Dizem que está a ser reclamada pela natureza depois de ter sido amaldiçoada pelos frades que a habitavam. A casa encantada da Escusalla, em Lobios, no “coração” do Parque Transfronteiriço Gerês/Xurés, é um lugar mítico, embora pouco conhecido. Para alguns é um espaço enfeitiçado, sempre envolto por lendas e superstições, procurado por muitos forasteiros de ambos os países, até por situar-se na raia seca da fronteira entre o Minho e a Galiza.
O MINHO esteve lá e falou com um casal de arquitetos que também visitava o espaço, ela de Barcelos, ele peruano, que nos revelaram óticas diferentes que se completam e oferecem outra perspetiva de um local carregado de história e de estórias. A construção, agora tomada pela vegetação, construída integralmente em granito, em forma de U, há 295 anos (1727), incluía uma ermida e a capela, esta com abertura para o exterior, para o povo, e uma para o interior da casa, para entrada dos moradores.
Conquistar o que lhe foi retirado
“A natureza está a recuperar aquilo que é seu”, disse a O MINHO a arquiteta Ana Francisco, enquanto observava o espaço tomado pela vegetação. A jovem de Barcelos considera toda a envolvente como “um convite a refletir sobre a passagem do tempo” onde a natureza “voltou a reivindicar e a conquistar aquilo que lhe tinha sido retirado”.
“Agora conseguimos perceber o que terá sido um dia, mas tendo algum espaço para poder imaginar, também não podemos ter a certeza de tudo, com um novo agente construtivo que já não é o homem, mas o tempo e a própria natureza”, acrescentou, elogiando o “processo natural”, embora admitindo que podem ser criadas condições para que se “perceba o que se está a ver”.
Já Pavel Rosales, salienta que “este espaço tem um caráter romântico, em que deveria contar-se a história daquilo que foi em tempos, porque há versões diferentes, o que é válido, mas o tempo pode explicar tudo isso”. O arquiteto peruano considera o local “bastante agradável”, admitindo que possa ser “recuperado, mas sempre enquanto espaço ruínas, sendo aconselhável haver assistência à sua visitação”.
Pavel elogia o pátio central, pois tem “uma grande preponderância no conjunto do edificado, com espaços paralelos, face ao interior da casa principal, dos lados direito e esquerdo, desde a entrada, incluindo a zona da igreja”.
Lendas que fazem arrepiar
A Casa de Escusalla situa-se na localidade de Ludeiros, da freguesia de Manín, concelho de Lobios, província de Ourense, na Galiza, em Espanha, perto do Minho, com acessos a partir dos distritos de Braga (pela Portela do Homem, em Terras de Bouro) e de Viana do Castelo (pelo Lindoso, em Ponte da Barca), já nas Terras de Celanova, do Parque Transfronteiriço Gerês/Xurés.
Ao certo sabe-se que esta antiga casa senhorial, mandada construir no Século XVIII pelo Abade de Manín, Dom José Martínez y Parga, que dispunha de abundantes recursos financeiros, foi passando por vários proprietários, até ficar abandonada, com as paredes a serem invadidas pelas heras e a vegetação, envolvida num bosque, frente ao miradouro do qual se avista o rio Lima.
À margem dos seus pormenores arquitetónicos e da sua história, a Casa da Escusalla está envolta por lendas que fazem arrepiar, contando-se estarem ali enterrados muitos trabalhadores portugueses que terão sido assassinados por um frade conhecido como “Marrequinho”, de modo a não lhes pagar os seus serviços, quer aos pedreiros, quer aos jornaleiros, que andavam nas vindimas.
Mais tarde, um português condenado por crime de homicídio, que encontrou refúgio naquelas ruínas, sendo conhecido entre a população de Lobios como “tio Roque”, contava aos moradores das redondezas que em noites de lua cheia o frade aparecia em forma de fantasma, tal como duas monjas, madrugadas em que fugia para o centro da vila de Lobios, acabando o fugitivo por aparecer morto em circunstâncias estranhas, na estrada entre a Casa de Escusalla e Lobios, uma vez mais, em plena lua cheia.
Bruxaria ou devoção?
Nas povoações vizinhas, ao longo do concelho de Lobios, ninguém quer falar, mudando sempre de assunto, talvez pelo facto de a casa estar associada nas últimas décadas a um local de rituais, o que é indiciado pelos círios que ali vão colocando, a par de imagens religiosas ao fundo da capela, como um Jesus Cristo Crucificado, sem o braço esquerdo, ladeado por uma Virgem Maria com o Menino Jesus ao colo.
O princípio do fim da opulência da Casa de Escusalla foi no ano de 1836, aquando da Desamortização de Mendizabal, que foi o ato estatal espanhol de expropriação dos bens de mão morta, quer dizer, da posse dos bens imobiliários pertencentes à Igreja Católica, no país vizinho, pelo Reino de Espanha, tendo os frades sido obrigados a abandonar o espaço, que terão amaldiçoado.