Viaduto de Busseau d’Ahun da Linha de Montluçon a Limoges: que terá em comum com ponte ferroviária em Caminha?

Opinião de Rui Maia
Foto: DR

Rui Manuel Marinho Rodrigues Maia
Licenciado em História, Mestre em Património e Turismo Cultural pela UMinho – Investigador em Património Industrial

O que haverá de comum entre a vila de Caminha, no noroeste português, e Ahun, uma comuna francesa na região administrativa da Aquitânia (departamento de Creuse), no sudoeste de França?

Ora, o mundo é demasiado pequeno, pelo que, os factos mais singulares, não deixam de entrelaçar comunidades, povos e até mesmo nações. O mesmo sucedeu com a vila de Caminha que, no último quartel de Oitocentos, testemunhou a inauguração da ponte ferroviária sobre o rio Coura (1879) – parte integrante da Linha do Minho – ocorreu há precisamente 145 anos.

Em comum com o Viaduto Busseau d’Ahun, que demorou cerca de um ano a construir – tendo sido o primeiro viaduto metálico francês – tem a empresa executante: Fives-Lille.

Há um intervalo de 15 anos entre ambas as Obras de Arte, porém, essa circunstância demonstra de forma cabal o arrojo ininterrupto que a firma francesa Fives-Lille empregava nos seus trabalhos. Nessa época, as construções metálicas tornaram-se o novo paradigma, sobretudo pela versatilidade que ofereciam, pela rapidez no fabrico / montagem, bem como por um conjunto muito alargado de características estéticas, como a sensação de leveza, transparência ou robustez.

O ferro tornara-se por excelência no elemento capaz de concretizar os desafios mais ousados, tais eram as suas capacidades de resistir às forças físicas, como a tração e outras.

As treliças transformaram a arquitetura do ferro em rendilhados estéticos de beleza indiscutível, onde essas forças se dissipam de forma suave entre todos os elementos, possibilitando a fluidez de comboios e automóveis em superestruturas nunca antes imaginadas.

O Viaduto de Busseau d’Ahun possui 286,50 metros de comprimento e 57 metros de altura. Ao passo que a ponte ferroviária sobre o rio Coura, em Caminha, mede 164,210 metros de comprimento, cujo tabuleiro dista poucos metros das águas do rio Coura.

Todavia, ao fim de 145 anos continua a servir os propósitos para os quais foi construída, afigurando-se como marca indelével da Revolução Industrial do século XIX, na qual muitas firmas francesas desempenharam um papel vital.

Foi, por exemplo, o caso da firma Fives-Lille (fundada num subúrbio de Lille) na alvorada do século XIX, e que, apesar de passados mais de 200 anos, ainda subsiste como Grupo Five.

Não obstante, menciona-se a Casa Eiffel & Cia, com muitas Obras de Arte espalhadas pelo país, como a ponte rodo ferroviária de Viana do Castelo, a ponte ferroviária de Âncora, entre muitas outras entretanto substituídas pela SOREFAME.

Portugal deve muito do seu desenvolvimento social, económico e territorial a muitas dessas empresas e, não menos importante, a períodos políticos que encorajaram a sua aproximação aos países mais desenvolvidos da Europa e do mundo.

Hoje em dia, muitos dos que atravessam de comboio o estuário do rio Coura, circulando na ponte centenária através da Linha do Minho, são instigados a lembrar Gustave Eiffel, sendo um dos pioneiros das construções em ferro. Porém, outras firmas desempenharam um papel fundamental nesse paradigma, destacando-se a Fives-Lille, cuja atividade iniciou com o fabrico de caldeiras para destilar beterraba (no tempo do bloqueio imposto a França) tal era a falta de açúcar.

Mais tarde, debruçou-se sobre o fabrico de caldeiras para locomotivas e fabrico das mesmas, alargando o seu raio de ação a praticamente tudo que estivesse associado ao mundo ferroviário.

Fives-Lille foi, é, e continua a ser um dos gigantes do mundo industrial, saída do ventre de um tempo que mudou para sempre os destinos da humanidade.

Na próxima vez que atravessar a ponte ferroviária sobre o rio Coura, em Caminha, lembre-se que atravessa um pouco da ousadia e do arrojo de um gigante industrial francês do século XIX, que continua a transformar Portugal.

A autarquia de Caminha deve divulgar e promover com mais afinco essa magnifica Obra de Arte do nosso património industrial – única na região – sob a qual recaiu e recai parte do seu potencial de desenvolvimento social, económico e territorial.

 
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