À espera de um milagre. Assim se encontrava a comunidade de Catanduva, um pequeno município no interior de São Paulo, no Brasil, para poder ver o padre Albino Silva – a figura mais importante da história daquela cidade, nascido em Celorico de Basto e estudante em Braga – ser beatificado e depois canonizado.
No entanto, para concluir essa etapa, o sacerdote passou a ser considerado pela Santa Sé como “servo de Deus”. Mas hoje há uma novidade. O papa Francisco decretou que o padre Albino passasse a ser considerado “venerável”, a etapa anterior à beatificação.
O anúncio foi feito este sábado pelo cónego João Paulo Carneiro, reitor da Basílica de Bom Jesus do Monte e conterrâneo do padre Albino, citando o decreto da Congregação para causa dos Santos, datado deste sábado.
“O papa Francisco recebeu na manhã deste sábado (20) o prefeito da Congregação das Causas dos Santos, Cardeal Marcello Semeraro. Na audiência, o papa autorizou a promulgação do Decreto de reconhecimento das virtudes vividas em grau heróico do Servo de Deus Albino Alves da Cunha e Silva, presbítero diocesano, português de nascimento em Celorico de Basto, freguesia de Codeçoso, que viveu no Brasil, ultimamente no município de Catanduva/ SP, de 26/04/1918, onde ficou até a sua morte, em 19/09/1973, aos 91 anos de idade”, citou o reitor.
“Este sacerdote é meu conterrâneo, Celorico de Basto. Alegremo-nos Celoricenses. Hoje é um dia muito feliz para mim, o mais feliz dos últimos tempos, pois contribui com trabalho e investigação que integrou este processo que foi ao Santo Padre”escreveu ainda o cónego.
Quem foi padre Albino, um milagreiro no Brasil
“Quando ele chegou, era um vilarejo, com casinhas muito simples, de madeira. Na verdade, ele foi um baluarte, um pilar central de tudo aquilo que a cidade hoje desfruta do ponto de vista estrutural, sobretudo de promoção social e de saúde”, refere o padre brasileiro José Casimiro – um dos elementos que quer ver a canonização do padre Albino ser levada a cabo.
Nascido em 1882, Albino Alves Silva foi viver para Braga ainda criança onde estudou no seminário, terminando o curso em 1905, com “bastante brilho”, dizem os anuários da altura, apontando ainda o reconhecimento geral de “um padre de valor”. Acabou por ser promovido a “uma grande e rica paróquia”, mas não tomou posse.
Foi perseguido, como muitos outros jesuítas, durante a revolução republicana de 1910, o que lhe valeu uma fuga. Condenado pelo novo poder ao exílio em África, acabou primeiro por se esconder em Braga, indo depois para Monção, Salvaterra de Magos e finalmente Espanha, em Tuí.
Dizem os mesmos anuários que um dia, quando um navio a vapor brasileiro estava ancorado no porto de Vigo, o padre Albino decidiu rumar ao Brasil, esperando melhores dias para a igreja na política portuguesa.
Com 30 anos chegou ao Rio de Janeiro, em 1912, passando por algumas localidades onde pregou o evangelho.
Mas seria no ano de 1918 que padre Albino chegou a Catavanduva, no dia 28 de abril, ficando lá até à morte, em 1973, aos 91 anos.
Substitui um padre muito popular
Mas o padre não foi bem recebido naquela comunidade. Chorava-se a saída de outro pároco popular, o padre Caputo.
“Nunca foi orgulhoso. Quando passava pelas ruas, sempre humilde e recolhido, não era compreendido pelo povo. Quantas vezes, ao passar pelas ruas, recebia insultos. Alguns tossiam propositadamente e escarravam perto de seus pés. Entretanto, ele não se revoltava. Suportava tudo calado e sem perder a calma. Nem sequer fazia cara feia”, dizem relatos escritos daquele tempo, hoje divulgados pela fundação com o seu nome.
“O seu primeiro inimigo gratuito foi o próprio sacristão. Este, acostumado com o primeiro vigário, que tudo deixava em suas mãos um tanto ligeiras…não se conformava com a atitude enérgica do segundo vigário, que sabia governar a Igreja e as…esmolas dadas pelo povo para a construção da Matriz. Procurou mesmo difamar, perante o povo, o sério e piedoso padre. Chegou ao cúmulo de dizer que ele era ladrão de galinhas”, refere o mesmo manuscrito.
Progresso em Catanduva
Mas no segundo ano em Catanduva tudo mudou. Albino iniciou as obras da Igreja Matriz e em 1926 inaugura a Santa Casa de Misericórdia, hoje Hospital Padre Albino. Ligado à sua preocupação com a assistência aos idosos, o Lar dos Velhos foi a segunda obra apoiada pelo padre em Catanduva, inaugurado em 1929. O hospital cresceu com a construção de um prédio para a maternidade e no início da década de 50 inaugurou o pavilhão infantil.
Em 1969 vem o ciclo das escolas, a partir da Faculdade de Medicina, ideia e sonho do padre para dar destino ao hospital após a sua morte. O Estatuto da Fundação Padre Albino foi registrado em 27/03/1968.
A seguir vieram o Colégio Comercial Catanduva (1971), a Faculdade de Administração de Empresas (1972) e a Faculdade de Educação Física (1973).
Além destas, o padre Albino foi responsável pela criação da Casa da Criança “Sinharinha Netto”, Vila São Vicente de Paulo, Lar Ortega-Josué, Ginásio Dom Lafayette, Seminário “César De Bus” e Santuário Nossa Senhora Aparecida.
No fim de cada ano dava à Fundação Padre Albino uma quantia em dinheiro de um valor que os familiares de Braga lhe remetiam anualmente.
30 mil pessoas no funeral
O padre Albino acabou por morrer em 1973, com toda uma obra deixada para o município, sendo sepultado perante 30 mil pessoas.
Durante a comemoração do centenário da chegada do padre Albino a Catanduva, em 2018 – evento assinalado com pompa e circustância por todos os responsáveis políticos e religiosos da cidade –, o objetivo passou por avanços na beatificação do bracarense.
Em 2011, os restos mortais do pároco foram exumados para reconhecimento canónico, tendo-se dado início ao processo de beatificação. Já no final de 2017, foi entregue um conjunto de documentos e depoimentos sobre o pároco à comissão dos teólogos, bispos e cardeais.
“Se os pareceres forem positivos, será emitido o decreto papal de reconhecimento da venerabilidade de padre Albino, ou seja, ele se torna venerável. A previsão para o término dessa fase é 2020. Após isso, é preciso comprovar um milagre para torná-lo beato. O próximo passo é a canonização – que exige mais um milagre”, referia em 2018 a Fundação Padre Albino, por altura da comemoração do centenário da chegada do padre ao Brasil.
Agora, com este novo passo, fica cada vez mais próxima a oportunidade de o venerável padre Albino passar a ser “santo padre Albino”.