Neste final de ano, em Portugal, apenas três circos estão a trabalhar. O Rúben Circus é um deles. E está em Braga, até 3 de janeiro, num terreno cedido pela Junta de Freguesia de Ferreiros.
Uma tenda com capacidade, para 900 pessoas, recebe, no máximo, 180. “Às vezes atuamos para 20 ou 30 espectadores”, afirma a O MINHO, Mário Rúben, o responsável pelo circo, pela família e pelo negócio. “O ano foi calamitoso, mas continuamos aqui, para quem quiser vir ao circo”, argumenta o proprietário sobre a vontade de não desistir.
A pandemia provocou o cancelamento, ou a não contratação, de espetáculos agendados, ou de espetáculos anuais, como a atuação Natalícia para os trabalhadores da Bosch. A adesão à bilheteira também diminuiu radicalmente, o que obriga o circo a trabalhar com a prata da casa.
“Normalmente no mês de Natal e de final de ano, o número de funcionários aumentava, contratávamos mais artistas, para podermos apresentar mais números durante os espetáculos e diversificá-los de ano para ano. Este ano foi tão mau, que não podemos contratar ninguém, trabalhamos com a prata da casa” reflete o patriarca do circo a O MINHO.
A vida no circo em tempos de pandemia está, inclusivamente, a ser alvo de um documentário, com o nome “A pão e água”, do realizador de cinema Stephane Oliveira, que cedeu a O MINHO as fotografias que ilustram esta reportagem.
O circo conta com a presença de malabaristas, trapezistas, contorcionistas, palhaços e um tanque de piranhas. Todos os artistas pertencem à família e vão ensinando a arte, de geração em geração. “A minha tia aprendeu contorcionismo na escola de circo de Bucareste, na Roménia, e é ela que ensina as minhas sobrinhas”, conta Rúben orgulhoso.
A família com 18 membros depende do sucesso do circo para sobreviver e a arte do espetáculo corre-lhes no sangue. “O meu bisavô pertencia ao circo, o meu filho nasceu aqui e eu nunca pensei em desistir, nasci no circo e vou morrer no circo”, conta Mário Rúben a O MINHO.
A desinfeção do espaço e os dispensários de álcool gel, a redução do número de lugares e a divisão dos espectadores por grupo, o aquecimento da tenda, a iluminação e o som valem, para os artistas, “metade da qualidade do espetáculo”.
Os artistas queixam-se da falta de apoios, por parte do Estado, para enfrentarem a crise da covid-19. No objetivo de negociar apoios com a tutela surgiu a AACP (Associação de Arte Circense Portuguesa). Este ano, a Câmara de Braga apoiou o circo através do licenciamento e o delegado de saúde aprovou as condições do espaço. O circo está montado num terreno privado, que foi facultado com o apoio de Junta de Freguesia de Ferreiros.
O Rúben Circus presenteará Braga até dia 3 de janeiro, com espetáculos às 16:00, de segunda a sexta-feira, e ao fim-de-semana às 10:30.
Palhaço pobre e palhaço rico
Flávio Costa e Orlando Costa atuam em parelha, para o número do palhaço rico, palhaço pobre. Pertencem ambos à família, mas o pai de Flávio abandonou o circo há 35 anos. Flávio, ainda jovem, decidiu regressar: “O circo faz parte de mim é aqui, que me sinto bem, na arte dos sete ofícios”.
Orlando Costa era domador de tigres e leões, no braço a cicatriz de uma dentada, na mão um tendão a menos: “O espetáculo ficou mais pobre sem animais, agora só temos o tanque de piranhas e temos de nos adaptar. Virei palhaço”.
Sem razões para sorrir devido à crise instaurada no setor, Flávio Costa dá o mote a O MINHO: “As tristezas não pagam dividas. É assim que enfrentamos esta pandemia”. Sobre os receios e as ansiedades de um futuro ameaçado, o palhaço afirma: “Com três bolas já ninguém passa fome”.
As famílias das duplas, excetuando o pai de Flávio, pertencem ao circo e o dia mais feliz das suas vidas foi pisarem o palco do coliseu do Porto.