Vizinhança no Gerês aguarda pelo final da “Torre de Babel”

Ministério Público investiga construção ilegal

O DIAP do Ministério Público de Braga está a investigar os crimes de violação das regras de construção, relacionados com um edifício licenciado para ter cerca do triplo da altura legalmente permitida, mas só embargado já a meio da obra, no centro da Vila do Gerês, depois de denúncias nas redes sociais, para apurar responsabilidades, também na falta de fiscalização, do presidente, vereadores e de dois técnicos superiores da Câmara Municipal de Terras de Bouro, além do dono da obra, tudo já no primeiro mandato de Manuel Tibo.

No processo camarário, já consultado por O MINHO, foi autorizada a construção de um edifício, que teria cinco pisos acima da cota de soleira, mais a cave (atualmente já alagada) com mais de 15 metros de altura, tendo a sua construção, entretanto embargada, passado por vicissitudes, como a colocação de um pilar de suporte do prédio mesmo em cima do passeio para peões e que só viria a ser corrigido depois dos protestos no Gerês por parte de associações cívicas e ambientalistas, bem como de vários partidos políticos e cidadãos.

Ao longo das várias fases do processo, licenciado primeiro em nome do proprietário do terreno, o geresiano António Manuel da Silva e depois à empresa bracarense IMEG Lda, foi conhecendo sempre sucessivas autorizações de acrescentos em altura, tendo na última versão alvará para a construção de cinco pisos, quando só pode ter dois, tudo isto depois já do anterior presidente da Câmara Municipal de Terras de Bouro, Joaquim Cracel, com o pelouro das obras particulares, ter rejeitado, após estudo prévio, a edificação pretendida.

Foto: O MINHO

É que em 2011, quando o PDM de Terras de Bouro ainda não era tão restritivo como o que entrou em vigor no ano de 2015, já então Joaquim Cracel se baseava nos pareceres a cargo da autarquia, segundo os quais o projetado tinha “dimensões excessivas, quer para o local, quer para a dimensão e fisiografia da parcela”, além de que “o volume edificado não se enquadra na zona onde se situa e coloca ainda em causa o equilíbrio urbanístico e paisagístico existente e até do ponto de vista da circulação automóvel e estacionamento, comporta riscos acrescidos para a segurança”, bem como “ter um forte impacto visual e colocando em causa o equilíbrio urbanístico e paisagístico da envolvente constituído uma barreira ainda que arquitetónica da encosta sobranceira”, segundo os serviços camarários.

“Torre de Babel” para ser demolida

A “Torre de Babel”, como é conhecida a construção, em pleno coração da vila termal do Gerês, no concelho de Terras de Bouro, carecia de fiscalização e registou um gravíssimo acidente de trabalho, em 7 de dezembro de 2019, cujo operário teve que ser transportado logo num helicóptero do INEM para a Sala de Emergência do Hospital Central de Braga.

Entretanto, o vice-presidente da Câmara Municipal de Terras de Bouro, Adelino da Silva Cunha, que tem o pelouro das Obras Particulares, estribado com um parecer da catedrática administrativista Fernanda Paula de Oliveira, considera caducada a licença, que permitia um rés-do-chão para comércio e serviços, mais quatro andares destinados a habitação, por isso despachou no sentido de demolição da parte excedente que já ia no seu terceiro piso.

No último despacho sobre o caso, a que acedeu O MINHO, o vice-presidente da autarquia anuncia a intenção de demolir o excedente da obra, à luz do PDM, isto é, aquilo que nunca deveria ter sido autorizado, considerando que apenas pode ficar de pé o rés-do-chão e o primeiro andar, devendo ser já desconstruído o terceiro piso (segundo andar) do edifício, salientando que caso não seja a empresa a fazer, caberá ao Município de Terras de Bouro a sua demolição, imputando-lhe depois todos os custos e conforme está previsto pela lei.

Foto: O MINHO

Mas João Filipe Vieira, que denunciou formalmente o caso na autarquia terrabourense, é de opinião que “a Câmara declarou a nulidade do despacho que originou a construção com cinco pisos, quando o que deveria era declarar a caducidade do processo e exigir, já em março de 2019, um novo processo de legalização ao abrigo do PDM então em vigor”.

“Apenas após novas queixas e já em Janeiro de 2020 a obra foi embargada, não sem que antes tenha ocorrido um grave acidente, em que um trabalhador caiu do terceiro piso, com várias fracturas e evacuação de helicóptero, mas nem mesmo esta situação tão dramática despertou o interesse da fiscalização que foi sempre reactiva, actuação que não é comum tendo em conta o seu histórico de actuação que conheço”, acrescentou João Filipe Vieira.

A reposição do local, tal como estava no estado anterior, tem vindo a ser sucessivamente reclamada por várias associações cívicas e em particular pelos mais diretamente afetados, os proprietários da histórica Residencial Ribeiro, estabelecimento hoteleiro de referência no Gerês, que ficaria totalmente tapado pela altura sucessiva daquela construção, ilegal e clandestina, caso não tivesse havido intervenção também do Bloco de Esquerda e do PCP.

Ironicamente, a construção ilegal tem decorrido na Rua Miguel Torga, o poeta que tanto amou e defendeu os valores mais profundos e a preservação do Gerês, aí passando parte das férias, entre a terra natal transmontana, São Martinho de Anta, Sabrosa, e a cidade de adoção, Coimbra, onde como Afolfo Coelho da Rocha, era médico otorrinolaringologista.

Apurar responsabilidades criminais

O caso está ainda com o presidente da autarquia, Manuel Tibo, dadas as responsabilidades políticas, por ter sido autorizada já no seu primeiro mandato, faltando apurar as eventuais consequências penais para o autarca do PSD, bem como para o vice-presidente da Câmara Municipal de Terras de Bouro, Adelino da Silva Cunha, por ter sido o autor dos despachos dados durante o primeiro mandato, como já no atual Executivo, ambos liderados por Tibo.

O MINHO apurou que em ambos os processos, o de Braga e o de Vila Verde, estão a ser investigados pelo Ministério Público, o diretor da Divisão de Planeamento, Urbanismo e Ambiente (DPUA), o engenheiro civil Jerónimo Correia, a par de outro alto responsável pelo mesmo departamento municipal, arquiteto Alfredo Machado, de resto sendo os dois arguidos em outros processos, um dos quais já com o início do julgamente marcado para breve, que é o da construção ilegal no lugar de Vau, freguesia de Balança, concelho de Terras de Bouro, da moradia da bancária Cátia Machado, irmã da então vereadora Liliana Machado e atualmente chefe de gabinete de Manuel Tibo, desde o seu primeiro mandato.

 
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