A peça de teatro “1/2 kg de carne”, que explora a “intolerância” e a “desestruturação da estabilidade emocional”, a partir de “O mercador de Veneza”, de William Shakespeare, estreia-se na sexta-feira, no Centro Cultural Vila Flor (CCVF), em Guimarães.
Com um título que procura “enaltecer e ampliar” o “peso do coração” numa vida humana, a criação evoca os conceitos “de paixão, de vingança, de desentendimento” a partir da obra do dramaturgo inglês, em que Antonio, um mercador, falha o pagamento de um empréstimo a Shylock, um usurário judeu, que tem causado polémica face às interpretações antissemíticas que pode originar.
“Quisemos inspirar-nos nesta obra, porque as temáticas centrais são muito fortes e hoje ainda mais: intolerância, racismo, xenofobia, ‘bullying’. Também se aborda as complicações que o amor não assumido traz e a forma como somos desestruturados na nossa estabilidade emocional”, adiantou a encenadora Rafaela Santos, também codiretora artística da companhia Amarelo Silvestre, sediada em Canas de Senhorim, concelho de Nelas, distrito de Viseu.
No ensaio para a imprensa decorrido hoje à tarde, a cenografia e os figurinos vermelhos envolviam uma peça em que a fala inaugural – “na verdade, não sei porque ando tão triste” -, parecia dar eco aos movimentos aparentemente sem rumo e à confusão dos seis personagens quanto às origens dos sentimentos que os ‘invadem’.
A partir das imagens criadas em palco e das 10 frases retiradas do texto de Shakespeare, a obra explora também a “incapacidade” dos personagens formarem uma “comunidade”, mesmo tentando uma “certa harmonia”, para levar o espetador a refletir sobre a contemporaneidade.
“A partir das frases, sucintas mas repetidas, é possível que as pessoas discutam sobre o facto de que obter tudo ao mesmo tempo, e sempre da mesma forma, é também uma forma de não sermos livres. Essa tentativa de uniformização castra-nos a individualidade e a liberdade de sermos diferentes”, vincou.
Criadora de “1/2 kg de carne”, com o apoio dramatúrgico de Fernando Giestas, o outro diretor artístico da Amarelo Silvestre, Rafaela Santos disse ainda que o título procura “enaltecer e ampliar” o “peso do coração” e o seu “lado simbólico”.
Coproduzido pela Amarelo Silvestre e pela Oficina, a cooperativa da Câmara Municipal de Guimarães para a cultura, “1/2 kg de carne” conta com a interpretação de Haroldo Ferrari, ator brasileiro que já fez parte da companhia de Canas de Senhorim, e ainda de Luísa Maria, Mário Alberto Pereira, Rita Morais, Sara Costa e Zé Ribeiro, elementos do Gangue de Guimarães, projeto criado em 2017 para cartografar os artistas com ligação à cidade minhota.
Para a encenadora, as coproduções são “essenciais” para que “os projetos artísticos tenham mais meios” e “singrem” num contexto de “escassez” de recursos.
Depois da estreia, agendada para as 19:30 de sexta-feira, o espetáculo será exibido no Grande Auditório do CCVF no sábado, a partir do mesmo horário.