O estranho caso da família de Famalicão que trafica droga ao domicílio

Serviço de entrega de droga à porta destinava-se aos melhores clientes
Foto: Joaquim Gomes / O MINHO

Uma família de Famalicão foi acusada de traficar droga ao domicílio, a partir do Bairro de Pelhe, na freguesia de Calendário, através de uma alegada associação criminosa, com doze homens e seis mulheres, que em breve serão julgados em Guimarães.

O serviço de entrega de droga à porta destinava-se exclusivamente aos melhores clientes, aqueles que mais droga compravam, funcionando na prática como os estafetas da Uber, que iam entregar determinada quantidade de estupefaciente já encomendada.

A acusação do Ministério Público de Famalicão imputa aos arguidos, alegadamente liderados por um casal residente no Bairro de Pelhe, os crimes de associação criminosa, de tráfico de droga e de branqueamento de capitais, entre 2023 e maio de 2024. 

O Ministério Público, com base nas investigações da PSP de Famalicão, afirma que pelo menos entre setembro de 2023 e maio de 2024, quando foram detidos todos detidos, os suspeitos usavam quatro focos de tráfico de droga, a partir da Rua de Ribaínho.

Há quatro homens e uma mulher presos preventivamente, genericamente acusados de crimes de tráfico de droga, mas o casal a quem se imputa a chefia do chamado Grupo de Pelhe, responderá também por liderança de um crime de associação criminosa.

Do grupo dos 18 arguidos, quatro dos quais já cumpriram penas de prisão efetiva por tráfico de droga, são igualmente acusados de integrarem a mesma alegada associação criminosa, cuja atividade consistiria no tráfico de heroína, de cocaína e de haxixe.

Parte dos arguidos serão julgados também pela acusação de branqueamento de capitais, alegando o Ministério Público de Vila Nova de Famalicão que os avultados lucros com a venda de droga a retalho seriam dissimulados para entrar no circuito legal.

A dada altura da atividade de narcotráfico imputada à Rede de Pelhe, uma das mulheres passou, segundo o a PSP e o MP, a ir e vir todos os dias entre Famalicão e a Trofa, sempre de táxi, onde passaria, nas “horas de expediente”, a traficar drogas duras.

O fluxo de tráfico de droga, em Pelhe, um lugar situado em local estratégico entre vias estradas nacionais e autoestradas, em Calendário, Famalicão, tinha imensos clientes. a maioria dos quais fazem agora parte das 140 testemunhas indicadas pelo MP.

Para o MP, havia no Bairro de Pelhe uma primeira linha de tráfico onde pontuaria uma mulher conhecida por “Africana”, mais uma segunda linha, com quatro focos, na “Casa do Marucho”, na “Casa do Emídio”, na “Casa da Louca” e na Rampa de Pelhe.

A acusação, subscrita pela magistrada Alexandra Matias, da 1ª Secção do Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Vila Nova de Famalicão, ainda é passível de eventual instrução, fase processual facultativa entre a acusação e o julgamento.

O gueto Bairro de Pelhe

O Bairro de Pelhe é um autêntico gueto, inserido numa zona residencial já a sul da cidade de Vila Nova de Famalicão, mais precisamente na saída da cidade para sul, com acesso privilegiado para a Estrada Nacional 14 em direção à cidade da Trofa e Estrada Nacional 204 em direção a Santo Tirso, assim como próximo do nó de acesso à Variante Nascente de Vila Nova de Famalicão, por inerência acesso às autoestradas A3 e A7, segundo começa por enquadrar o Ministério Público na sua acusação.

Aquele bairro é atravessado, no extremo sul da União de Freguesias de Famalicão e Calendário, é atravessado pela Rua do Ribaínho, com cerca de 200 metros de comprimento, mas sem saída para veículos automóveis, sendo que no início da Rua de Ribaínho, confluem três ruas de trânsito automóvel e no final é servida por uma estreita viela de acesso pedonal, com ligação à Rua de Vasco da Gama, dentro de uma tipologia, que favorece o tráfico de estupefacientes, como heroína, cocaína e haxixe. 

O Bairro de Pelhe é constituído por dez habitações, localizadas no lado direito do início daquela rua, tratando-se na sua maioria, de construções clandestinas, das quais duas se encontram devolutas, onde se acobertava um toxicodependente e sem-abrigo, de alcunha “Ricaço”, natural de São Martinho de Bougado, na Trofa, que era ali uma espécie de “homem para todo o serviço”.

“Casa da Africana” controlava tudo

A chamada “Casa da Africana” encontra-se no lado esquerdo da primeira rampa de acesso ao Bairro de Pelhe, tratando-se de uma vivenda de rés-do-chão e de primeiro andar, apontada como privilegiada zona de vigia face a eventuais controlos policiais.

A “Casa da Africana” situa-se num local estratégico para a função de líderes do tráfico de droga, pois, da sua varanda, que fica num ponto elevado sobre o bairro, permite-lhes controlar todo o bairro, as entradas e saídas de pessoas, bem como lhes permite visualizar as ruas de acesso ao Bairro de Pelhe, ao qual de automóvel se acede a partir do lado de Este da Estrada Nacional 14.

O casal suspeito permaneceria grande parte do tempo na varanda do primeiro andar da sua habitação, ora em conjunto ora alternadamente, mas quase sempre na parte virada para a rampa, numa posição elevada para o interior do bairro e para a rua, que lhes permitia controlar e verificar completamente todo o desenrolar do tráfico de estupefacientes, dar ordens aos outros suspeitos relacionados com as vendas de estupefacientes e denotando igualmente uma grande atenção à rua de acesso ao bairro.

 
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