O julgamento estava marcado para esta quarta-feira, mas foi adiado, já que, devido à crise da covid-19, apenas os mais urgentes, com arguidos presos, estão a ser realizados, por meios eletrónicos. Um cidadão de Viana do Castelo pede, no Tribunal de Braga, a anulação do negócio de venda à Monahome, Lda. de 19 prédios das firmas de Fernando Fernandes, o pai de João Paulo Fernandes, o empresário raptado em Braga e morto por estrangulamento, em março de 2016. A seu favor, conta já com o testemunho de um dos sócios-gerentes, que disse, no Tribunal de São João do Porto, aquando do julgamento do crime, que o negócio foi “fictício” e as vendas simuladas.
O emigrante e homem de negócios Vítor Fernando Pereira – que se diz credor de 1,3 milhões de euros emprestados, entre 2006 e 2008, a Fernando Fernandes – pôs uma ação pauliana de restituição de bens, que está à espera de ser julgada em Tribunal, onde pede que voltem à origem, ou seja à posse das empresas Construções Fernando M. Fernandes e InMetro. E entrem na massa falida destas duas firmas, do pai do malogrado empresário e que foram declaradas insolventes.
A Monahome, Lda. foi criada pelo advogado Pedro Bourbón, de Braga, e pelo Emanuel Paulino (o bruxo da Areosa) – ambos condenados a 25 anos de prisão pelo homicídio – para esconder os bens – prédios e terrenos – de Fernando Fernandes, avaliados em 1,9 milhões de euros. A sugestão foi do jurista e teve em conta que as imobiliárias passavam dificuldades e os bens podiam ser penhorados por credores, se não fossem escondidos.
Desapareceram seis bens
Nuno Ferreira, que testemunhou no julgamento do crime em que Pedro Bourbón e o Bruxo eram os principais arguidos – disse que foi nomeado gerente a pedido dos dois, garantindo que era apenas testa de ferro na Monahome. “Fazia e assinava o que eles me pediam”, declarou, acrescentando que tinha uma “dívida de gratidão” para com o Bruxo.
Na ocasião disse, ainda, que – afirmam – seis dos bens de Fernando Fernandes foram transacionados sem seu conhecimento. O outro sócio-gerente, Filipe Monteiro, também ele testa de ferro, ficou em silêncio no julgamento do homicídio, em que era arguido.
Ambos saíram já da gerência, mas, ao que apurámos, gostariam de ter deixado de ser sócios, uma vez que estão sujeitos a contraordenações e a pagar dívidas fiscais.
Fonte ligada ao processo disse a O MINHO que o Tribunal, depois de ter ouvido o testemunho de João Paulo Fernandes – que era amigo íntimo e confiava em Pedro Bourbón – sobre o nascimento da Monahome, arrestou 13 bens ainda na posse desta firma. As declarações do empresário assassinado deverão ser lidas pelo juiz na primeira audiência.
Antes haviam já sido vendidos seis prédios: a receita de três deles serviu para pagar dívidas das duas empresas, enquanto que a de outros três, mais de 250 mil euros, terá ido parar aos bolsos do advogado e do Bruxo. Ao todo, receberam 623 mil euros.
Em 2013, e depois de os bens terem ido para a Monahome, o advogado deixou de entregar o dinheiro das rendas que recebia de casas alugadas. Vendo o descaminho dos bens, Fernando Fernandes fez uma queixa-crime por burla no MP/Braga. Mas foi arquivada.
No processo, Fernando Fernandes e mulher, que serão ouvidos como partes na querela, assumem a dívida ao emigrante e reconhecem que a passagem dos bens ocorreu para os “esconder dos credores”.
O Tribunal quer ouvir, também, Pedro Bourbón e o Bruxo, como testemunhas, bem como o jurista Pedro Lourenço, também arguido no processo-crime, e que defendia a Monahome.
Voaram mais 700 mil
Em 2014, o empresário assassinado declarou, em carta à PJ/Braga , que «passou» aos dois suspeitos 300 mil euros e um armazém, 700 mil, ao todo. O Bruxo da Areosa tinha-se tornado administrador da Climalit, a sua empresa de ar condicionado, por indicação de Bourbón.
Carta que, conjugada com o testemunho na ação pauliana, terá ditado a sua sentença de morte, às maõs do jurista e do bruxo, empresário de ervanárias. Os alegados assassinos, temendo ter de devolver o dinheiro e imaginando as repercussões públicas, gizaram, então, um plano para o matar. O crime seria perfeito. Mas não deu certo.
Estrangulado e dissolvido em ácido
O rapto ocorreu na noite de 11 de março de 2016. João Paulo Fernandes foi agredido à coronhada e metido na mala de um Mercedes. A filha de oito anos viu tudo. Levado para um armazém em Valongo, ficou toda a noite amarrado a uma cadeira, a ser ameaçado e interrogado pelo Bruxo, e outros quatro arguidos, entre os quais dois irmãos de Pedro Bourbon.
No dia 12, João Paulo Fernandes foi estrangulado e metido num bidon com ácido sulfúrico. Acabou dissolvido, apesar de um derrame de ácido. Os seus vestígios terão ido parar a uma lixeira.