O corpo da Guarda Prisional

Jorge Alves. Foto: Joaquim Gomes / O MINHO

ARTIGO DE OPINIÃO

Guarda Prisional no Estabelecimento Prisional de Braga

Desde a polémica em torno do subsídio de risco ou ónus de função ao pessoal da Polícia Judiciária, que muito se tem falado da PSP, GNR e Corpo da Guarda Prisional (CGP), impulsionado pelas lutas que os profissionais destas três carreiras especiais encetaram, como protesto contra a medida do Governo cessante de tratar de forma diferente o que é igual quanto ao risco entre as forças e os serviços de segurança.

A Polícia de Segurança Pública (PSP) e a Guarda Nacional Republicana (GNR) são sobejamente conhecidas da sociedade em geral, por estarem em maior contato com os cidadãos. Mas já do Corpo da Guarda Prisional (CGP), muito pouco se sabe das suas competências, responsabilidades e aptidões, mas também riscos e dificuldades, encobertos pelos murus que rodeiam as Prisões.

Na sua forma legislativa, o Corpo da Guarda Prisional “é a força de segurança que tem por missão garantir a segurança e tranquilidade da comunidade, designadamente mantendo a ordem e a segurança do sistema prisional, protegendo a vida e a integridade dos cidadãos em cumprimento de pena e medidas privativas da liberdade, e assegurando o respeito pelo cumprimento da lei e das decisões judiciais, bem como pelos direitos e liberdades fundamentais” Artigo 28º da Lei Orgânica da Direção Geral de Reinserção e dos Serviços Prisionais (DGRSP).

O Corpo da Guarda Prisional (CGP) é muito mais do que a sua forma legislativa, já que além dos profissionais que trabalham nas Prisões, o CGP inclui também o GISP (Grupo de Intervenção e Segurança Prisional), que constitui um grupo de operações especiais, à ordem direta do Diretor-Geral, sendo dos grupos especiais mais bem preparados do mundo para intervenção em meio prisional e junto de cidadãos privados da liberdade que exigem maior segurança/risco, mas também em áreas que lecionam junto com outros profissionais do CGP, como algemagem, tiro, dispositivos de proteção e segurança, manutenção da ordem prisional e defesa pessoal.

O Corpo da Guarda Prisional agrega também o Grupo Operacional Cinotécnico (GOC) especialmente preparado com cães bem treinados para busca de produtos estupefacientes e manutenção da ordem prisional.

O CGP também tem um grupo de telecomunicações e manutenção de equipamentos, com a responsabilidade de garantir a ligação rádio, instalação e manutenção de meios auxiliares de segurança.

Nas Prisões, os profissionais do CGP, estão em contato direto e permanente com todo tipo e natureza de pessoas, extrato social, violentos, com doenças infetocontagiosas e do foro psiquiátrico. Lamentavelmente, nas Prisões, o CGP fica frequentemente exposto a Hepatites, Tuberculose, HIV-SIDA, mas também SARNA, ratos, ambientes saturados, húmidos, muito frios (inverno) e muito quentes (verão), superlotados, nauseabundos, sem as mínimas condições de segurança e saúde no trabalho. Espaços e condições que já mereceram reprovação do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH), devido à falta de higiene, luz direta, circulação de ar e afins, obrigando Portugal a pagar aproximadamente 16 mil euros a cada um de mais de meia centena de reclusos privados da liberdade em prisões portuguesas que apresentaram queixa no TEDH.

Num país com 18 distritos no Continente e duas Regiões Autónomas, Portugal tem 49 (45 no continente e 4 nas Regiões Autónomas) Prisões em funcionamento. Ponta Delgada com aproximadamente 150 anos, Lisboa e Coimbra com mais de 100 anos e só 7 prisões foram construídas depois do 25 de abril de 1974. Ou seja, a generalidade das prisões em Portugal são do início da República, do tempo da Ditadura Militar e do Estado Novo.

Atualmente as Prisões, supostamente, têm capacidade para 10.252 pessoas, mas na primeira quinzena de março de 2024 tínhamos 12.526 reclusos. Considerando o número de reclusos entrados e saídos, chegaremos aos 13 mil reclusos até final do ano de 2024, o que ultrapassa em quase 3 mil a lotação estabelecida pelo Governo da República Portuguesa. 

Os meios materiais também refletem o abandono a que o sistema prisional foi deixado, nomeadamente as viaturas que estão a cair de podres e sem a manutenção adequada. Avariam frequentemente na estrada com reclusos no interior e até caiem portas em movimento, viaturas em circulação ainda do século passado, todas com milhares de quilómetros acumulados, isto a começar do zero. Só nos últimos cinco anos foram abertos, pelo menos, cinco concursos públicos para a aquisição de viaturas que, por razões que se desconhecem, nunca foram concluídos e por isso temos viaturas com indicação para abate que continuam a transportar presos para os tribunais, hospitais e outros locais.

Quanto à falta de meios no CGP, sobre quem recai a responsabilidade da segurança das Prisões, já existem mais de mil vagas nas categorias e carreiras do CGP que afetam perigosamente a chefia dos efetivos, mas principalmente a segurança das pessoas e instalações. Em Comissário Prisional de 29 existem 6 vagas com a maioria dos que estão ao serviço com idade para se aposentarem, em Chefe Principal, de 118 existem mais de 60 vagas com grande parte dos que trabalham em condições de se aposentarem, em Chefe de 378, existem mais de 200 vagas dos quais muitos esperam a aposentação, como Guarda Principal, de 2.137 existem mais de 400 vagas com mais de 1.000 próximo da idade da aposentação, como Guarda, de 2.314 existem mais 400 vagas.

A par do grave problema estrutural, os profissionais do CGP também se deparam com problemas de promoção e progressão nas categorias e carreiras, estando estagnados há vários anos no mesmo escalão e categoria, sendo muito prejudicados comparativamente com outros profissionais das forças e dos serviços de segurança. O CGP tem Guardas na primeira categoria e 3 escalão (nível 11) com mais de 24 anos de serviço, quando deviam estar, pelo menos na segunda categoria (Guarda Principal e 3 escalão (nível 17)). A 10 anos da aposentação estão apenas no nível 11 como Guarda. 

Num cenário de 49 prisões e 12.526 reclusos, existem pouco mais de 3.800 profissionais do CGP que trabalham por turnos e têm de garantir a segurança das instalações e o transporte de reclusos em todo o território nacional para tribunais, hospitais, clínicas, conservatórias, bancos e multibancos, centros de acompanhamento de toxicodependentes, centros de pneumologia, visitas íntimas e outros serviços. Os profissionais do CGP estão na linha da frente no acompanhamento e na resolução dos problemas das pessoas privadas de liberdade, porquanto apoiam, protegem e resolvem a generalidade dos problemas que surgem, acompanham no trabalho e nas visitas com familiares. É frequente os profissionais do CGP não beneficiarem dos tempos para refeição e mesmo para repouso, bem como das folgas, tal é o aumento dos serviços que exigem a presença do CGP.

Apesar das enormes dificuldades evidentes e gritantes, como diz Mario Sergio Cortella, os profissionais do CGP fazem o seu melhor nas condições de que dispõem, enquanto não têm condições melhores para fazer melhor ainda.

Só por isso, o novo Governo, que tomará posse em abril de 2024, terá de respeitar e proteger mais estes profissionais. O que desejamos é que dediquem o tempo e meios necessários para proporcionar melhores condições nas Prisões, mas também a revisão da carreira do CGP, com reforço do efetivo, melhoria das remunerações e um subsídio de risco, pelo menos, equiparado ao que é pago ao Diretor-Geral da Direção Geral de Reinserção e Serviços Prisionais como prevê o Decreto-Lei 237/97 de 8 de setembro, apesar de o risco ser significativamente maior e mais permanente nos profissionais do CGP.

Assim o esperamos, porque nós o merecemos.

 
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