Tradução integral da acusação para espanhol atrasa “megaprocesso AIMinho”

Juiz de instrução criminal Carlos Alexandre declarou nula a notificação da acusação a dois arguidos espanhóis, por não ter sido integralmente traduzida para a sua língua materna
Carlos Alexandre. Foto: Facebook

O juiz de instrução criminal Carlos Alexandre declarou nula a notificação da acusação a dois arguidos espanhóis no megaprocesso da Associação Industrial do Minho (AIMinho), por não ter sido integralmente traduzida para a sua língua materna.

Por decisão de 17 de janeiro, a que a Lusa esta sexta-feira teve acesso, Carlos Alexandre determina que a acusação seja integralmente traduzida para espanhol e enviada àqueles dois arguidos.

Só depois é que começará a contar o caso para os requerimentos de abertura de instrução.

Para o juiz, a não tradução integral limita o exercício de direito de defesa dos arguidos.

A acusação tem 3.097 páginas, tendo o Ministério Público (MP) enviado àqueles dois arguidos a acusação na íntegra em português, acrescida das 166 páginas que lhes diziam diretamente respeito em espanhol.

O MP considerava ser “absolutamente inútil” para a defesa dos arguidos a tradução integral da acusação, além de “absolutamente indesejável” essa tradução, por ter como consequência o “prolongamento infundado” da situação dos restantes arguidos.

Além disso, o MP lembrava que a tradução integral terá “um custo muitíssimo elevado, suportado pelos impostos dos contribuintes, em qualquer contrapartida legítima do ponto de vista da defesa dos direitos dos arguidos”.

Carlos Alexandre contrapôs que a poupança de custos não constitui nem pode constituir fundamento para não ser ordenada a tradução integral.

“O Estado tem de suportar os custos das traduções de documentos essenciais do processo penal, sob pena de o direito de defesa dos arguidos ser violado”, sustenta.

Desta forma, só depois de notificados aqueles arguidos espanhóis da acusação traduzida para a sua língua é que começará a contar o prazo para o requerimento de abertura de instrução.

O processo relaciona-se com ganhos ilícitos de quase 10 milhões de euros com projetos relacionados com a AIMinho e cofinanciados pela União Europeia e conta com 126 arguidos, dos quais 79 são pessoas singulares e 47 empresas.

Os arguidos vão responder por crimes de associação criminosa, fraude na obtenção de subsídios, burla qualificada, branqueamento, falsificação e fraude fiscal qualificada, remontando os factos ao período entre 2008 e 2013.

Ao todo, foram investigadas 109 operações distintas cofinanciadas por fundos europeus e pelo Orçamento do Estado, tendo sido apurada a existência de uma vantagem ilícita obtida pelos arguidos de mais de 9,7 milhões de euros.

De acordo com a acusação, “a AIMinho e pessoas coletivas (empresas) que à sua volta gravitavam foram utilizadas pelos arguidos para obterem subsídios de forma fraudulenta”.

Os arguidos, explica a acusação, surgiam, no contexto de operações cofinanciadas por fundos europeus, como fornecedores de bens e serviços que, na realidade, não eram prestados ou candidatando-se a subsídios com projetos que nunca tencionavam executar.

“Ficou igualmente indiciado que os arguidos agiam de forma organizada e recorriam, designadamente, à emissão de faturas falsas, através de acordos estabelecidos entre as várias entidades deste universo, conseguindo também diminuir artificialmente a matéria coletável e pagar menos impostos”, esclarece o DCIAP.

O MP concluiu ainda que os proveitos obtidos eram “reintroduzidos na economia lícita” depois de passarem por “circuitos financeiros triangulados e enganosos”.

O inquérito começou em 2012 após uma comunicação do Organismo Europeu de Luta Antifraude (OLAF).

No decurso da investigação foram efetuadas cerca de uma centena de buscas e realizaram-se interceções telefónicas e de correspondência eletrónica.

 
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