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A multi medalhada nadadora Tamila Holub não vai regressar aos Estados Unidos despendendo o seu foco e concentração na preparação para os Jogos Olímpicos de Tóquio. A atleta do SC Braga faz uma pausa na formação académica para melhorar tempos e conseguir estar na melhor forma aquando das provas olímpicas.
Muito focada, competitiva e trabalhadora. São as três características que a nadadora bracarense aponta como factores para o sucesso. Por isso, o principal objectivo está traçado: “melhorar as marcas pessoais. Em 1500 metros, posso melhorar substancialmente”. Um dos segredos na preparação está na mistura dos ensinamentos que trouxe de dois anos nos Estados Unidos com a resiliência de ser português.
Nascida na Ucrânia, Tamila vem para Portugal com três anos. “A situação não era estável, economicamente, como não é ainda hoje, e os meus pais decidiram que era o mais correto vir para um país melhor. Sem familiares por cá, foi por intermédio de um amigo que escolheram Portugal e “calhou bem”.
O regresso ao país Natal acontece de quatro em quatro anos, de férias: “evolução não tenho visto nenhuma, pelo contrário”.
Primeira prova nacional: Ponte de Lima
A natação surgiu na vida de Holub porque tinha muitos problemas respiratórios e “os meus pais acharam que era a melhor opção. Comecei com seis anos nas piscinas de Maximinos e o treinador de lá mandou para a Rodovia. Como os meus pais eram altos, eu dava um salto e já ficava no meio da piscina, ele tinha muita atenção para comigo, viu que eu dava para alguma coisa e mandava as crianças que podiam competir para a Rodovia”.
A pré-competição começou entre os 8 aos 10 anos. A primeira prova foi em Ponte de Lima mas Tamila não se lembra bem da competição em si: “lembro-me de me terem dado o equipamento do SC Braga, que era todo lindo, e eu cheguei a casa, toda vaidosa, a mostrar o novo equipamento”.
Quando foi convocada pela primeira vez para uma selecção nacional, em pré-júnior, tinha 13 anos. “Eu nadava muito mal”, reconhece hoje. “O bom dos estágios é que há vários treinadores com técnicas e ideias diferentes, eu dava cinco braçadas e alguém me parava para dar indicações. Lembro-me de ter sido um estágio muito duro, de andar sempre dorida mas foi aí que comecei a aprender a gostar”.
Primeira prova internacional: Polónia
Foi depois da primeira prova internacional na Polónia, em 2013, onde ficou em primeiro e segundo que lhe caiu a ficha: “percebi que queria ir a todas as competições internacionais que pudesse, em 400 e 800 metros”.
A escolha de distâncias mais longas encaixa no perfil da natação do SC Braga. “Não temos uma escola muito especializada de sprinters. Calhou porque tinha a capacidade de aguentar treinos longos sem me queixar muito. Nunca gostei de nadar estilos porque tinha mariposa e eu nem quero ouvir falar em mariposa. Gosto de crawl e posso fazer três horas de treino neste estilo”.
Tamila é a confirmação que atleta de alta competição não tem vida pessoal, “é inexistente para quem leva a natação a sério”. E em termos de estudos as coisas também não são fáceis. “Até ao nono ano basta estar atento nas aulas e estudar um pouco, acabei com cincos’s. Já no 10º, 11º, 12º, onde é preciso estudar em casa, e nós no Braga temos treinos tardios a acabar às 22h00, chegamos a casa, jantamos e não vamos fazer os trabalhos de casa e aí custa muito”.
Estados Unidos
Para preparar os jogos olímpicos de 2016 tomou a decisão de parar os estudos. Era ano de exames nacionais, tinha uma média boa mas “sabia que olímpicos são de quatro em quatro anos e exames nacionais há todos os anos. Prometi a mesma que ia dar o máximo, felizmente correu bem”.
A opção de ir para os Estados Unidos surgiu depois dos Jogos Olímpicos e houve um factor a pesar na decisão: “em Portugal não querem saber de desporto a não ser futebol, e estou a falar dos dirigentes e dos media, houve quem viesse de provas de alto nível e nada… as pessoas esquecem-se que a este nível um oitavo lugar é extraordinário e isso acontece por falta de conhecimento da modalidade, sobretudo. A federação tem um canal que transmite as provas em directo e as pessoas nem sabem”.
A fundista teve cinco propostas de universidades americanas, Alabama, Nevada, New Jersey, Louisville, North Carolina acabando por ser esta a escolhida: “foi a única que me deu todos os contactos, podia falar com todos os atletas por skype. Uma coisa é haver treinadores a dizer que a sua universidade é a melhor, outra é falar com os atletas e esta tinha muitos internacionais. Por outro lado, era a que tinha melhor classificação a nível nacional e a nível universitário igual”.
Tamila ia treinar junto da terceira melhor fundista dos Estados Unidos e, assim, “eu tinha alguém que puxasse por mim. A experiência foi muito positiva: aprendi a fazer ginásio, finalmente, a fazer dry land, fora de água, tecnicamente têm um trabalho incrível que nós nem temos a noção que existe”.
Outras das particularidades prende-se com um “enorme” espírito de equipa, a existência de muitas actividades e “é mais fácil conciliar com os estudos do que em Portugal”.
Goodbye América
No entanto, havia situações que começaram a não estar em consonância com os objectivos de Tamila Holub. “Estava melhor em piscina curta, mas não estava a melhor os meus tempos em piscina longa. Eles treinam em piscinas de 25 metros mas depois as provas são em piscinas de 50 metros tal como nos jogos. Apesar de estar a melhorar em piscina curta não me interessava muito”.
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Por outro lado, sentia que “estavam interessados em mim mais para ajudar as outras raparigas a evoluir porque era a mais forte do que me fazerem evoluir a mim” mas trouxe uma aprendizagem: “eles conseguiram mostrar-me que uma fundista pode fazer treino em velocidade, desde que queira e tenha força de vontade”.
Com mais dois anos de bolsa, a bracarense vai ficar por cá este ano e depois vai decidir que caminho quer tomar: “as equivalências não são muitas. Quero seguir Medicina e acho que consigo fazer isso em Portugal”.
‘Konnichiwa’ Tóquio
A preparação para os próximos jogos olímpicos, em Tóquio, já começou, “estou à espera de melhores resultados porque a primeira vez foi mais de participação”, e os objectivos traçados: “top 16 seria muito positivo. Só tenho mínimo para os 1500 mas sinto que consigo ter mínimos nos 800 metros”.
Quatro vezes campeã nacional (200, 400, 800 e 1500 metros), Tamila conta a odisseia da participação nestes campeonatos que decorreram na Madeira. “Foi direta da Coreia do Sul onde se realizaram os Mundiais para a Madeira e na primeira prova de 200 metros não estava a sentir muito bem. Por isso foi a vitória mais inesperada de todas”.
Na preparação para os jogos nipónicos irã verter alguns ensinamentos americanos, sobretudo, trabalho fora de água.
“Estou a trabalhar com o meu treinador para ver se conseguimos implementar algumas destas ideias nos mais novos”.
Luís Cameira
O treinador é Luís Cameira, uma referência na modalidade e de extrema importância na carreira da fundista. “Não teria alcançado vários dos feitos se ele não me tivesse dado confiança, tirado dúvidas. Está sempre a lembrar-me dos meus feitos que eu tenho tendência a esquecer”.
Um das maiores frustrações da carreira aconteceu nas vésperas dos jogos europeus da juventude em Minsk, corria o ano de 2015. Tamila era a favorita em todas as provas onde ia participar. “Fui participar numa prova pequenina em Madrid, para ver o estado de forma e tive uma apendicite. Estava inscrita nos rankings em primeiro e em segundo e por causa disso não fui! Foi frustrante. Mas não podemos pensar no que correu mal senão não saímos do sítio, temos que olhar para a frente”.
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E o futuro é já ali e, por isso, há marcas a melhorar: “em 1500 metros posso fazer substancialmente melhor”. Com 16:20 a ideia é fazer abaixo dos 16:15 actual recorde nacional. “Bater o recorde? Querendo tudo é possível!”.
Nos 800 metros “é mais complicado mas tenho que ir atrás do recorde nacional que está próximos dos mínimos A”. Porque como diz um provérbio japonês: ‘Com pequenas batidas uma grande árvore é derrubada’.