A covid-19 não é o único perigo mortal silencioso que paira pelo nosso país. A vespa velutina, cuja picada pode ser fatal para o ser humano, está a adaptar-se ao habitat minhoto e é cada vez mais frequente construírem as suas ‘casas’ em locais inusitados. Por vezes, até junto ao chão.
Desengane-se quem pensa que a ‘asiática’ só nidifica no topo das árvores, onde estão em maior segurança face ao ser humano. A verdade é que o inseto invasor sente-se cada vez mais confortável com a construção humana, e faz a sua empreitada de vespeiros em varandas, postes de eletricidade, contadores, chaminés, armazéns, casas devolutas e onde mais possa calhar.
Mas os locais mais perigosos, com perfeito camuflado, estão nos arbustos rasteiros, em raízes de árvores mortas e em destroços orgânicos deixados no chão das zonas rurais, uma vez que a qualquer momento alguém pode tocar no vespeiro sem sequer dar conta da sua presença, como aconteceu recentemente em Aboim da Nóbrega, concelho de Vila Verde, e em Quintiães, em Barcelos.
O MINHO falou com Franclim Marques, presidente da Associação de Apicultores do Cávado e do Ave (Apicave), que atesta a perigosidade destes vespeiros mais rasteiros, sobretudo para quem faz trabalho de silvicultura, mas realça que, desde o primeiro ano, este inseto invasor nidifica “onde calha”.
“Não há um sítio determinado. O normal das vespas é fazerem um ninho primário com uma ou duas vespas e depois o secundário em outro local ainda mais sossegado, pois é aí onde as vespas se vão multiplicar e o ninho vai crescer. Pode ser numa árvore como pode ser no beiral de uma casa, numa chaminé, basicamente onde quer que elas consigam chegar”, esclarece.
António Pereira, presidente da Junta de Quintiães e Aguiar, em conjunto com dois apicultores locais, não tem muitas dúvidas que os ninhos rasteiros sejam cada vez em maior número. A O MINHO, conta que recentemente um trabalhador foi atacado e picado várias vezes por velutinas quando procedia a trabalhos de silvicultura num terreno. “Estava a cortar as silvas e atingiu o ninho sem querer, e elas claro, não perdoaram”, conta o responsável pela eliminação de mais de uma centena de vespeiros naquelas freguesias.
Outro ‘exterminador’ econhecido entre os pares apicultores é Domingos Costa, de Vila Verde. Esta semana, foi chamado por populares de Aboim da Nóbrega para eliminar um vespeiro que estava escondido na vegetação rasteira. Mais uma vez, dois trabalhadores estavam a cortar o mato e a máquina tocou onde não devia. Resultado: os dois picados, um deles a necessitar de assistência hospitalar.
Tanto António como Domingos afirmam que há maior prevalência de vespeiros durante este ano, algo que já tinham notado no ano transacto, mas não com tantas repercussões em termos de pessoas atacadas.
Embora não descarte que haja mais ninhos porque pode haver mais vespas, Franclim Marques acha que é uma questão de capacidade de observação. “Agora há muito mais escrutínio sobre a vespa que não existia nos primeiros anos, e por isso a impressão que estão a adaptar-se e a construir em locais mais rasteiros, mas isso sempre aconteceu”, reforça, lembrando o caso fatal em Vila Verde, há cerca de três anos, quando um emigrante morreu depois de ser picado dezenas de vezes enquanto cortava vegetação no seu terreno.
“O verdadeiro perigo do ninho de vespa é quando o cidadão não se apercebe que ele está lá e lhe toca, e por isso é que tem havido a preocupação da DGAVE, através do manual das boas práticas, a indicar para que não se mexa no vespeiro e se alerte a proteção civil “, adianta.
“Estamos no período em que elas estão a multiplicar-se é a altura em que os vespeiros estão em grande crescimento e não se sabe onde estão. A nossa dificuldade é que só no outono, quando as folhas caem, é que vemos os ninhos nas árvores de folha caduca, mas há outras que não têm folha caduca onde as vespas continuam escondidas”, alerta.
Franclim Marques compreende que nesta altura do ano seja complicado para os bombeiros e para a proteção civil estar a eliminar vespeiros, porque é a altura crítica de incêndios e coincide com a altura crítica da vespa, quando os vespeiros comportam milhares de insetos que se vão desdobrando pelo território. Mas é essa a recomendação a seguir, embora alguns apicultores, como Domingos, ou autarcas, como António, resolvam as situações pelas próprias mãos. “É normal, se um apicultor sabe o que está a fazer, pode tratar do assunto”, anui o responsável pela associação apícola do distrito de Braga.
E se para o cidadão comum é cada vez mais um problema, para quem tem de fazer trabalhos de apicultura, pode tornar-se um pesadelo. Por isso, recomenda a Apicave, antes de cortar qualquer tipo de vegetação ou árvore, é importante “observar se existe algum movimento de vespas”.
“Caso veja uma vespa, é seguir o rastro e tentar localizar o vespeiro, e aí chamar a proteção civil antes de começar a cortar, caso contrário vai haver ‘festa’ pela certa”, conclui Franclim Marques.
A vespa velutina, também chamada de vespa asiática, chegou à Europa em 2004, via marítima, a um porto localizado em França. Acabou por se espalhar por outros países ao redor, chegando a Portugal em 2011, pelo Alto Minho. É considerada uma ameaça à produção apícola, de fruta e à saúde pública.