Monção, do verde e das cinzas

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ARTIGO DE MANUEL PIMENTA

Monção é uma terra verde. Será talvez a mais verde deste nosso Minho.

A natureza  é verde, o vinho é verde, o brasão tem fundo verde, a bandeira é branca e verde, e até o maior dos seus poetas escolheu um pseudónimo com apelido de Verde.
Escreveu ele, que o Minho e a Galiza são dois eternos namorados que os pais não consentem casar.
Hoje em dia já os deixam viver juntos. Dormem em camas separadas… mas sempre bem coladinhas como aquelas dos hotéis. Se houver céu, e o poeta lá estiver, certamente brindará a esta actual união de facto.

Quando andávamos às turras, Monção foi das nossas principais fortalezas. Por aqui os espanhóis nunca tocaram na xixa. Felizmente esses tempos já acabaram. Hoje, os nossos inimigos estão dentro de portas. Portuguesinhos da Silva…não será com muralhas de pedra que os vamos derrotar.

Monção foi uma das vítimas deste recente ‘bloody sunday’ lusitano. O fogo também andou por cá e lavrou quanto quis, por entre um emaranhado de casas e selva cada vez mais entrelaçados. O ordenamento deste nosso território tem sido sempre ignorado. Com consequências nefastas para tudo o que aqui vive.
O fogo é uma coisa maldosa. Não é à toa que a cristandade o usa para publicitar negativamente o inferno.  O fogo tem ódio a tudo. Não respeita nada, nem tem compaixão por ninguém. Só não queima o que não pode, porque vontade nunca lhe falta.

É doloroso ver agora, tanto deste verde pintado de negro. Que horas devem ter passado os monçanenses… homens, mulheres e crianças a lutar com o que tinham… sem saber qual o desfecho de mais esta dura batalha.

Como sempre, foi travada com afinco. A Claudia, minha amiga e colega de profissão, também andou a combater na sua freguesia da Bela, não obstante estar em convalescença pós operatória. A Deu lá lhe deu forças com toda a certeza…

Foi ela quem me guiou pelas zonas atingidas. O cenário é desolador… mas felizmente por cá permanecem todos vivos. Louvor aos que contribuíram para essa tamanha grandeza de preservar vidas humanas.

O tal domingo foi terrível em tantos lugares. Muitas terras não tiveram a mesma ‘sorte’. A companheira Galiza foi das mais martirizaras, contaminada por um fogo capaz de galgar um largo rio.

Do lado de lá morreram quatro, que agora também são dos nossos… na alegria e na tristeza, na saúde e na doença. É assim que a Humanidade tem obrigação de caminhar, negando fronteiras. O sentido inverso, o dos que querem erguer muros, seria mais fácil, mas certamente muito mais assustador.

Nas condições em que estamos, não podemos ser grande apoio para a nossa vizinhança. Nem sei se teremos país capaz de ajudar todos os nossos. Foram centenas de ignições em simultâneo, por terras onde quase só os velhos permanecem. Não pode ter sido por acaso.

A revolta que encontrei nas gentes é legítima. Há uma sede de encontrar culpados para atenuar tamanha injustiça. Sempre foi assim. Na América pré-colombiana sacrificavam-se crianças para calar os vulcões. Felizmente já não estamos nesse patamar, só que uma coisa é certa: se não formos capazes de ir à raiz do problema, tudo se irá repetir e ainda com mais intensidade. O problema somos todos. Todos teremos de fazer parte da solução.

Monção não teve mortes, mas teve vítimas. Espero que, com tanta desgraça espalhada pelo país, ninguém se esqueça que aqui no cimo também vive gente que precisa de auxílio. Se não for Lisboa a lembrar-se, que sejam os outros municípios do nosso Alto Minho. Um dia por eles, outro dia por nós.

Ajudar será sempre a melhor forma de fazer justiça. Para que tudo aqui volte a ser verde. E assim permaneça para sempre.

 
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