O Tribunal da Relação de Guimarães reenviou para o de Valença o processo referente a uma mulher disfuncional, de 21 anos, natural da Ponte da Barca, a quem tinha sido judicialmente nomeada a mãe como sua acompanhante. Pede ao juiz da primeira instância que reavalie se dever ser a mãe ou o pai.
“Não existem pessoas idóneas e próximas da requerida que estejam dispostas a assumir as funções de acompanhante”, dizia já o magistrado da primeira instância, quando a nomeou para a função.
Nem há, em Portugal, profissionais preparados para a função e com enquadramento legal, o que dificulta a vida aos tribunais, anota a Comissão de Proteção ao Idoso, de Braga.
A nomeação da progenitora para acompanhamento legal da filha foi feita pelo Tribunal de Valença, após um relatório da Segurança Social (SS) de junho de 2021 que concluiu que apresenta “um padrão disfuncional de comportamento, com impulsividade, instabilidade emocional, fraca tolerância à frustração e desrespeito por regras, com episódios de heteroagressividade, fugas de casa, consumo de álcool e de substâncias psicotrópicas a título recreativo”.
Filha com debilidade intelectual
O juiz sublinha que, “a 13 de abril de 2018 foi encontrada caída junto às muralhas do Castelo da cidade, inconsciente, tudo indicando que se terá atirado de uma altura de 8 metros”, e anota que “apresenta um quadro de debilidade intelectual desde o nascimento; nunca exerceu atividade profissional nem tem capacidade para tal sem supervisão de terceiros, apenas tem autonomia para tratar da sua higiene pessoal, alimentar-se e vestir-se”.
Acrescenta que “não tem capacidade para gerir a sua casa sem supervisão de terceiros, não consegue orientar-se no tempo, sabe ler e escrever, mas não sabe fazer contas, conhece o valor facial do dinheiro, mas não sabe o seu valor real, o que a afeta e impede de administrar a sua pessoa e os seus bens”.
“Por isso, – escreveu o juiz – carece de autonomia para os afazeres diários, pelo que deverá beneficiar da medida de representação especial ficando-lhe vedado o exercício de direitos pessoais e o de celebrar negócios, mesmo os da vida corrente”. E vive numa pensão, a expensas da SS.
No processo, a jovem, por sua vez, afirmou não falar com o pai e falar com a mãe, mas disse que tem com esta uma relação muito complicada.
A Segurança Social aconselhava , de resto o seu internamento compulsivo.
Mãe recorreu
Após a nomeação, e apesar de o Código Civil determinar que os pais não podem escusar-se do cargo de acompanhante dos filhos, se para tal forem designados, a mãe recorreu para a Relação dizendo que “não possuía condições para assegurar o cargo de forma responsável como lhe é exigível”, e juntou relatório psicológico.
Justificou a sua posição, “na falta de contacto com a [filha] há cerca de dois anos, na falta de respeito que a filha lhe tem, e com o facto de já ter sido agredida fisicamente por ela”.
O pai também já se manifestara indisponível.
Agora, a Relação, em acórdão de que foi relatora a juíza Conceição Sampaio, pede ao Tribunal de Valença que reanalise qual dos dois pais deve ser o acompanhante, uma tarefa que nada tem a ver com a de ‘cuidador’.
”Manifestando ambos os progenitores indisponibilidade para o cargo, não havendo outras alternativas e não existindo no país acompanhantes públicos ou profissionais, a escolha entre um ou outro dos progenitores deverá obedecer a este critério funcional de controlo e autoridade”, dizem os juízes.
Juíza quer bolsa de acompanhantes
Curiosamente, a juíza Conceição Sampaio, defendeu em abril, num seminário em Braga, enquanto vice-presidente da Comissão de Proteção ao Idoso, a criação de uma ‘bolsa de acompanhantes’ que possam ser nomeados pelos tribunais e que tenham a respetiva preparação técnica e jurídica. O que estará a ser estudado pelo Governo, estando a CPI a ultimar uma proposta nesse sentido.
Casos há, em que, por exemplo, a diretora de dado um lar é nomeada mais de dez vezes como acompanhante, sendo obrigada a ficar na função, mesmo depois de sair da instituição.