A Associação Portuguesa dos Comerciantes de Materiais de Construção (APCMC) e dois construtores apontaram hoje à Lusa que os problemas do setor da construção, que já condicionaram obras no Norte, entre as quais a demolição do Prédio Coutinho, têm origens tanto logísticas como na produção de origem.
É que não foi só Viana. Os concelhos do Porto e Vila Nova de Gaia também viram-se obrigados, este mês, a parar ou atrasar obras públicas que estão a decorrer, devido à falta de matéria-prima e de mão-de-obra e a constrangimentos pandémicos.
“São problemas logísticos. Às vezes as matérias-primas também estão integradas neste processo logístico. De facto, há problemas e houve paragens de fábricas na Europa no domínio do alumínio, porque faltou o magnésio, que era necessário para o produzir, e portanto há alguns problemas”, reconheceu à Lusa José Matos, secretário-geral da APCMC.
Questionado sobre qual é a raiz do problema, se mais logística ou do produto em si, o responsável da associação do setor frisou sobretudo a primeira, já que com o que vem acontecendo no setor desde o ano passado, “não é fácil estar a satisfazer todas as encomendas a tempo”.
“Aquilo que acontece é que muitas vezes as empresas estavam habituadas, sobretudo em Portugal, a fazer as compras à última da hora”, esperando-se “os que os armazenistas tivessem ‘stock’ de tudo” e rapidamente expedissem o produto.
Segundo José Matos, “hoje em dia esses prazos são mais longos e a garantia das quantidades pretendidas nem sempre se consegue obter. Acontece muito por falta de planeamento das obras. Dantes as coisas resolviam-se, hoje em dia está complicado”.
O fenómeno é reconhecido por Rogério Lucas, da construtora Albino Lucas, de Bragança, que confirmou à Lusa a “rotura na cadeia de distribuição e produção”.
“Houve muitas fábricas que fecharam, e esgotaram os ‘stocks'”, e com a “política do consumo na hora”, anteriormente não havia problema. Agora, “os contentores não estão a chegar aqui a Portugal”.
Questionado se o problema é puramente logístico, o responsável da construtora bragantina adicionou que “também é dos materiais”, já que há problemas na “extração” e na “produção”.
“Tem tudo a ver com o sistema energético, e ao subir o resto sobe. É claro… a cadeia estava tão bem montada e tão bem oleada que houve uma pequena alteração, um pequeno parâmetro que não se conseguiu cumprir, e até que se volte a afinar ainda vai demorar algum tempo”, disse à Lusa.
Quanto aos preços, Rogério Lucas admitiu que possa existir “algum aproveitamento pela escassez” de materiais ao longo dos elementos da cadeia de distribuição, mas salientou que “quando a quantidade é menor o preço aumenta”, e isso “é a lei do mercado” a funcionar.
Vítor Santos, da construtora Norasil, sediada em Matosinhos (distrito do Porto), lamentou que a situação do setor da construção civil seja atualmente “imprevisível”.
“Neste momento, infelizmente, gostaríamos todos de estar mais seguros e mais tranquilos, mas neste momento não temos nenhum fator, nada, que nos tranquilize de alguma forma”, disse à Lusa.
Em termos de materiais, os três responsáveis ouvidos pela Lusa mencionaram materiais como o ferro, cobre, alumínio, cimento, aço, componentes eletrónicos e metais em geral onde mais se notam subidas nos preços, bem como a componente energética, em especial os combustíveis.
Todos, sem exceção, mencionaram também o problema da falta de mão-de-obra, que também não contribui para perspetivas melhores para o futuro, em termos de preços.
“O que estou convencido é de que vamos chegar a março e se calhar os preços vão manter-se e nunca irão para os que estavam há um ano”, antevê Vítor Santos, ao passo que Rogério Lucas diz que “os preços vão baixar, porque subiram muito e é desproporcional”, mas nunca para o nível “antes da pandemia”.
Já José Matos observou que nas matérias-primas e no transporte marítimo “estava a haver estabilização de preços” e “o pior já tinha passado”, mas agora houve “o disparo dos custos da energia”.