Medida de graça para reclusos não se aplica a preventivos, alerta o Governo

Covid-19
Foto: delas.pt / DR

O Ministério da Justiça esclareceu hoje que as “medidas de graça” aprovadas para os reclusos, devido à pandemia da covid-19, não se aplica às pessoas detidas preventivamente.

Tendo como base a proposta do Governo, aprovada em Conselho de Ministros (02 de abril), alterada, discutida e votada por maioria no parlamento, promulgada na quinta-feira e publicada na sexta-feira, o Ministério da Justiça explica que as medidas centrais desta lei – perdão de penas, indulto, licença de saída administrativa extraordinária – aplicam-se apenas aos reclusos “que cumprem condenações definitivas”, ou seja “não se aplica a pessoas detidas preventivamente, tal como não se aplicam às que venham a praticar crimes no futuro”.

Apesar de as medidas de graça aplicadas aos reclusos devido ao novo coronavírus não abrangerem os presos preventivos, o Ministério da Justiça sublinha que a legislação processual penal prevê que os tribunais procedam à reapreciação dos casos em que foi aplicada a prisão preventiva, tendo em consideração, sobretudo, os preventivos especialmente vulneráveis, por serem portadores de doença física ou psíquica ou de um grau de autonomia incompatível com a permanência em meio prisional, neste contexto de pandemia.

Relativamente ao que essa lei estabelece quanto às prisões preventivas, o Ministério da Justiça diz que a mesma determina que a prisão preventiva deve ser aplicada apenas quando todas as outras medidas de coação não forem suficientes.

“A lei reafirma este princípio e estabelece o reexame das situações de prisão preventiva, sobretudo nas situações de maior vulnerabilidade, devido à idade ou saúde dos reclusos”, acrescenta o Ministério da Justiça a propósito das regras daquela medida de coação mais gravosa e privativa da liberdade.

O esclarecimento do Ministério da Justiça sobre a situação dos presos preventivos ocorreu no âmbito da informação prestada a propósito da lei recentemente aprovada pelo parlamento e que entrou hoje em vigor sobre o regime excecional de flexibilização da execução das penas e medidas de graça para os reclusos no âmbito da pandemia.

Muito embora tais medidas de perdão, indulto e licença de saída administrativa não se apliquem aos presos preventivos, os efeitos provocados pela pandemia na atividade dos tribunais (levando ao cancelamento de diligências, atos instrutórios e julgamentos considerados não urgentes) acabaram por levar alguns juízes a fazer nova ponderação face à situação de pandemia e a colocar em liberdade provisória arguidos que estavam em prisão preventiva.

Uma dessas situações verificou-se na fase de instrução do caso de Tancos (furto e achamento de armas de guerra) em que sete arguidos daquele processo receberam ordem para serem libertados por indicação do juiz de Carlos Alexandre, que teve que adiar ‘sine die’ a fase de instrução devido à pandemia da covid-19.

No despacho, a que a agência Lusa teve acesso, Carlos Alexandre determinou que os arguidos António Laranginha, Pedro Marques, Hugo Santos, Gabriel Moreira, João Pais e Fernando Santos, todos suspeitos de envolvimento no furto de armas dos paióis de Tancos, fossem libertados, dada a impossibilidade da realização do debate instrutório até ao dia 17 de abril, data em que terminava o prazo máximo de manutenção da prisão preventiva aplicada aos sete arguidos.

Aquele juiz de instrução criminal optou também por não atrasar a instrução do processo Hells Angels, que tem muitos arguidos em prisão preventiva, tendo requisitado as duas únicas salas do Tribunal de Monsanto, Lisboa para arrancar com a instrução, com nova data prevista : 22 de abril.

No despacho, Carlos Alexandre assegura que está garantida a distância de segurança sanitária entre os arguidos que vão ser interrogados, bem como dos coarguidos que queiram presentes na sessão.

O juiz explica que a “ponte” entre as duas salas será feita por videoconferência. Carlos Alexandre determina ainda que os arguidos e advogados que não queiram comparecer a todas as sessões, tenham acesso à videogravação de cada uma das audiências.

O início da fase de instrução do processo Hells Angels, com mais de 80 arguidos, esteve inicialmente previsto para 12 de março. O caso envolve associação criminosa, tentativa de homicídio, roubo e outros crimes graves.

Relativamente ao caso da libertação do `hacker´ Rui Pinto, responsável pela descoberta dos casos Football Leaks e Luanda Leaks e que estava há mais de um ano em prisão preventiva, o Ministério da Justiça esclareceu, em nota pública, que não foi contemplado por “qualquer das medidas previstas na lei” agora aprovada pelo governo e Parlamento, uma vez que “se trata de um processo judicial ainda em curso”.

O Ministério dirigido por Francisca Van Dunem refere que o que aconteceu no caso Rui Pinto foi que “o arguido aceitou colaborar com a justiça e o tribunal decidiu pôr termo à prisão preventiva”.

Até ao momento não foram adiantados qualquer cálculo sobre o número total de presos preventivos que sairão em liberdade devido à redução muito significativa da atividade dos tribunais, o que favorece o esgotamento dos prazos máximos de prisão preventiva e permite a libertação de arguidos que, de outra forma, provavelmente continuarem em reclusão.

Portugal tem atualmente uma população prisional de 12.729 reclusos, 800 dos quais com mais de 60 anos de idade, alojados em 49 estabelecimentos prisionais dispersos por todo o território nacional.

O Ministério da Justiça justifica que a “razão última destas medidas” de graça agora em vigor consiste em proteger não só a saúde dos reclusos, mas também a de todos os que exercem funções no sistema prisional, nomeadamente, guardas prisionais, pessoal de saúde e técnicos de reinserção social.

“As especificidades do meio prisional, quer no plano estrutural, quer considerando a elevada prevalência de problemas de saúde e o envelhecimento da população que acolhe, aconselham que se acautele, ativa e estrategicamente, o surgimento de focos de infeção nos estabelecimentos prisionais e se previna o risco do seu alastramento, o que exige, para além de todas as medidas que vêm sendo implementadas, os espaços necessários para proceder ao adequado isolamento dos doentes sintomáticos e ao distanciamento social recomendado pelas autoridades de saúde”, conclui o Ministério da Justiça.

 
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