O Ministério Público tem em sua posse alguns textos escritos pelo empresário Manuel Pinho que lhe foram apreendidos no passado dia 23 de fevereiro, na Quinta do Assento, em Braga, onde cumpre – em conjunto com a esposa – o regime de prisão domiciliária face aos processos EDP – no qual é acusado de receber luvas enquanto governante – e BES – onde é acusado de continuar a receber pagamentos quando já desempenhava funções como ministro.
Os textos revelarão algumas das justificações de Pinho que iriam ser entregues ao MP, mas que o empresário decidiu não entregar, remetendo-se ao silêncio durante a fase preliminar do processo.
Esta quarta-feira, o jornal Observador [acesso pago] divulgou alguns dos textos, com um deles a referir a assunção de uma “habilidade” levada a cabo pelo ex-ministro da Economia para que não fosse obrigado a revelar todos o património quando entrou para o Governo, a convite de José Sócrates.
Num dos textos, com o título “Caranguejo”, é possível ler a admissão da estratégia, conforme transcrito pelo jornal digital: “Assumo que usei de uma ‘habilidade’ para não revelar totalmente o meu património quando entrei para o Governo. Não o devia ter feito, mas a contrapartida teria sido continuar a gozar de um lugar tremendamente bem pago e em que fazia pouco, usufruir de férias de luxo e viajar em classe negócios”.
Pinho refere-se ao cargo de administrador executivo que desempenhava no Banco Espírito Santo (BES), de Ricardo Salgado, bem como de outras sociedades daquele grupo financeiro, tanto em Portugal como no exterior. Segundo a CNN Portugal, entre 2004 e 2005, Pinho declarou cerca de meio milhão de euros.
O antigo governante refere no texto citado ter considerado “mais importante servir” o país, pelo que, afirma, não teve alternativa, ocultando assim o património quando foi nomeado ministro, em março de 2005.
“Antes de entrar no Governo, criei uma fundação, a Tartaruga, porque era forma ‘habilidosa’ de não ter de declarar as minhas poupanças no exterior, caso contrário não teria integrado o Governo”, terá escrito, ainda segundo o mesmo documento apreendido.
Refere o Observador que, ao longo dos textos, Pinho tenta sempre transformar uma sociedade offshore sediada no Panamá – e denunciada no caso Panamá Papers – como uma fundação legítima, mas sem atividades comerciais, pelo que considerou que a “Fundação Tartaruga distingue-se de uma sociedade offshore“.
No entanto, apenas foi descoberto porque a lei contra branqueamento de capitais obrigado os bancos europeus a divulgarem os beneficiários dessas mesmas sociedades.
Suspensão de pagamentos do BES após cargo público
Noutro texto, sob o nome “MP”, Pinho terá escrito que tinha combinado com Ricardo Salgado que todos os pagamentos recebidos provenientes de cargos na sociedade Espírito Santo seriam anulados caso o economista fosse nomeado para um cargo público, algo que não sucedeu.
Nesse texto, Manuel Pinho diz que foi surpreendido (assim como a mulher) que os pagamentos continuaram a entrar nas suas contas, alegando não se ter apercebido do mesmo.