Artigo de Vânia Mesquita Machado
Pediatra e escritora. Autora do livro Microcosmos Humanos. Mãe de 3. De Braga.
Infelizmente o alegado mais do que alegado.
Não me refiro, claro, à situação noticiada há dias, referindo um suspeito, detido em Braga pela PJ, cujo computador continha “dezenas de ficheiros com vídeos e fotografias de cariz sexual envolvendo jovens “, e do qual desconheço a identidade ou se é culpado ou não de algum crime.
Refiro-me à gravidade de uma situação real, que não é alegada, fantasiosa nem excecional, mas sim uma prática entre os nossos adolescentes.
Para quem não sabe do que falo, passo a explicar:
Caros pais, não julguem que estão livres de um flagelo destes nos vossos lares , em que os vossos filhos já frequentam os liceus, sejam escolas públicas ou privadas.
Não tapem o sol com a peneira, nem insuflem o peito de orgulho porque os vossos adolescentes são bem comportados, não bebem, não fumam, nem trocam “nudes” entre si.
Sendo mais incisiva no que afirmo, mesmo sendo a vossa família um exemplo em termos de diálogo com os filhos, onde não existem tabus, onde o divórcio, o desemprego e a emigração são ainda palavras desconhecidas, onde a alimentação é saudável e felizmente não há o azar da doença a parasitar a felicidade, o estado de alerta parental é um dever inalienável que vos assiste.
À distância de um clique, a imagem da adolescente nua em selfie ao espelho (“nude”),é enviada na rede, seja por snapchat ou outra app.
À distância de um clique, os adolescentes têm conversas que exigiriam bolinha vermelha no canto do écran, em grupos de chat no whatsapp, messenger ou telegram, sendo muitas mensagens encriptadas, apagadas pelos próprios, ou auto-destruídas após uns minutos.
Inerente à adolescência está a curiosidade pelo proibido, a adrenalina por desafiar os adultos, a influência dos pares.
Todos os comportamentos de risco que são característicos do grupo etário.
Fumarem e beberem às escondidas e namoriscarem, há anos que assim é.
Era assim no nosso tempo, e a educação de base e os valores incutidos serviam de guia para que na hora H a maioria dos adolescentes bem-formados não cometesse erros porque lhes tinha sido inculcado a noção dos limites.
Atualmente, para além da sempre culpada crise económica e da desestruturação familiar ser um lugar-comum, as redes sociais permitem atos irrefletidos em idades em que a impulsividade é fisiológica.
À distância de um clique, uma adolescente apaixonada envia um “nude”a um rapaz, e em minutos em que o juízo de valores é ignorado conscientemente, a fotografia do seu corpo nu chegou ao destino, sendo depois rapidamente partilhada e colocada a circular em rede, ou servindo de chamariz para o dito adolescente se encontrar com ela e ter relações sexuais.
Chamemos os burros pelos nomes.
Os riscos são reais, e vão muito para além da partilha de ficheiros para redes de pedofilia internacional, assunto que também não pode ser subestimado.
Ligar o botão de pânico não é exagero.
O diálogo é e sempre foi em qualquer assunto que envolva seres humanos, um ponto a favor para que os nossos adolescentes escapem ilesos das tentações de pisar o risco, com consequências gravíssimas ( não só redes de pedofilia, mas bullying, gravidez ou doenças venéreas).
Mas falar sobre este assunto em sociedade e estar atento é fundamental.
A nossa realidade social é demasiado complexa.
Vamos abrir os olhos, em vez de enfiar a cabeça na areia como a avestruz, deixar andar porque o cansaço do fim do dia não convida a assuntos desagradáveis em casa, ou confiar porque “o meu/minha filha” nunca fariam tal coisa…
… Não estejam assim tão certos disso…
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