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ARTIGO DE OPINIÃO
Por Rui Maia
Licenciado em História, mestre em Património e Turismo Cultural pela
Universidade do Minho – Investigador em Património Industrial.
As últimas eleições legislativas demonstram de forma inequívoca a falência dos partidos políticos que têm desgovernado Portugal nos últimos 50 anos.
Trata-se, se quisermos, de um ajuste de contas que o povo pôde levar a efeito num dos poucos instrumentos democráticos ao seu dispor, senão mesmo o único – o voto.
Não podemos esquecer que o bipartidarismo deste meio século, protagonizado pelo Partido Socialista e pelo Partido Social Democrata, à mistura com algumas muletas e andarilhos, conduziu o país para uma situação desastrosa e preocupante, na medida em que, 50 anos, é tempo mais que suficiente para que se tenham sanado os problemas do país e implementado as reformas necessárias para a tão auspiciada transformação social, económica e territorial.
A Evolução Demográfica
Não obstante, um dado naturalmente preocupante, tem que ver com a evolução da população portuguesa que, grosso modo, tende a decrescer e envelhecer de acordo com as projeções de algumas organizações internacionais. Embora possa não parecer, há todo um conjunto de políticas dos últimos 50 anos que têm subsidiado essa catástrofe, em particular, a falta de incentivos claros e suficientes que promovam a natalidade, urgindo a criação de todo um ecossistema que rume nessa direção – desde a alteração das políticas laborais passando por muitas outras.
A Desindustrialização
Outro dado preocupante, tem que ver com a desindustrialização do país, bem como com a própria debilidade do setor industrial face aos restantes países da União Europeia, problemas esses aos quais podemos agremiar uma política assente em baixos salários.
Essas premissas são validadas até pela forma como a classe política se refere ao turismo “indústria” – um dos principais motores da nossa economia – que, todavia, está à mercê das variações da economia global e da segurança política que não podemos controlar. Para que se tenha uma ideia, em 2024, as receitas provenientes do turismo representaram 12,7 % do PIB – Produto Interno Bruto, em termos gerais.
A Loucura da Habitação
Outro aspeto particularmente preocupante, tem que ver com a idade cada vez mais tardia com que os jovens saem da casa dos pais para constituírem família. A esse respeito, é importante evocar os preços exorbitante da habitação, em que, nos últimos anos, as casas em segunda mão se tornaram caríssimas, e os preços das casas novas são manifestamente megalómanos e inalcançáveis, sobretudo para quem vive de parcos rendimentos do trabalho (a esmagadora maioria da população). Por outro lado, como é referido pelo INE – Instituto Nacional de Estatística, “a pressão construtiva no continente evidenciou fortes assimetrias regionais, com maior intensidade nas zonas litorais e metropolitanas, mas também em regiões como o Cávado, contrastando com uma menor expressão no interior e em áreas menos densas”. Além disso, num estudo iniciado pelo INE em 2019, é referido que em 2023 menos residentes em Portugal compraram casa, e que a concessão de crédito à habitação a estrangeiros representou 11% desse total.
Por outro lado, no que ao mercado de arrendamento diz respeito, e de acordo com dados do INE, os problemas são crescentes para os portugueses, na medida em que o preço das rendas subiu exponencialmente, nomeadamente nos grandes centros urbanos do país, como Lisboa e Porto, onde se concentram cerca de 50% dos novos contratos.
Além disso, de acordo com dados da PORDATA, em 2024, Portugal contabilizava mais de 2.1 milhões de pobres, sendo que foi no grupo de crianças e jovens que a taxa de risco de pobreza mais se agravou.
A Saúde
O portal da transparência do Serviço Nacional de Saúde, dá conta de que em agosto de 2019, 644.077 pessoas não tinham médico de família atribuído, número esse que tem aumentado, e que em março deste ano ultrapassou a barreira de 1.5 milhões de pessoas.
Além disso, tem-se verificado o encerramento constante de urgências hospitalares (particularmente serviços de ginecologia e obstetrícia). Outros problemas há, como no INEM – Instituto Nacional de Emergência Médica, que indicia falhas gravíssimas, e que tem resultado na falta de socorro, ou num socorro extemporâneo, traduzindo-se no aumento de mortes, muitas delas evitáveis.
As Escolas
Recentemente foi anunciada uma realidade alarmante, o Conselho Nacional de Educação (CNE), revelou isso mesmo, referindo que há milhares de estudantes sem aulas, sem que se saiba ao certo o total desse número. A questão que se coloca é: quem ensinará as próximas gerações? A educação encontra-se em colapso diante dos nossos olhos, e o mais grave é que essa hecatombe parece aceite por todos, todos assobiam para o lado, desde o Governo à sociedade civil.
A Emigração
Em Portugal, como sabemos, são raras as famílias que não tenham elementos que abandonaram o nosso país em busca de uma vida melhor.
A taxa de emigração tem crescido de forma exponencial, pelo que cerca de 30% dos jovens portugueses entre os 15 e os 19 anos vivem no estrangeiro.
Portugal, possui a maior taxa de emigração da Europa, representado uma das mais elevadas a nível mundial. Apenas em 2022, cerca de 70.000 portugueses abandonaram o país – os iluminados dos nossos políticos apelam aos estrangeiros para virem para Portugal, quando escorraçam o seu próprio povo – preferem um país habitado por quem não fala a língua, não conhece os seus usos e costumes, a sua cultura e a sua identidade; à exceção, naturalmente, do Brasil e dos PALOP – Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa.
A Imigração sem Rei nem Roque
Em setembro de 2024, de acordo com um relatório da AIMA – Agência para Integração, Migrações e Asilo – Portugal contabilizava oficialmente 1.546.521 imigrantes, número esse que tenderia a aumentar devido aos muitos processos de regularização em curso. No entanto, é preocupante o número de imigrantes que se encontram no país de forma irregular, ou seja, ilegalmente, e que, naturalmente, fazem aumentar as preocupações. Desde a extinção do SEF – Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (promovida pelo PS), tem-se instalado no país uma autêntica anarquia, o Estado não é capaz de dar respostas em tempo útil que confiram dignidade a quem nos procura para de forma integra e honesta viver em Portugal. Não se dá atenção à economia, no sentido de rastrear as suas necessidades de mão de obra (estabelecendo quotas por segmento); não se antecipam condições dignas de habitação, acesso à saúde, à educação, integração cultural, etc., tudo “é feito em cima do joelho”.
A Segurança
A criação do espaço Schengen, em 1985, associada ao projeto europeu, e que se foi alargando a outros países como Portugal, resultou no fim do controlo das fronteiras (salvo raras exceções), fomentando a livre circulação de pessoas e bens na União Europeia, com todos os riscos daí resultantes. Portugal, como sabemos, é uma plataforma giratória para as grandes redes criminosas que se instalam na Europa, e que no nosso país encontram condições únicas, não apenas de natureza geográfica, como também as condições inerentes à ineficácia das nossas policias, motivada pelo desinvestimento em meios materiais e pela falta de valorização dos seus Recursos Humanos. Essa invasão ocorre por terra e por mar, e por muito que se tente, atualmente, não há meios materiais nem humanos com capacidade para executar um policiamento e uma fiscalização mais sistematizada.
Não se trata de um problema apenas de Portugal, mas sim, da Europa de uma forma geral, como é o caso da Holanda, porém, se assim continuar, não sabemos qual será o epílogo, mas acreditamos que será o de um filme dramático.
Além disso, não sendo um país inseguro, Portugal tem testemunhado nos últimos anos um incremento de crimes de natureza atípica, como sequestros e outros, indiciando uma mudança de paradigma – que a todos deve preocupar.
Não obstante, o SIRESP – Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança de Portugal, continua a padecer de enormes fragilidades, para mal de toda a população portuguesa. O caso dos incêndios de Pedrógão, em 2017, é um caso que nos deve envergonhar profundamente a todos (devido ao seu enredo) devendo servir de exemplo àquilo com que podemos, ou não, esperar do Estado.
A Corrupção
O Índice da Transparência Internacional, publicado desde 2012, revela que Portugal está em queda livre desde 2015, ocupando a 43.ª posição entre os 180 países avaliados, ou seja, nove lugares abaixo da 34.ª posição que ocupava em 2023, com 57 pontos numa escala de 0 (Estados altamente corruptos) a 100 (elevada integridade dos Estados no combate à corrupção). Essa realidade é de tal modo inquietante, que Portugal partilha o 43.º lugar com países como o Botswana e o Ruanda.
A Ilusão
Não há dúvidas de que, feito um diagnóstico prévio, com todas as fragilidades que isso possa representar, Portugal não é no seu todo um país de sol e praia, mas padece de muitas areias nas suas engrenagens. A gradual implosão de partidos políticos como o Bloco de Esquerda, o Partido Comunista, o CDS-PP e a queda acentuada de um dos partidos fundadores desta pseudodemocracia, como o Partido Socialista, aliadas a uma “maioria pequenina” e não “maior” do Partido Social Democrata, culminaram na ascensão de um partido que, em 6 anos, se tornou na segunda força política no Parlamento.
Todavia, desenganem-se os que acreditam que o CHEGA é o salvador da pátria, nunca a incoerência foi salvação de coisa alguma, muito menos de um país em vias de colapso.
Infelizmente, e de forma amarga, é motivo para se dizer que Portugal não tem neste momento um único partido político à altura de operar as transformações de que necessita, e se porventura o tem, a sua expressividade será de tal modo reduzida que de nada servirá.
Agradeçam esta hecatombe à incapacidade que o nosso povo, ao longo de meio século, demonstrou em separar o trigo do joio. Não será por acaso que as escolas e a cultura são tão desvalorizadas em Portugal – abrindo-se caminho fácil a ideologias arbitrárias, egocêntricas, demagógicas, indiferentes ao sofrimento do povo e às suas verdadeiras dificuldades e aspirações.