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Tomás já tem nove anos, mas nunca foi à escola. Pela primeira este ano letivo, as suas condições de saúde melhoraram e finalmente iria frequentar a escola primária de Carvalhal, em Barcelos. Só que, apesar de as aulas já terem iniciado, ainda não foram criadas as condições para que esta criança com 100% de incapacidade e elevado grau de dependência pudesse aprender junto dos colegas.
Esta situação está a preocupar os pais de Tomás Faria, que reclamam uma escola “inclusiva”. O agrupamento diz que está a articular com diversas entidades para que a criança possa frequentar a escola, enquanto o Câmara de Barcelos refere que “as questões logísticas e operacionais” que são da sua competência “foram asseguradas, atempadamente, no início do ano letivo”.
Filipa Faria é mãe e cuidadora a tempo inteiro há nove anos, desde o nascimento do seu filho, que foi diagnosticado com epilepsia e distenia, originadas por um problema genético. Apesar de já ter matriculado o Tomás há quatro anos na escola de Carvalhal, ele nunca frequentou de forma presencial, essencialmente devido ao seu estado de saúde “débil”. Este ano, chegou a hora de ir para a sala de aula, já que a sua condição de saúde melhorou, e foi tomada essa decisão com suporte clínico.
“Encostaram-me à parede para eu ir ver outra escola”
Em maio, a mãe informou o agrupamento que, em setembro, o Tomás ia ingressar no 4.º ano.
Mas, não tem sido um processo simples. No início, diz a mãe, o agrupamento tentou-a “demover de colocar o Tomás na escola”. “Queriam que ele continuasse em casa ou então que fosse para outra escola (…) Vinham aqui a casa falar, encostaram-me à parede para eu ir ver outra escola, que é muito mais longe da minha casa”, conta a mãe, que reside na freguesia de Gilmonde.
Foi, por isso, um processo que se arrastou desde maio até final de julho sem que nada tivesse sido preparado para receber o Tomás na escola, de acordo com Filipa Faria.
Falta sala de apoio
“O que têm feito é o arrastar desta situação e não criaram as condições físicas necessárias, no início do ano letivo ainda não havia ninguém preparado para tomar conta dele, porque as pessoas precisam do mínimo de formação”, relata a O MINHO.
A associação de pais daquela escola esclarece que nos últimos, já foi aberta “uma porta para a criança entrar, uma rampa”, houve “troca de salas” e as funcionárias fizeram formação. Falta ainda uma sala de apoio que o Tomás possa fazer as suas terapias, higiene, entre outras necessidades específicas.
Agrupamento não se compromete com prazo
Questionado por O MINHO, o agrupamento não adiantou um prazo para que este processo seja concluído, nem esclareceu o que foi feito e o que está em falta. “Naturalmente, as ações concretas desenvolvidas para o aluno encontram-se abrangidas pelo Regime de Proteção de Dados e pelo sigilo profissional”, notou Maria Paula Abreu, diretora do Agrupamento de Escolas Rosa Ramalho.
Contudo, frisou que o Agrupamento de Escolas Rosa Ramalho “tem por objetivo responder à diversidade das necessidades e potencialidades de todos e de cada uma das crianças e dos alunos, tendo como princípio orientador a Inclusão, isto é, o garantir o acesso e participação aos mesmos contextos educativos”.
Filipa Faria, mãe da criança, diz que há “falta de vontade” do agrupamento. “A lei diz que as crianças deviam ser integradas na escola e que a escola é inclusiva. De inclusiva não tem nada”, lamenta.
E acrescenta: “Estão a tirar-lhe uma oportunidade a ele. Nunca lhe dei a oportunidade de conhecer outra realidade e isso é importante para ele. Porque é uma criança, tem nove anos, é normal que as crianças estejam em grupo homogéneos com idades parecidas. E ele é um menino que gosta de estar com pessoas, que reage bem ao toque. Achamos por bem aproveitar esta oportunidade, porque se a sociedade já nos fecha portas em tantas situações, achamos que na escola ia ser fácil e saudável para ele. Depois, quando começamos este processo, foi tudo ao contrário”.
Município tem “disponibilidade para colaborar na integração da criança”
Já a Câmara de Barcelos refere que esta situação “extravasa as competências legais” do Município, contudo garante colaboração. “Relativamente às questões logísticas e operacionais que são da competência do Município, as mesmas foram asseguradas, atempadamente, no início do ano letivo, sendo que a Câmara Municipal já manifestou à entidade competente disponibilidade para colaborar na integração da criança no contexto escolar”, frisa a Câmara, em resposta às questões enviadas ao nosso jornal.
Na quinta-feira, o Município teve uma reunião sobre este caso com as entidades competentes e “voltou a reiterar a sua disponibilidade para colaborar noutras soluções que as entidades venham a adotar”.
E garante: “A autarquia não tem conhecimento de casos similares no concelho, em que alunos não estejam a frequentar a escola por falta de condições logísticas”.
Quase dois meses depois do início do ano letivo, a família do Tomás continua a desesperar pela sua integração na escola. E a mãe “não pedia muito, só três horas por dia e três dias por semana”, para que assim também tivesse tempo para si própria, que começou a faltar quando se tornou cuidadora 24 horas por dia há mais de nove anos.
Porém, são “muitos os obstáculos” e “tem sido um caminho muito difícil”. “Todos os dias tenho vontade de desistir”, lamenta.