diz não ter existido em relação à Igreja…
Confesso que li com alguma surpresa essas declarações. Dando continuidade ao trabalho de colaboração que sempre existiu, as principais instituições religiosas foram chamadas a participar e dar o seu contributo, o que aconteceu.
O D. Jorge Ortiga foi convidado pessoalmente, em tempo, a integrar o nosso Conselho Estratégico. Declinou porque me transmitiu que só poderia aceitar tal convite se fosse por inerência do cargo que exerce.
Mais recentemente, um convite idêntico foi dirigido ao Arcebispo de Braga, nessa qualidade, que continua sem resposta. Espero que venha a ser aceite pelo seu sucessor, porque era sinal que Braga continuava no processo de seleção.
Mas é possível fazer de Braga Capital Europeia da Cultura 2027 sem a presença da Arquidiocese”?
Seguramente que não. Ou pelo menos não estaríamos a valorizar muitos dos recursos distintivos do nosso território, onde a nossa História, o nosso património material e imaterial, muito dele de cariz religioso, representam uma enorme mais-valia, para fins culturais, económicos e até identitários. Braga é uma cidade com alma!
Mas respondendo diretamente à sua questão, deixe-me também perguntar: como é que se percebe que a classificação como Património Imaterial das Solenidades da Semana Santa de Braga esteja hoje em risco em função de um parecer emitido pela própria Arquidiocese, ao arrepio do que foi discutido aprofundadamente na Comissão organizadora?
E qual tem sido a posição do Arcebispo em relação à atitude de boicote que estão a consumar à representação da Igreja de Braga na Fundação Bracara Augusta, onde estão representadas as principais entidades culturais da cidade (a Câmara, as Universidades e o Cabido da Sé)?
Com a Universidade do Minho a relação tem sido bem mais pacífica…
Isso pressupõe que com a Igreja não o tem sido, o que não é de todo verdade! Mas em relação às Universidades e, de forma especial, em relação à Universidade do Minho, têm sido múltiplos os projetos conjuntos, quer de dinamização cultural, quer de valorização patrimonial (como o Convento de S. Francisco, a Ínsula das Carvalheiras, o edifício da Rua Santo António das Travessas, entre outros).
A aposta na salvaguarda do património será uma das grandes prioridades para este mandato?
O património deve ser valorizado, divulgado e fruído. Tem sido essa a nossa política. E há vários espaços que vão merecer uma intervenção de qualificação de que resultarão enormes benefícios para os bracarenses.
O projeto do Convento de S. Francisco, cuja obra vai ter já início, será uma grande mais-valia para a Unidade de Arqueologia da Universidade do Minho, mas também para a Freguesia de Real e para o concelho no seu todo.
A intervenção na Ínsula das Carvalheiras será absolutamente extraordinária, criando um parque de lazer no coração da cidade, junto a um ícone patrimonial da nossa cidade.
Mas poderíamos falar das Sete Fontes, da Santa Marta das Cortiças, do Estádio 1º de Maio…
Todos eles projetos há muito ansiados pelos bracarenses mas que tardam em sair do papel. Quando poderão vir à luz do dia?
Cada um deles tem especificidades próprias e etapas que foi necessário cumprir para salvaguardar a defesa do interesse público. A minha garantia é que todos constam do nosso programa de governo para este mandato e todos serão concretizados neste horizonte temporal.
Referiu os grandes eventos. Será em 2022 que voltaremos a contar com as grandes iniciativas de massas no concelho?
Braga não é uma ilha e o que acontece aqui está obviamente condicionado pela evolução da pandemia à nossa volta. Mas é minha convicção que este será o ano do regresso dos principais eventos que marcam a agenda concelhia, sejam eles culturais, desportivos, sociais ou de outra natureza. Sobretudo a partir da segunda metade do ano.
É para isso que estamos a trabalhar e a mobilizar todos os nossos parceiros.