Um homem paraplégico, de Barcelos, recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça, da pena de cinco anos e oito meses, por tráfico de droga, aplicada em Braga, por entender ser uma condenação excessiva, até por se tratar de uma prisão efetiva.
João Pedro Costa, de 44 anos, solteiro, natural de Barcelos, atualmente ainda em prisão preventiva, em Braga, por ter recorrido desta sua condenação diretamente para o Supremo Tribunal de Justiça, não se conforma com a pena de prisão efetiva.
Com uma incapacidade permanente de 80%, desde que há treze anos sofreu um grave acidente de viação, João Pedro confessou, no julgamento, adquirir droga para o seu consumo próprio e parte da qual às vezes “dispensava” (vendia) a amigos.
A defesa do arguido, a cargo da advogada Leonor Macedo, com escritório em Braga, que passou a representá-lo após a sua condenação, solicita a redução da pena para cinco anos, o que permitiria a sua suspensão.
“João Costa vendeu para consumir e, enfim, caiu num ciclo de vendas ‘de rua’ a amigos e conhecidos, não sendo um negócio de ‘quilos’, nem de grandes quantidades e os factos dados como provados demonstram claramente um registo de vendas semanal de canábis/resina/haxixe a cada uma das pessoas que ali foi detetada a comprar (o apelidado consumo recreativo ou consumo de fim de semana), sendo um vendedor ‘a granel’, de quantias para ‘charros’, ou para consumos diminutos de quem ali aparecia para lhe comprar”, junto do ginásio e do café que então frequentava na freguesia urbana de Arcozelo, em Barcelos.
“Uma pena de prisão efetiva, aqui neste caso em concreto, viola as próprias finalidades das penas, entre as quais se encontra a própria ressocialização dos arguidos, sendo desrespeitadora da dignidade da pessoa humana”, refere o recurso.
“Uma das mais importantes finalidades das punições é a reintegração do agente na sociedade, conforme preceitua o Código Penal, que também tem uma norma imperativa, de que ‘em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa’”, pelo que a sua nova advogada de defesa, Leonor Macedo, pugna por “uma pena mais baixa e principalmente sem ser de prisão efetiva”.
Leonor Macedo, baseando-se no próprio acórdão condenatório, salienta que “do certificado de registo criminal deste arguido, o João Pedro Ferreira Costa, não constam quaisquer condenações anteriores”.
“João Pedro já tem uma das piores condenações”
“João Pedro tem uma das maiores condenações que alguém pode ter na vida: deixou de poder andar, na sequência de um acidente de viação, que o vitimou, aos 31 anos, em pleno auge da sua juventude”, destaca a advogada.
“A sua vida como ele a conhecia foi abruptamente interrompida e nunca mais foi possível retomar no ponto em que a perdeu, passou subitamente de uma vida normal, em que podia caminhar, correr, saltar, era autónomo, não dependia de ninguém, para estar preso, dia após dia, a uma cadeira de rodas”, enquanto agora depende de tudo e todos, em especial dentro de uma prisão.
“João Pedro nunca mais conseguiu subir uma escada, ou um passeio, pelo seu próprio pé, na verdade, João Pedro nunca mais sentiu as suas pernas, desde o acidente que sofreu, nunca mais deixou de depender de terceiros”, acrescenta-se no seu recurso.
“Mas pior do que isso, passou a sofrer as sequelas de uma lesão na medula espinhal, com todas as implicações que isso tem nas atividades mais íntimas e mais naturais do ser humano, isto não nos pode ser indiferente, não podemos ignorar a violência do sofrimento físico e emocional de alguém que seja colocado nestas circunstâncias”, ainda segundo a argumentação do apelo.
“Não pretendemos adotar um discurso dirigido a obter ‘a pena’ do julgador, mas esta é efetivamente uma constatação objetiva de uma realidade que passa despercebida para quem, felizmente, não sofreu um infortúnio desta natureza”, afirma a advogada.
“E os Tribunais têm de questionar se os erros de pessoa colocada nesta situação são merecedores da mesma censura jurídica que os erros cometidos pela generalidade das pessoas”, apelando ao princípio constitucional da igualdade, segundo o qual a igualdade passa por tratar de forma desigual, aquilo que é desigual, como estabelece a Constituição da República Portuguesa.
“Já sabemos que o João Pedro cometeu crime, sabemos até que o mesmo confessou os factos, sabemos que era consumidor há muitos anos, sabemos também que os consumos das substâncias o ajudavam a aguentar a dor provocada pelas sequelas do acidente sofrido”, salienta a defesa de João Pedro.
“É evidente que as experiências de reclusão num estabelecimento prisional, seja decorrente de uma medida de coação de prisão preventiva ou em cumprimento de pena de prisão, divergem substancialmente no caso de uma pessoa que esteja na posse plena de todas as suas capacidades motoras e física em contraposição com o caso de uma pessoa que seja portadora de deficiência ou incapacidade motora decorrente de paraplegia”, ainda de acordo com a perspetiva subscrita pela sua advogada de defesa.
“A falta de condições dos estabelecimentos prisionais é sobejamente conhecida e afeta toda a população prisional, mas afeta particularmente os portadores de uma incapacidade como a do Recorrente na medida em que os estabelecimentos prisionais, não se encontram dotadas das infraestruturas adequadas às suas limitações”, acrescenta.
Um longo historial de toxicodependência
João Pedro, aos 15 anos, iniciou os consumos de haxixe e alguns anos depois de cocaína, que manteve até ter sofrido um acidente de viação aos 31 anos, que o deixou em estado grave e paraplégico, segundo se apurou no relatório social.
Após o acidente, seguiu-se um período de vários anos de recuperação em contexto hospitalar e durante um ano numa Unidade de Cuidados Continuados Integrados em Barcelos e ainda é seguido em consulta da dor no Hospital de Braga.
À data em que foi detido, pela PSP de Barcelos, João Pedro Costa residia num apartamento arrendado em seu nome, que partilhava com os pais, a seu pedido, desde que ficou paraplégico. Mantinha consumos de cocaína e haxixe, a par da medicação diária que continua a tomar para as suas dores.