Uma mulher foi esta segunda-feira absolvida pelo Tribunal da Relação de Guimarães por quatro crimes de maus tratos a quatro cães, em Vila Verde. Apesar de tudo ter sido provado, devido à incompletude do Código Penal na descrição dos conceitos de maus tratos e de animais de companhia, a lei que incrimina tais condutas foi declarada inconstitucional.
Christien F., de 30 anos, aquando da descoberta da situação de maus tratos e negligência contra quatro cães, em 2019, na sua residência, da freguesia de Cervães, Vila Verde, encontrava-se desempregada, tendo sido condenada a 180 dias de multa (1.800 euros) e inibição de ter animais de companhia durante dois anos.
De acordo com a setença, no dia 03 de março de 2019, após denúncia da Associação de Defesa dos Animais e Ambiente de Vila Verde (ADAAVV), a GNR constatou que quatro cães se encontravam subnutridos, maltratados, com sinais de abandono, sem água, nem cometida e a carecer urgentemente de cuidados veterinários.
Atualmente no Luxemburgo, a arguida recorreu da sentença condenatória proferida pelo Tribunal Judicial de Vila Verde, invocando entre outros argumentos que os quatro cães não eram seus, mas do seu companheiro, que infligia, a ela própria, maus tratos, argumentando que o quinto cão da casa, o único que era seu e não do pai da sua filha, era muito bem tratado.
Mas o Tribunal da Relação de Guimarães não chegou a apreciar estes factos, para aferir se tinha sido bem condenada ou não, uma vez que se colocava uma questão prévia, de Direito, que era a alegada inconstitucionalidade da lei que pune os maus tratos a animais de companhia, com dois acórdãos do Tribunal Constitucional a declararem ser contra a Constituição.
Os juízes-desembargadores da Relação de Guimarães acolheram os citados acórdãos do Tribunal Constitucional, segundo o qual a norma do Código Penal que pune os maus tratos a animais de companhia é indeterminada naquilo que são estes seres vivos e o conceito de maus tratos, pelo que não estando bem definidos ambos os valores, a lei não deve ser aplicada.
“Não se questiona, evidentemente, a necessidade de proteção jurídica dos animais e da punição dos atos de crueldade sobre eles”, referem os três juízes-desembargadores, acrescentando: “O que nos suscita sérias reservas, desde logo de constitucionalidade, nos termos sucintamente sobreditos, é a mobilização do direito penal de justiça, para esse desiderato”
O advogado João Araújo Silva, que defende a arguida, questionado por O MINHO, considerou “tratar-se de um marco histórico na justiça e na advocacia, pelo que fizemos história, ao obter a absolvição, por um tribunal superior, a Relação de Guimarães, após uma condenação inconstitucional, em Vila Verde”.